A diretora-geral da Saúde ficou hoje fora da habitual conferência de imprensa onde é feito o balanço da epidemia de covid-19 em Portugal. O lugar foi ocupado por Diogo Cruz, subdiretor-geral da Saúde, que confirmou a duplicação de alguns valores no boletim desta segunda-feira.

Os dados passam a estar no SINAVE (Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica), onde os clínicos notificam sempre que têm a suspeita de uma doença de notificação obrigatória. O sistema não faz o acompanhamento clínico, e nem sempre inclui os dados sobre a morada.

Segundo o boletim epidemiológico de segunda-feira, o concelho do Porto registava 941 (hoje são 462) casos confirmados ao final do dia de domingo, um aumento de 524 casos em relação ao dia anterior.

Durante a conferência de imprensa, o subdiretor-geral da Saúde, Diogo Cruz, admitiu a duplicação de alguns casos registados no primeiro boletim, mas questionado pela Lusa sobre a duplicação de casos no contexto específico do concelho do Porto, o secretário de Estado António Lacerda Sales não confirmou números.

“Em relação ao Porto, neste momento não faz qualquer sentido colocar-se essa situação, independentemente da duplicação”, sublinhou o secretário de Estado, não adiantando se esta situação se verificou ou não.

O Governo mantém toda a confiança na Direção-Geral da Saúde (DGS), afirmou António Lacerda Sales, secretário de Estado da Saúde. "Subscrevemos toda a confiança na Direção-Geral da Saúde", repetiu várias vezes.

Sobre uma eventual cerca sanitária no Porto, o governante lembrou que "a fixação de cercas sanitárias é antecedida por declarações de calamidade pública, que, de acordo com a lei de bases da Proteção Civil, é decidida, em situações normais, pelo conselho de ministros e, em situações de urgência, por despacho do senhor primeiro-ministro e do senhor ministro da  Administração Interna".

As decisões, continua, são sustentadas na avaliação de risco feita pela autoridade de saúde. No caso do Porto, "não houve qualquer indicação da autoridade de saúde nesse sentido". Pelo que um cordão sanitário na cidade ou na região "não faz qualquer sentido".

Todavia, na conferência de imprensa desta segunda-feira, a diretora-geral da Saúde afirmava que a decisão de uma cerca sanitária na região do Porto estava a  ser equacionada, devendo uma decisão ser tomada ainda ontem. Lacerda Sales, no entanto, diz agora que Graça Freitas falava de forma "generalista".

"O que a senhora diretora-geral falou foi em situações de ponderação de uma forma generalista, não se referindo particularmente ao Porto", defende o secretário de Estado. "Há muitas situações no país em que isso se pode colocar", mas o Porto não é uma delas.

"No caso concreto do Porto, não houve qualquer indicação da autoridade de Saúde nesse sentido [estabelecimento de cordão sanitário] e portanto não faz qualquer sentido essa situação", disse Lacerda Sales. O secretário de Estado adiantou que uma decisão de estabelecimento de um cordão sanitário terá sempre de ser sustentada pela avaliação de risco feita pela autoridade de saúde.

Portugal regista hoje 160 mortes associadas à covid-19, mais 20 do que na segunda-feira, e 7.443 infetados (mais 1.035), segundo o boletim epidemiológico divulgado pela Direção-Geral da Saúde. O número de recuperados mantém-se inalterado, nos 43. António Lacerda Sales justifica com a progressão lenta da doença, bem como o facto de muitos doentes recuperarem em casa, o que pode levar a um desfasamento na informação.

A evolução do número deve-se,"em parte, devido a tratar-se de uma doença de convalescença lenta, também de uma notificação tardia, pois, como sabemos, a maior parte dos doentes trata-se no domicílio, o que  pode originar um hiato maior no  conhecimento da recuperação".

Uma das pessoas recuperadas tem 93 anos. É um dos "sinais de esperança" de que fala Lacerda Sales. A senhora, da Grande Lisboa, recuperou ao fim de 11 dias no hospital.

Sobre o jovem de 14 anos que morreu este fim de semana, Diogo Cruz diz que ainda não sabe o resultado da autópsia, defendendo que "por uma questão de respeito", não se deve falar de casos particulares. Este óbito não está no relatório e o subdiretor-geral da saúde lembra que, apesar da situação de pandemia, "as pessoas podem morrer por outros motivos".

Num "exemplo excessivo", Diogo Cruz explica que "uma pessoa que esteja positiva para covid-19, se tiver um acidente  de viação, naturalmente que faleceu do acidente de viação."

"Nós estamos em Portugal a ser muito abrangentes na classificação de casos de falecimento por covid-19, ou seja, qualquer pessoa que tenha covid-19 e tenha a menor causa de falecimento por uma questão infecciosa, nós estamos a considerar covid-19 — o que não é verdade para todos os países do mundo, incluindo na Europa", disse.

O objetivo é ser o mais "transparente e apanhar o máximo de casos possíveis".

O relatório da situação epidemiológica em Portugal, com dados atualizados até às 24:00 de segunda-feira, indica que a região Norte é a que regista o maior número de mortes (83), seguida da região Centro (40), da região de Lisboa e Vale do Tejo (35) e do Algarve, que hoje regista dois mortos.

Relativamente a segunda-feira, em que se registavam 140 mortes, hoje observou-se um aumento de 14,1% (mais 20). Segundo os dados da DGS, há 7.443 casos confirmados, mais 1.035 (um aumento de 16,1%) face a segunda-feira.

O novo coronavírus, SARS-CoV-2, responsável pela pandemia de covid-19, foi detetado pela primeira vez na China em dezembro de 2019 e já infetou entretanto mais de 750.000 pessoas em todo o mundo, das quais mais de 36.000 morreram.

Em Portugal, os primeiros casos foram identificados em 2 de março e o boletim diário da Direção-Geral de Saúde indicava na segunda-feira 140 mortes e 6.408 infeções confirmadas.

Em 17 de março, o Governo decretou o estado de calamidade pública em Ovar e no dia 18 teve início no concelho um cerco sanitário que obriga ao controlo de entradas e saídas no território, impondo também o encerramento de toda a atividade empresarial que não envolva bens de primeira necessidade.

Desde as 00:00 do dia 19 de março, todo o país entrou no regime de estado de emergência, o que vigorará até às 23:59 de quinta-feira.

Semana começou com polémica

A conferência desta segunda-feira ficou marcada pelo anúncio de Graça Freitas, em resposta ao SAPO24, de que estaria a ser equacionada uma cerca sanitária no Porto. A ideia foi imediatamente contestada pelo executivo de Rui Moreira, que a considerou "inútil", "absurda" e "extemporânea" — afirmando ainda que deixa de reconhecer autoridade à diretora-geral da saúde.

A polémica surge no meio de outras entre a Invicta e as autoridades nacionais: que vão desde os ventiladores da Galp alegadamente desviados para Lisboa, ao hospital de campanha que a RTP quer ajudar a montar também na capital.

Na semana passada, vários jornais deram conta de que a Comissão Distrital de Proteção Civil do Porto tinha pedido — por três vezes — cercas sanitárias para cinco concelhos do Grande Porto (nenhum dos quais a Invicta), que supostamente foram recusadas pela Administração Regional de Saúde do Norte (ARS-N).

Todavia, Marco Martins, presidente da estrutura distrital da Proteção Civil, esclareceu ao SAPO24 que, como previsto, a questão foi levantada nas reuniões de coordenação, mas não houve um pedido, tendo a medida sido apenas colocada à consideração da ARS-N.

A manchete desta terça-feira do 'Jornal de Notícias' acrescenta mais uma polémica: a Direção-Geral de Saúde admitiu erros na contagem de casos no Porto devido à metodologia adotada, que será entretanto corrigida.

Segundo declarações da DGS ao jornal, está a ser utilizada uma "metodologia mista" que recolhe dados reportados pelas administrações regionais e pela plataforma Sinave (Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica), onde os médicos inserem informação sobre os doentes.

Assim, "o universo [de casos] pode ser indevidamente maior do que o número de casos por dupla contagem", adianta fonte da DGS.