O ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva, defendeu hoje que o porto de Sines pode vir a ser um dos grandes polos de desenvolvimento do país para o futuro, representando “não uma, mas duas Autoeuropas”.
“Sines pode ser um dos grandes polos de desenvolvimento do país para o futuro, podemos ter em Sines não uma, mas duas 'Autoreuropas' no futuro”, realçou António Costa Silva, na sua primeira intervenção na Assembleia da República enquanto novo ministro da Economia e do Mar, durante o debate sobre o programa do XXIII Governo Constitucional, que continua hoje.
Para o governante, o porto de Sines pode tornar-se um centro de tecnologias ‘verdes’ e biocombustíveis para “a marinha e todas as forças que se movimentam no mar”, bem como um centro de importação de gás natural liquefeito (GNL).
António Costa Silva realçou que a economia portuguesa está a atravessar um “momento difícil”, “duramente fustigada” pela pandemia e pela guerra da Ucrânia e, por isso, é necessário colocar o “mais rapidamente possível no terreno” um pacote de medidas para fazer face ao “quadro muito difícil” que enfrentam as famílias portugueses.
Simultaneamente, apontou Costa Silva, é necessário “pensar a longo prazo” e fazer um “esforço extraordinário” na aplicação dos fundos europeus, com uma estratégia económica que assenta em seis pilares fundamentais: qualificação e competências dos trabalhadores, capitalização das empresas, inovação tecnológica, literacia financeira e digital, ecossistema de inovação e exportações/importações.
“Temos de ter estratégia inteligente para substituição das exportações que fazemos. Se nós trabalharmos exportações e importações de forma articulada, vamos ter o caminho para o futuro”, afirmou o ministro da Economia e do Mar.
Costa Silva admite imposto sobre lucros inesperados das empresas
O Governo admite considerar um imposto sobre os lucros extraordinários das empresas devido aos aumentos dos preços, disse hoje o ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva.
“Em primeiro lugar, não podemos hostilizar as empresas, mas o que vamos fazer é falar com elas e provavelmente considerar um imposto, um ‘windfall tax’ [taxa de imposto sobre lucros que resultam de ganhos inesperados de empresas ou setores específicos], para os lucros aleatórios e inesperados que estão a ter”, disse.
O ministro da Economia e do Mar respondia às questões de Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, sobre se o Governo iria agir relativamente às margens das empresas de energia e das “empresas de retalho que estão a aumentar os preços”.
“Estamos a acompanhar [os preços da energia] evidentemente com muita preocupação. Já passámos por muitas outras crises como a dos anos 70. Temos aqui quase uma reprodução dessa crise com tudo o que ela tem de impacto na vida das pessoas”, afirmou.
BE quer saber “como, quando e aonde” o Governo vai taxar lucros extraordinários das empresas
Na intervenção de fundo do Bloco de Esquerda durante o debate, o líder da bancada parlamentar bloquista, Pedro Filipe Soares, citou o poeta Mário de Sá-Carneiro para afirmar que falta ao Governo “o tal golpe de asa que o país precisa” para combater uma “inflação galopante”.
Filipe Soares acusou o Governo de salvar “os milhões de alguns enquanto o resto do país continua a contar os tostões” e de não querer “atacar onde o dinheiro realmente está”, elencando lucros milionários de empresas como a EDP, Galp ou Pingo Doce.
“É incompreensível, é inaceitável, é uma realidade que mostra até alguma insensibilidade social. É certo que não é a tal pressinha que ontem [quinta-feira] o PSD falava, mas é o mesmo desrespeito perante o salário e perante a inflação que o ameaça”, afirmou.
Criticando o “silêncio enorme” do Governo quando questionado sobre o que pretende fazer quando os “preços sobem à mesma medida que sobem os lucros dos grandes grupos económicos”, Pedro Filipe Soares abordou o anúncio de Costa Silva, que admitiu a criação de uma ´windfall tax’, e que qualificou como “uma taxa para taxar os lucros abusivos das empresas”.
“Este anexo é, de facto, muito mais interessante do que aquele documento original que o Governo nos trouxe: qual taxa, para que setores, em que dimensão, qual a duração? É que essas são as perguntas essenciais que as pessoas precisam de saber: como é que o Governo vai agir para que o seu salário dure mais?”, inquiriu.
O bloquista questionou se o “Governo reconhece afinal que há lucros excessivos” das empresas e que existe um fenómeno de “cartel nos hipermercados em Portugal, que as pessoas estão a ser roubadas quando vão ao hipermercado por causa desse cartel”.
“Esta imoralidade, este ataque aos salários, vai merecer alguma resposta?”, interrogou.
O deputado do PS Luís Soares – o único que fez um pedido de esclarecimento após a intervenção de Pedro Filipe Soares – afirmou que os governos socialistas, “acompanhados em alguns momentos pelo BE”, têm tido a “boa característica” de serem capazes de “olhar para a árvore, mas também olhar para a floresta”.
“Depois de volvidas umas eleições, depois de os portugueses terem dito que queriam uma grande maioria estável, eu pergunto: o BE está disponível para agora, novamente, continuar a construir uma solução, fazer avançar o país, com o PS?”, interrogou.
Na resposta, Pedro Filipe Soares afirmou que, no caso atual, “a árvore é o salário mínimo nacional que, pela primeira vez em vários anos, cresce abaixo daquilo que se verificaria necessário para cobrir a inflação”, e a “floresta é que a larguíssima maioria de todos os outros salários crescem muitíssimo menos do que ao que era necessário para cobrir a inflação”.
O bloquista acusou o primeiro-ministro, António Costa, de, no que se refere ao “problema da árvore e da floresta”, ter apenas dito que tocar nos salários iria aumentar a inflação e o que o fenómeno inflacionário era “temporário”.
“A pergunta que lhe devo colocar é: qual é a base do ‘aguenta, aguenta’ do Governo? O povo ‘aguenta, aguenta’ uma inflação durante dois meses, três meses, quatro meses, um ano? De 5%, 6%, 7%? ‘Aguenta, aguenta’ até quando? É que o imobilismo do PS deixa marcas permanentes na perda de poder de compra das famílias”, acusou.
Rio concorda em taxar lucros conjunturais devido à guerra ou pandemia
O presidente do PSD, Rui Rio, disse concordar com a possibilidade avançada pelo Governo de taxar lucros conjunturais que podem acontecer em alguns setores devido ao contexto de guerra na Ucrânia.
Rui Rio foi questionado pelos jornalistas no parlamento sobre a possibilidade avançada hoje de se “considerar um imposto, um ‘windfall tax’".
O líder do PSD disse não ter ouvido as palavras do ministro e, caso se se tratasse de taxar lucros excessivos, seria contra, defendendo que “uma empresa que está no mercado é para ganhar dinheiro” e pagará mais IRC quanto mais lucrar.
“Se a ideia é que lucros decorrentes da situação conjuntural que vivemos, que esse adicional de lucro seja taxado adicionalmente concordo”, ressalvou Rio, dizendo que se tal se pode aplicar quer à pandemia de covid-19 quer às consequências da guerra da Ucrânia.
Nesse caso, Rio disse concordar com a ideia de taxar de forma diferenciada setores que “por efeitos indiretos da guerra estão a ter lucros fora do normal”.
“Quando nós vivemos uma situação anómala, como na pandemia e na guerra e há setores de nicho que ganham com isso quando todos os outros perdem, esses devem contribuir mais, se é isso estou de acordo”, reforçou.
O presidente do PSD voltou a acusar, como fez no primeiro dia do debate e perante o primeiro-ministro, António Costa, que o Governo “vai continuar a ganhar dinheiro com o preço dos combustíveis”, embora possa ganhar menos com a redução do ISP anunciada na quinta-feira.
Rio explicou que, quando o Orçamento do Estado para 2021 foi elaborado, o preço do crude rondava os 51 dólares, tendo subido em outubro para os 79 e situando-se atualmente à volta dos 100 dólares.
“Ao reportar-se a outubro, o governo vai dar a diferença entre os 79 e os 100, vai ficar para ele com a diferença entre os 51 e os 79, fica com uma diferença maior do que aquela que está a dar”, criticou.
Questionado se se deve manter a devolução de uma parte do aumento através do programa Autovoucher, Rio admitiu que, no atual contexto, “é preferível que continue”, mas defendeu não ser “a solução ideal”, até porque nem todos sabem ou querem aderir.
“O ideal era que o Governo abdicasse e desse aos contribuintes todo o ganho extraordinário que está a ter”, defendeu.
Ainda sobre o primeiro dia de debate, Rio foi questionado se acreditava na garantia deixada por António Costa, de que ficará no Governo por “mais quatro anos e seis meses”.
“Fiquei convencido de que ele não sai muito bem na fotografia se daqui por dois ou três anos resolver ir embora depois de tantas afirmações dele próprio e de outros membros do Governo. Se fica ou não, não sei, mas admito que sim, está a afirmar de forma tão perentória, não tenho razões para desconfiar que não”, respondeu.
A discussão do Programa do Governo
O debate do Programa do XXIII Governo Constitucional termina hoje na Assembleia da República com a votação da moção de rejeição apresentada pelo Chega, que deverá contar unicamente com os votos a favor dos deputados do partido proponente.
O primeiro dos dois dias de debate ficou marcado pela garantia dada pelo primeiro-ministro, António Costa, de que cumprirá o mandato até ao fim, quebrando assim o silêncio sobre a sua hipotética saída para um cargo europeu daqui a dois anos e meio.
O chefe do executivo anunciou que a proposta de Orçamento de Estado de 2022 será apresentada na próxima semana e antecipou que o crescimento económico será "um dos desafios centrais" da governação nos próximos quatro anos.
O Programa do XXIII Governo Constitucional corresponde basicamente ao programa eleitoral que o PS apresentou para as legislativas de 30 de janeiro, que venceu com maioria absoluta, elegendo 120 dos 230 deputados da Assembleia da República.
Este programa identifica quatro “desafios estratégicos” de médio e longo prazo: resposta à emergência climática, transição digital, interrupção da atual crise demográfica e combate às desigualdades.
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