Num comunicado enviado à agência Lusa, intitulado “Uso arrepiante da pena de morte para reprimir ainda mais brutalmente a revolta popular”, a organização de defesa e promoção dos direitos humanos, com sede em Londres, dá conta de uma análise pormenorizada sobre os casos de 21 manifestantes detidos que correm o risco de serem condenados à morte após “julgamentos fraudulentos em Tribunais Revolucionários”.
As autoridades iranianas têm, nas últimas semanas, aumentado a pressão sobre o sistema judicial no país, apelando a “julgamentos rápidos e a execuções públicas”, em que a pena de morte tem sido utilizada como “instrumento de repressão política, uma nova forma de intimidação e repressão”, refere a AI.
A Amnistia Internacional adiantou estar preocupada com a possibilidade de que “muitos outros estejam em risco de vir a enfrentar a pena capital”, uma vez que são “milhares” as pessoas presas e o número de acusações emitidas pelas autoridades.
“Uma declaração parlamentar de 227 dos 290 deputados iranianos apelou ao poder judicial para ‘não mostrar clemência’ aos manifestantes, emitindo urgentemente sentenças de morte contra eles, de forma a constituir ‘uma lição’ para os restantes”, denuncia a organização no comunicado.
Segundo a AI, dos 21 detidos que arriscam a pena capital, seis foram acusados de “inimizade contra Deus” ou “corrupção na terra” e submetidos a um julgamento “conjunto” num Tribunal Revolucionário em Teerão, em que foi pedido para se acelerarem os procedimentos criminais, tendo como pano de fundo a pena capital.
Num outro documento oficial, datado de 29 de setembro e a que também teve recentemente acesso, a AI cita um chefe superior da polícia a pedir que o julgamento de um dos 21 acusados fosse concluído “no mais curto espaço de tempo possível” e que a sentença de morte fosse executada em público como “um gesto caloroso para com as forças de segurança”.
Nesse contexto, a AI denunciou os julgamentos “simulados” que são destinados a “intimidar” os participantes dos levantamentos populares que abalam o Irão desde setembro e a “impedir que outros se juntem ao movimento”.
As violações documentadas pela AI dos direitos de julgamentos justos contra os 21 indivíduos incluem a negação do direito de acesso a um advogado à sua própria escolha desde o momento da prisão e durante todo o processo de investigação e julgamento, negação do direito de ser presumido inocente, de permanecer em silêncio e não ser compelido a incriminar-se ou confessar-se culpado.
“Aos réus é sistematicamente negado o direito de serem protegidos contra tortura e outros maus-tratos, obter acesso total às evidências relevantes e receber uma audiência pública justa perante um tribunal competente, independente e imparcial”, denuncia a organização.
De acordo com o direito internacional, lembra a AI, a imposição da pena de morte após um julgamento injusto “viola o direito à vida e a proibição absoluta de tortura e outros maus-tratos”.
O Irão está mergulhado numa série de protestos desde 16 de setembro passado, dia em que Mahsa Amini, uma jovem curda de 22 anos, foi morta após ter sido presa três dias antes pela Polícia da Moralidade por usar incorretamente o véu islâmico, manifestações que estão a ser duramente reprimidas pelas forças de segurança iranianas.
Os protestos estão a ser liderados sobretudo por jovens e mulheres, em que são gritadas palavras de ordem como “mulher, vida, liberdade” e lançados ‘slogans’ contra o Governo, ao mesmo tempo que se assiste nas ruas à queima de véus, um dos símbolos da República Islâmica, algo impensável há pouco tempo, tal como os apelos à “morte de [o ayatollah Ali] Khamenei”.
Desde 13 de novembro, dia em que as autoridades anunciaram, em decisões separadas, que os Tribunais Revolucionários de Teerão condenaram à morte cinco pessoas não identificadas por “inimizade contra Deus” e “corrupção na terra” pelo que consideraram ter provocado “incêndios criminosos, destruição de propriedade e ataque fatal contra um membro das forças de segurança durante protestos na província de Teerão, refere a AI.
Por outro lado, lê-se no documento da AI, desde 29 de outubro que a imprensa estatal tem noticiado regularmente dados sobre o julgamento de nove homens por acusações relacionadas com os protestos e passíveis de pena de morte.
“As autoridades iranianas devem anular imediatamente todas as sentenças de morte, abster-se de impor a pena de morte e retirar todas as acusações contra os presos associados à participação pacífica em protestos. A pena de morte é a punição mais cruel, desumana e degradante e a natureza abominável é agravada por julgamentos criminais fundamentalmente simulados, sem transparência ou independência”, disse Diana Eltahawy, vice-diretora da AI para o Oriente Médio e Norte da África.
“Dois meses após o levantamento popular e três anos depois dos protestos de novembro de 2019, a crise de impunidade que prevalece no Irão está a permitir que as autoridades iranianas continuem a cometer assassínios em massa e a aumentar o recurso à pena de morte como uma ferramenta de repressão política”, sustenta a AI.
Os Estados membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU, que realizarão uma sessão especial sobre o Irão na próxima quinta-feira, pede a AI, devem criar “urgentemente um mecanismo de investigação e responsabilização para lidar com esse ataque total ao direito à vida e a outros direitos humanos”.
A AI adianta que tem estado a pedir a todos os governos com embaixadas no Irão que enviem “imediatamente observadores de alto nível para todos os julgamentos em curso”, que as autoridades iranianas disseram que serão públicos, “em que os réus correm o risco de serem condenados à morte”.
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