O julgamento começou oficialmente em 2020, em Jerusalém, mas foi interrompido pela guerra em Gaza, que começou após o ataque do Hamas a 7 de outubro de 2023. Por razões de segurança, foi transferido para Tel Aviv, onde o primeiro ministro se declarou inocente em todos os casos. O chefe de governo do Estado de Israel é sujeito assim a vários depoimentos divididos em várias sessões, num processo que se arrasta por quatro anos e meio e acumula acusações internacionais.

Roi Maor, diretor de políticas públicas da ONG 120plus1 , afirmou em entrevista ao SAPO24 que "a acusação tem provas extensas contra ele, incluindo gravações áudio, múltiplas testemunhas e parece extremamente improvável" ser preso. Em Israel é comum estes processos serem arrastados durante muito tempo. Esta probabilidade altera a leitura do caso: "esta não é apenas uma questão de sobrevivência política para Netanyahu. É a sua própria liberdade pessoal que está em causa", lembra.

O caso foi apagado pela viragem da atenção mediática para o conflito entre Israel e o Hamas. Além disso, foram várias as vezes em que o primeiro-ministro pediu para adiar o julgamento, devido às guerras em curso em Gaza, no Líbano e na Síria. Antes disso, os problemas legais de Netanyahu dividiram a população e deixaram a política israelense num estado de vulnerabilidade que resultou em cinco rodadas de eleições.

A Procuradoria aceitou reduzir as audiências de três para duas por semana, reforçando que é de interesse público concluir os processos o mais rápido possível. "Bibi", como é apelidado, garantiu que não quer fugir à justiça, e que "esperou oito anos para dizer a verdade".

Dois anos depois do início do julgamento, no ano em que venceu as eleições, Netanyahu promoveu uma campanha de opressão dos poderes judiciais, que desencadeou um movimento de protestos em massa em Israel. Contudo, nega qualquer ligação entre a medida e o seu julgamento.

Hoje, o primeiro-ministro não admite a antecipação das legislativas marcadas para 2026, ciente da sua impopularidade no país. A carreira longa de Netanyahu é posta novamente em causa e, na comunidade internacional, a sua imagem fica mais frágil.

Durante as sessões no tribunal, apoiantes e críticos do primeiro-ministro rodearam o edifício com frases de ordem que alternavam entre "Netanyahu, o povo apoia-te" e "Bibi à prisão". "40% da população ainda apoia o governo, e muitos deles são apoiantes radicais realmente fervorosos", explica Roi Maor.

O último mandato emitido em seu nome foi pelo Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra e contra a humanidade na Faixa de Gaza. O primeiro-ministro está proibido de viajar e sair de Israel.

1º Caso: favorecimento e suborno

No primeiro caso, o tribunal alega que Netanyahu subornou a Bezeq Telecom Israel, um grupo de telecomunicações, no valor de cerca de 1,8 bilhão de shekels, cerca de 473 milhões de euros. Esta entidade seria detentora de um site de notícias que terá sido responsável pela cobertura enviesada e favorável da campanha de Netanyahu.

O canal era controlado por Shaul Elovitch, a quem Netanyahu ofereceu favores em troca da construção de uma boa imagem mediática sua e da sua mulher.

2º Caso: fraude e corrupção

No segundo caso, é acusado de ter aceitado presentes de empresários em troca de favores políticos, na quantia de 700 mil shekels, aproximadamente 175 mil euros. Em causa está o envolvimento de Arnon Milchan, um produtor de Hollywood e cidadão israelita, e de James Packer, empresário bilionário com grande domínio sobre o entretenimento australiano.

Os subornos incluíam, segundo a CNN, champanhe e charutos, oferecidos por Arnon Milchan, movido por interesses comerciais. Ainda assim, os empresários não sofreram acusações.

3º Caso: Fraude e abuso de confiança

Netanyahu volta a ser acusado de favorecer um jornal israelita, Yedioth Ahronoth, tendo supostamente negociado uma cobertura favorável em troca da criação de uma legislação feita para prejudicar um órgão de comunicação concorrente. O acordo foi alegadamente assinado com Arnon Mozes, proprietário do jornal.

A nova lei serviria para desacelerar o crescimento de um jornal rival e diminuir a concorrência. Neste caso, o diretor vai a tribunal com o primeiro-ministro.

O que esperar de próximas deliberações

Não se prevê que o fim do julgamento esteja perto, a não ser que Netanyahu proponha um acordo judicial. Essa possibilidade é também pouco provável, uma vez que Netanyahu nega as acusações e recusa demitir-se. Numa das últimas intervenções, a 10 de janeiro, insinua que as acusações têm apenas como objetivo “derrubar um primeiro-ministro de direita”.

“É preciso ser cego para não ver que aconteceu alguma coisa má”, continua. “Estamos a ver uma tentativa de levar a cabo uma revolução por via legal. É um processo manchado por interesses estrangeiros que tentam derrubar um primeiro-ministro de direita”, acusou, pedindo ainda que se crie “uma comissão que investigue os investigadores deste processo envenenado”.​

A lei israelita diz que um primeiro-ministro em funções não tem, obrigatoriamente, de renunciar ao cargo por estar envolvido num processo judicial. Só o tem de fazer no momento em que for condenado.

Caso as acusações pelos crimes de suborno se provem verdadeiras, Netanyahu pode ser condenado a até dez anos de prisão e/ou multa. Pelos restantes crimes, a pena pode ir até aos três anos de prisão.

As próximas eleições estão agendadas para 27 de outubro de 2026, mas muitos israelitas esperam que sejam antecipadas para este ano. O primeiro-ministro já se impôs contra esta ideia, anunciando que não vão acontecer antes de abril de 2025.

*Texto editado por Ana Maria Pimentel