Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas com a tutela da TAP, demitiu-se do Governo na sequência da polémica com indemnização de 500 mil euros paga pela transportadora aérea à ex-secretária de Estado do Tesouro Alexandra Reis.

Esta demissão acontece 24 horas depois de a secretária de Estado deixar o Governo 25 dias depois de tomar posse e após quatro dias de polémica por causa dos 500 mil euros pagos pela TAP para deixar a administração da empresa.

Esta é a 10.ª mudança no atual Governo de maioria absoluta do PS, chefiado por António Costa, em funções desde 30 de março. Além de Pedro Nuno Santos e de Alexandra Reis, também se demitiu o secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes.

Filme dos acontecimentos

24 de dezembro, a notícia do Correio da Manhã

O Correio da Manhã noticia que a nova secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis, recebeu uma indemnização no valor de 500.000 euros por sair antecipadamente do cargo de administradora executiva da companhia aérea portuguesa, quando ainda tinha de cumprir funções durante dois anos.

Alexandra Reis, que tomou posse como secretária de Estado do Tesouro em 02 de dezembro, na última remodelação do Governo, ingressou na TAP em setembro de 2017 e três anos depois foi nomeada administradora da companhia aérea. Em fevereiro, saiu da TAP e, em junho, foi nomeada pelo Governo para a presidência da Navegação Aérea de Portugal (NAV).

O PSD é o primeiro a reagir para criticar o pagamento pela TAP da indemnização de 500.000 euros, situação que para os sociais-democratas “é assustadora”, nas palavras de Paulo Rios, vice-presidente do partido.

“Este meio milhão de euros não é do ministro”, “é dos portugueses”, disse Paulo Rios, sublinhando que a TAP está sempre associada a "más notícias e é assustadora a forma repetida como se precipitam decisões”.

25 de dezembro, os partidos começam a pedir esclarecimentos

O Presidente da República disse que “há quem pense” que seria “bonito” a secretária de Estado do Tesouro prescindir da indemnização da TAP, ainda que a lei permita receber os 500 mil euros e exercer funções governativas.

“É como pensam muitos portugueses, dizem: a senhora saiu daquele lugar, tinha direito por lei a ter aquilo, mas na medida em que está a exercer uma função pública há quem pense que era bonito prescindir disso, atendendo a que está noutra função. Mas do ponto de vista jurídico, a lei permite isto”, disse Marcelo Rebelo de Sousa.

Os partidos começam a pedir esclarecimentos. O CDS, através do seu presidente, Nuno Melo, afirmou que o primeiro-ministro, António Costa, devia explicações aos portugueses. No Twitter, a porta-voz do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), Inês Sousa Real, considerou “incompreensível” uma indemnização de 500 mil euros numa empresa intervencionada pelo Estado, exortando o Governo a dar explicações.

26 de dezembro, BE pede audição de Medina e Nuno Santos

O BE desafiou o Governo a explicar este pagamento pela TAP de meio milhão de euros à secretária de Estado, considerando a situação “um abuso e, sem explicações razoáveis, um escândalo”, e pede a audição urgente, dos ministros das Finanças, Fernando Medina, e das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, bem como da secretária de Estado.

“Depois de cortar rendimentos a milhares de trabalhadores da TAP, empobrecer salários e pensões de milhões, é incompreensível o prémio milionário de 500 mil euros pago à ex-administradora Alexandra Reis”, escreveu Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do BE, no Twitter.

O PCP considerou que "são devidas explicações e apuramento" da situação e manifestou o seu protesto "por estes critérios em prática nos grupos económicos e financeiros", anunciando que iria requerer a presença na Assembleia da República dos dois ministros com a tutela da TAP.

O Chega também pediu a audição parlamentar dos dois ministros sobre o pagamento, pela TAP, de meio milhão de euros de indemnização à secretária de Estado do Tesouro.

Numa declaração escrita enviada à Lusa, Alexandra Reis quebrou o silêncio e assegurou que devolveria “de imediato” qualquer quantia que lhe tivesse sido paga e que acreditasse não estar no “estrito cumprimento da lei” na sua saída da companhia aérea.

A governante afirmou que o acordo de cessação de funções “como administradora das empresas do universo TAP” e a revogação do seu “contrato de trabalho com a TAP S.A., ambas solicitadas pela companhia, bem como a sua comunicação pública, foi acordado entre as equipas jurídicas de ambas as partes, mandatadas para garantirem a adoção das melhores práticas e o estrito cumprimento de todos os preceitos legais”.

No entanto, na informação enviada à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, em fevereiro, a TAP comunicou que tinha sido Alexandra Reis a renunciar ao cargo.

Os ministros das Finanças e Infraestruturas e Habitação emitiram um despacho onde pedem à administração da TAP "informações sobre o enquadramento jurídico do acordo" celebrado com a secretária de Estado, incluindo acerca da indemnização paga.

O Presidente da República considerou que o esclarecimento sobre o acordo celebrado entre a TAP e a secretária de Estado Alexandra Reis “é importante para todos”, incluindo para os dois ministros.

“Para o Presidente da República, é importante porque o Presidente da República nomeou-a. Quer dizer, eu nomeei-a há cerca de um mês secretária de Estado no Ministério das Finanças. Penso que é importante para todos. Para quem nomeia, para quem é nomeado, para os portugueses, esclarecer efetivamente o que se passou nessa pré-história, isto é, na carreira profissional da pessoa”, disse.

27 de dezembro, Medina demite Alexandra Reis

O líder do PSD acusou António Costa, Fernando Medina e Pedro Nuno Santos de serem responsáveis e cúmplices no caso da indemnização recebida pela secretária de Estado Alexandra Reis quando saiu da TAP.

Numa publicação divulgada no Twitter, Luis Montenegro diz que o primeiro-ministro e os ministros das Finanças e das Infraestruturas e Habitação "são todos responsáveis e cúmplices em mais uma trapalhada": "Os três dirão que a culpa é da oposição e que a próxima demissão é apenas mais um caso... Este governo não tem emenda."

O Presidente da República defendeu ser preciso “esclarecer todo” o acordo celebrado entre a TAP e a secretária de Estado Alexandra Reis para, numa segunda fase, se retirarem ou não consequências.

“Deve-se começar pelo início, ou seja, pelo esclarecimento e, depois, dado o esclarecimento, aí se retirará ou não as consequências daquilo que foi esclarecido”, afirmou.

À Lusa, o primeiro-ministro afirmou que "desconhecia em absoluto os antecedentes" e pediu esclarecimentos sobre a indemnização atribuída pela TAP à secretária de Estado, aguardando a "qualificação jurídica" dos factos.

"Quanto à secretária de Estado do Tesouro, registo que se prontificou a devolver qualquer quantia que não lhe fosse devida e que recebeu nos termos acordados entre os advogados”, afirmou, numa declaração escrita.

"Quanto ao mais”, disse aguardar “o esclarecimento cabal dos factos e da sua qualificação jurídica”.

Em mais uma declaração aos jornalistas, o Presidente da República reafirmou estar “pacientemente à espera”, tal como o primeiro-ministro, ministros e portugueses, de esclarecimentos sobre a indemnização atribuída à secretária de Estado Alexandra Reis.

"Eu estou à espera e, sobretudo, os portugueses estão à espera porque em democracia é muito importante que os portugueses sejam esclarecidos”, disse.

Os Ministérios das Finanças e das Infraestruturas e Habitação remeteram à Inspeção-Geral de Finanças (IGF) e à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) os esclarecimentos da TAP sobre as funções de Alexandra Reis, secretária de Estado do Tesouro.

Num comunicado conjunto, os ministérios indicaram que “o Governo recebeu os esclarecimentos prestados pelo conselho de administração da TAP, em resposta ao despacho dos Ministros das Finanças e das Infraestruturas e Habitação sobre o enquadramento jurídico da cessação de funções societárias e laborais de Alexandra Reis com o Grupo TAP”.

Em resposta ao Governo, a TAP informou que Alexandra Reis pediu inicialmente 1,47 milhões de euros de indemnização no âmbito do seu acordo para cessar funções na companhia, sendo depois fixado "o valor ilíquido a pagar" de 500 mil euros.

Horas depois de António Costa dizer que ia falar com os dois ministros sobre "os passos seguintes" a dar, o ministro das Finanças anuncia, em comunicado, que demitiu Alexandra Reis.

Uma decisão, segundo Fernando Medina, para “preservar a autoridade política do Ministério das Finanças num momento particularmente sensível na vida de milhões de portugueses”.

28 de dezembro, Marcelo diz que "conclusão política" "foi retirada, e bem retirada"

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, considerou que "foi retirada, e bem retirada" a "conclusão política" do caso da secretária de Estado Alexandra Reis, defendendo que só havia uma solução após terem sido prestados esclarecimentos.

"É muito simples: uma vez apresentados os esclarecimentos era evidente que só havia uma solução, que foi aquela que foi seguida. Era evidente que realmente em termos, como eu assinalei desde o início, que era importante apurar a questão política, não tanto ética mas política, e não apenas jurídica. E foi retirada a conclusão política, e bem retirada”, defendeu.

O presidente do PS, Carlos César, pediu, numa publicação no Facebook, "mais atenção e mais proatividade" ao Governo ao fazer um balanço da sua ação após a "história indesejada, e indesejável, da curta permanência de Alexandra Reis" como secretária de Estado do Tesouro.

Ao início da noite, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou acreditar no ministro das Finanças quando Fernando Medina disse desconhecer a indemnização paga pela TAP a Alexandra Reis na altura em que esta foi convidada para ser secretária de Estado do Tesouro.

“Eu acredito quando os ministros dizem que não sabiam”, declarou, durante o jantar de Natal da Refood, em Lisboa.

29 de dezembro, Pedro Nuno Santos demite-se

Pouco depois das 00:00, o gabinete do ministro das Infraestruturas informou que Pedro Nuno Santos pediu a demissão, aceite pelo primeiro-ministro, António Costa.

Pedro Nuno Santos explicou que “face à perceção pública e ao sentimento coletivo gerados em torno” do caso da TAP, decidiu “assumir a responsabilidade política e apresentar a sua demissão”. Também o secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, apresentou a demissão.

António Costa aceita a demissão de Pedro Nuno Santos e agradece ao ministro a "dedicação e empenho com que exerceu funções governativas ao longo destes sete anos".

Nas reações, o líder do CDS-PP, Nuno Melo, é o primeiro partido a defender abertamente a dissolução do parlamento e antecipação das eleições.

Horas após a notícia da demissão, o presidente do Chega, André Ventura, sugeriu ao Presidente da República que “tem de ponderar se está ou não em causa o normal funcionamento das instituições” - uma das razões que podem justificar a dissolução do parlamento pelo Chefe do Estado.

Pela manhã, a Iniciativa Liberal anunciou uma moção de censura ao Governo do PS, no parlamento, onde o PS tem maioria absoluta.