Numa entrevista à Rádio Renascença e ao jornal Público divulgada hoje, Marcelo Rebelo de Sousa escusou-se a responder se considera, ou não, que a justiça melhorou no que respeita ao combate à corrupção durante o mandato da atual procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal: "Eu não gosto de fazer comentários específicos sobre protagonistas".
O chefe de Estado recusou igualmente pronunciar-se sobre a renovação, ou não, do mandato de Joana Marques Vidal, declarando que não irá "sequer pensar na matéria" até ao momento de ter de tomar uma decisão, perante uma proposta do Governo.
Antes, a propósito da atual situação do setor da justiça, apontou "duas realidades que são preocupantes": uma insuficiente prevenção da corrupção e a demora das decisões judiciais.
“Num Estado de direito democrático nós temos de ir renovando o sistema judicial, em todas as suas componentes, por forma a que não haja um risco do alongamento do tempo judicial, que será sempre mais longo", afirmou.
Fazendo uma retrospetiva dos últimos 20 anos no que respeita ao combate à corrupção, o Presidente da República concluiu que "houve uma mudança de mentalidade na sociedade e, portanto, de escrutínio", mas que "não foram muitos" os casos que chegaram a uma primeira decisão judicial.
"Foram pouco numerosos: um sobretudo no quadro financeiro, e outro no quadro, digamos assim, de relacionamento entre poder económico e poder político, mas não financeiro. Não foram muitos. Não foram muitos", acentuou.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, "obviamente que esta atenção que existe na sociedade portuguesa significou uma maior mediatização desta temática, e nasceu um tempo mediático, que, nalguns casos, é um tempo político".
Na opinião pública, de acordo com o Presidente, há a sensação de "um desfasamento enorme" da justiça face aos dois outros planos: "Passa um ano, passam dois anos, passam três, passam quatro, passam cinco anos".
"Isto pode ter depois consequências. A primeira é uma crítica em relação ao sistema judicial, achando que justiça que é muito lenta acaba por ser menos justa – porque chega tarde de mais. E algumas vezes eu encontro essa sensação em setores da sociedade portuguesa", disse.
Em segundo lugar, "há um outro risco. O risco é prescindir-se do tempo judicial", pensar-se que "isto é de tal maneira que nós morremos primeiro".
"Passa a ser irrelevante, e isto é grave num Estado de direito democrático, é irrelevante a decisão que houver", prosseguiu.
O Presidente acrescentou que se pode "começar a encontrar nos próprios protagonistas políticos esta reação: como não vai haver decisão judicial nos próximos longuíssimos anos, o melhor é começarmos a debater politicamente, chegamos a uma conclusão política, tomamos decisões políticas, e olhe, quando chegar a decisão judicial, fica para a memória".
"Mas, temos de convir, não é bom para o Estado de direito democrático", reforçou.
Marcelo Rebelo de Sousa disse que visitou o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) em setembro de 2016 precisamente para chamar a atenção para esta questão da demora da justiça.
"Se nós renunciamos à ideia de que num Estado de direito democrático é possível haver justiça em tempo, estamos a renunciar ao Estado de direito democrático", alertou.
Interrogado sobre os processos judiciais que envolvem o antigo primeiro-ministro José Sócrates e o antigo ministro da Economia Manuel Pinho, o chefe de Estado manteve a sua posição de "não comentar casos específicos e, por maioria de razão, sujeitos a intervenção ou pendentes de intervenção ou de investigação judicial".
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