Calhaz Jorge falava hoje na comissão parlamentar de Saúde enquanto membro do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA), que foi ouvido na sequência do acórdão do Tribunal Constitucional que considerou inconstitucionais algumas normas da lei da PMA, nomeadamente o anonimato dos dadores de gâmetas.

Respondendo a uma questão levantada pelo deputado do Bloco de Esquerda Moisés Ferreira sobre quantos dadores levantaram o anonimato, Calhaz Jorge disse que não tem essa estatística, mas adiantou que numa reunião com os centros de procriação medicamente assistida lhe foi transmitido que as mulheres estavam mais disponíveis para o fazer.

“Da conversa com os centros de PMA, na reunião do mês passado, foi transmitida a noção de que as dadoras de ovócitos se têm mostrado mais abertas a prosseguir com a dádiva sem anonimato e tem havido uma retração quase completa da parte masculina”, disse o diretor do centro de PMA do Hospital Santa Maria, em Lisboa.

Mas, salientou, “isto não me espanta, porque é um fenómeno que aconteceu em toda a Europa sempre que mudou o sistema. Na Suécia de repente desapareceram os dadores há uns anos e toda a gente vai à Dinamarca”.

“Aqui é o que vai acontecer”, disse, sustentando: “Mais uma vez, com a mediocridade que vem das capacidades financeiras e de mobilização vai-se criar um corrupio para Espanha”.

E, se as crianças vierem a querer a saber a identidade, "em Espanha o anonimato é obrigatório e, portanto, este nó nunca será desatado", frisou o especialista.

Segundo Calhaz Jorge, em 31 de dezembro de 2017 havia 7.495 embriões congelados decorrentes de doações de terceiros. “Uma parte destes estaria nos projetos familiares para daqui a um ano, dois ou três”, outros estariam para os próximos meses e outros “é muito possível que já não tivessem projeto parental”.

Para o médico, o problema coloca-se no destino que será dado a estes embriões. “Podemos conceber”, com todas as consequências negativas para a população e para os utentes, “a destruição de ovócitos e de espermatozoides, é mais difícil conceber a destruição de 7.000 embriões por razões meramente legislativas ou burocráticas”.

Falando sobre o que se passa no Serviço Nacional de Saúde nesta área, disse que “há défice de pessoas, há défice de espaço, há défice de dinheiro” e as listas de espera aumentam. “Só não aumentam mais porque as mulheres chegam aos 40 anos e têm de ser excluídas”, disse.

“Do ponto de vista prático, é quase uma obscenidade dizer a um casal que daqui a um ano e meio conseguimos fazer o primeiro tratamento dos três a que tem direito e que se tudo correr bem serão de seis meses”, salientou.

Dados avançados pelo especialista referem que 3% das crianças nascidas em 2016 resultaram de técnicas de PMA e destas 18% resultaram de técnicas envolvendo células de doadores terceiros.

Cerca de 13% dos cerca de 7.000 tratamentos feitos em 2016 incluíram células de dadores terceiros. Através deste número, é possível ter uma ideia de quantos estarão neste momento suspensos, observou.

Na atividade de 2016 em termos de PMA, houve um incremento no país à custa do setor privado, mas “o Serviço Nacional de Saúde atingiu o máximo e se houver problemas de recrutamento de alguém que se reforme só terá tendência a diminuir”, advertiu.