“Cada um de nós tem de assumir as suas responsabilidades, eu vou assumir as minhas. Eu serei candidato nas próximas eleições diretas por uma questão de coerência e convicção e gostava muito que o doutor Rui Rio também também pudesse ser candidato”, afirmou Montenegro, em entrevista à SIC.

"Rui Rio quebrou um ciclo de duas vitórias", referiu Luís Montenegro. "Não tenho qualquer guerra pessoal com o doutor Rui Rio, o que quero é um PSD ganhador".

O antigo deputado social-democrata classificou como “muito mau” o resultado do PSD nas legislativas de domingo, em que obteve 27,9% dos votos, e defendeu a candidatura de Rui Rio “em nome de uma clarificação no posicionamento e projeto de intervenção na sociedade” do partido, apontando a sua visão do PSD como de centro e centro-direita e alternativa ao PS.

“Eu não tenho nenhuma guerra pessoal contra o dr. Rui Rio, o que eu quero é um PSD ganhador e um PSD que seja alternativa ao PS. O PSD transformou-se nos últimos dois anos num partido subalterno ao PS e é preciso dizer chega, é preciso dizer basta”, afirmou.

Para Montenegro, “o PSD não pode estar todos os dias a reclamar entendimentos com o PS”, defendendo que os socialistas “não querem fazer reformas estruturais” e que o seu líder, António Costa, “não é um reformista”.

O antigo deputado recusou que Rio e a sua estratégia para o PSD possam ter evitado a maioria absoluta do PS, apontando que, com um resultado superior ao de domingo, Santana Lopes não evitou esse resultado de José Sócrates em 2005.

“O resultado do PSD é agravado, não conseguimos conquistar eleitores que não quiseram votar António Costa”, contrapôs, defendendo que ficou claro que “o PS era batível, António Costa era batível”.

Ainda assim, Montenegro deixou um elogio à prestação do atual presidente na campanha eleitoral, considerando que tudo seria diferente se Rui Rio tivesse feito “nos últimos dois anos o que fez nas últimas três semanas”, seguindo “uma estratégia de confrontação politica democrática”.

O candidato às liderança do PSD afirmou ainda que "António Costa era batível nestas eleições" legislativas. "O PSD colou-se ao Partido Socialista mostrando uma disponibilidade para ter um apoio que nunca teve e que nunca o Partido Socialista lhe deu".

Montenegro diz que o partido precisa de "coesão, união", que permita agregação "em torno de um líder", bem como "definição estratégica e ideologia". "É preciso pelo menos que não tenhamos complexos ideológicos e que não tenhamos nenhuma crise existencial a respeito disso", reforçou.

Sobre a liderança parlamentar que exerceu durante os anos da ‘troika’, assegurou não renegar nada da sua atividade política nos últimos 25 anos e “muito menos ter estado ao lado de Pedro Passos Coelho a recuperar o país”.

“Mas quem está aqui hoje não é Passos Coelho, nem Durão Barroso, nem Pedro Santana Lopes, nem Cavaco Silva. É uma pessoa que se chama Luís Filipe Montenegro e só respondo por mim”, afirmou.

Questionado sobre o processo judicial em que foi constituído arguido no ano passado pelo alegado crime de recebimento indevido de vantagem no caso das viagens do Euro 2016, o antigo deputado disse estar com a “consciência absolutamente tranquila” de que não cometeu nenhum crime.

“Não cometi nenhum crime, não vou deixar de exercer nenhum dos meus direitos cívicos e políticos e tenho a certeza de que não serei condenado”, afirmou, dizendo aguardar “com serenidade” pela conclusão do inquérito aberto há três anos.

Sobre o que fará se, na campanha interna ou na liderança do PSD, for acusado, Montenegro disse que não tirará nenhuma conclusão a não ser usar “todos os meios de defesa” ao seu alcance.

“Não me sinto minimamente limitado por isso, creio que não há nenhuma forma de se preencher o tipo legal do crime de recebimento de vantagem, mesmo que me tivessem sido oferecidas as viagens, que não foram”, assegurou.

"Eu quero um PSD grande. O PSD não pode ser o maior dos pequeninos, tem de ser o maior dos grandes".

Ser candidato à liderança do PSD, um cenário que Montenegro ponderou já em 2017

Há dois anos, quando o anterior líder Pedro Passos Coelho anunciou que se não se recandidataria na sequência do mau resultado nas autárquicas, Luís Montenegro fez uma “reflexão profunda” e acabou por concluir que não estavam reunidas as condições para avançar "por razões pessoais e políticas" e a presidência do PSD acabou por ser disputada entre Santana Lopes e Rui Rio.

Um mês depois, no Congresso de aclamação de Rio, Montenegro deixou um aviso de que poderia vir a disputar-lhe a liderança: “Conhecem a minha convicção e a minha determinação, se for preciso estar cá, eu cá estarei, para o que der e vier (…) Desta vez decidi não, se algum dia entender dizer sim, já sabem que não vou pedir licença a ninguém”.

Tal como anunciou nesse Congresso, Luís Montenegro deixaria o parlamento em abril do ano passado, 16 anos depois de tomar posse como deputado, e foi expressando pontualmente as suas divergências com a direção de Rui Rio.

Em outubro de 2018, ajudou a ‘travar’ a realização de um congresso extraordinário, promovido por André Ventura - que, entretanto, abandonou o PSD e fundou o Chega - mas a tensão interna abaria por ‘explodir’ em janeiro.

Em 11 de janeiro, Luís Montenegro desafiou Rui Rio a convocar eleições antecipadas no PSD, dizendo que não se resignava “a um PSD pequeno, perdedor, irrelevante, sem importância política e relevância estratégica”.

O presidente do PSD não aceitou o repto para marcar diretas um ano antes do previsto, mas levou a votos uma moção de confiança à sua direção, que foi aprovada em Conselho Nacional com 60% dos votos.

Na sequência dessa derrota, Montenegro defendeu que o seu desafio de clarificação “acordou um gigante adormecido” que é o PSD, e prometeu reserva pública nos meses seguintes quanto às divergências em relação a Rui Rio.

Desde então, o antigo líder parlamentar esteve praticamente em silêncio, aparecendo ao lado do cabeça de lista Paulo Rangel na campanha para as europeias, em que centrou as críticas no Governo, e na pré-campanha para as legislativas, em Lamego (Viseu), para “ajudar” a contrariar o que eram as sondagens negativas para o PSD.

Depois do Conselho Nacional de janeiro, terminou as suas colaborações regulares com órgãos de comunicação social e, segundo noticiou o Expresso, frequentou no verão um programa de gestão avançada para executivos e líderes do Instituto Europeu para Administração de Empresas em França.

Com eleições diretas previstas para janeiro, se o calendário não for alterado, Luís Montenegro é o primeiro candidato assumido à liderança do PSD, já que Rui Rio afirmou na noite eleitoral das legislativas – em que o PSD obteve 27,9% e para já 77 deputados – que iria “ponderar” com serenidade a sua continuidade.

Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves, 46 anos, e advogado de profissão, destacou-se como deputado – sempre eleito por Aveiro - e líder parlamentar do PSD, cargo que exerceu entre junho de 2011 e julho de 2017.

Montenegro estreou-se no parlamento aos 29 anos, em 2002, quando Durão Barroso era presidente do PSD e primeiro-ministro, depois de ter iniciado uma carreira política que começou na JSD e passou pela Câmara Municipal de Espinho, onde foi vereador.

Nas autárquicas de 2005, candidatou-se a presidente do município, mas foi derrotado por José Mota, do PS.

Nas disputas internas no PSD, Luís Montenegro foi tendo opções diferentes: nas diretas de 2007, entre Luís Marques Mendes e Luís Filipe Menezes, foi mandatário distrital do ex-autarca de Gaia; um ano depois, assumiu o lugar de porta-voz da candidatura à liderança de Pedro Santana Lopes, contra Manuela Ferreira Leite e Pedro Passos Coelho; já em 2010 apoiou Passos Coelho, contra Paulo Rangel e José Pedro Aguiar-Branco; nas últimas, em 2018, apoiou Santana Lopes contra Rui Rio já na reta final da campanha interna.

Montenegro foi apoiante da candidatura do atual Presidente da República, e Marcelo Rebelo de Sousa já retribuiu quando lhe entregou, no início do seu mandato, a medalha de ouro de Espinho: na ocasião, elogiou as suas “qualidades invulgares” e vaticinou-lhe “muitos sucessos políticos” ainda ao longo do seu mandato em Belém, que só termina em 2021.

A sua alegada pertença à mesma loja maçónica do ex-diretor dos serviços de informação Jorge Silva Carvalho – que, na altura, não confirmou nem desmentiu –, e as faltas parlamentares para assistir a jogos do FC Porto, clube do qual é adepto, e da seleção nacional foram algumas das polémicas que viveu na Assembleia da República.

Em junho do ano passado, foi noticiado que Luís Montenegro iria ser constituído arguido – a par dos então deputados Hugo Soares e Luís Campos Ferreira - pelo alegado crime de recebimento indevido de vantagem no caso das viagens do Euro 2016, por parte do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, tendo negado então a prática de qualquer crime e garantido que essas viagens foram pagas a expensas próprias.

(Notícia atualizada às 22h09)