Esta é uma das muitas conclusões do estudo “Os jovens em Portugal hoje: Quem são, o que pensam e o que sentem”, que inquiriu 4.900 jovens entre os 15 e 34 anos sobre questões tão diversas como o trabalho, as relações, a felicidade ou a participação política para traçar um retrato completo da juventude.
Em cerca de 475 páginas, é descrita uma juventude que não é homogénea, cuja vida é influenciada por diferentes aspetos, sobretudo pela idade e pelo seu nível de empoderamento.
Porém, algo que a responsável do estudo destaca neste retrato tão diversificado é as diferenças persistentes entre homens e mulheres.
“Surpreendeu-me muito tudo o que tem a ver com a socialização que, em Portugal, se faz das mulheres e dos homens, que é muito distinta em todas as facetas da vida”, disse em declarações à Lusa a economista Laura Sagnier.
Uma das diferenças entre eles e elas que mais surpreendeu a investigadora foi, no caso dos jovens casais, a distribuição das tarefas domésticas e relacionadas com o cuidado e educação dos filhos: segundo o retrato da FFMS, as mulheres consideram que fazem três vezes mais trabalho não pago do que os companheiros.
“Isso é um sério problema”, sublinha Laura Sagnier, justificando que, por muito que legalmente haja uma igualdade de oportunidades, se as mulheres forem sobrecarregadas em casa, comparativamente aos homens, é difícil que essa igualdade se verifique noutros contextos.
E a origem do problema, no entender da investigadora, está precisamente na socialização de rapazes e raparigas, que parece ser atualmente muito diferente e tem tradução numa série de outros aspetos.
Por exemplo, na forma como respondem a diferentes questões relacionadas com as práticas sexuais: a relação com a masturbação, ‘sexting’, consumo de pornografia e prostituição é muito mais estreita entre os homens do que entre as mulheres.
No que respeita às situações de assédio ou violência, 43% das mulheres jovens dizem ter sofrido violência psicológica, comparativamente a 29% dos homens jovens. A diferença é ainda maior quando está em causa violência física ou sexual, sofrida por 30% das mulheres e 8% dos homens.
Por outro lado, 34% das mulheres referem ter-se sentido discriminadas simplesmente por serem mulheres, enquanto apenas 6% dos jovens dizem ter sentido o mesmo por serem homens, havendo também mais mulheres a sentirem-se discriminadas tanto pela idade como pela orientação sexual.
Não só pelo género se encontram diferenças entre os jovens em Portugal, sendo a educação outro dos principais fatores que impacta a qualidade de vida dos jovens não só em termos laborais, mas também no quão felizes se sentem.
Quanto ao trabalho, quem estuda mais tem, em média, maior probabilidade de encontrar emprego, de auferir rendimentos superiores e de obter vínculos contratuais mais estáveis.
Por outro lado, o nível de escolaridade contribui para a forma como os jovens se sentem com a vida e, a este nível, enquanto entre os jovens com um nível de escolaridade inferior, 36% se sentem pouco felizes, 28% daqueles que finalizaram o ensino superior sentem-se assim.
“Ter mais estudos não garante mais felicidade na vida, mas garante menos infelicidade”, resumiu Laura Sagnier que, por outro lado, e de forma algo contraditória, os jovens com níveis de escolaridade mais elevados sentem mais pressão social do que os restantes relativamente a ter filhos, não desiludir os pais ou a família e ser bem-sucedidos nas relações amorosas.
Falando em felicidade, apesar das várias diferenças identificadas entre os jovens, que levam a investigadora a afastar um retrato comum da juventude, há um aspeto que parece ser transversal: a satisfação com o próprio corpo.
Segundo o estudo, a preocupação dos jovens com o seu físico é o fator que mais contribui para a sua felicidade ou infelicidade e metade dos jovens (52% entre as mulheres e 50% entre os homens) diz estar pouco satisfeito com o próprio corpo.
Para Laura Sagnier, este número é reflexo da massificação das redes sociais: “Estão todo o dia a confrontar-se com corpos e caras que não existem na realidade, que são ‘fake’”.
Outro dos muitos aspetos analisados foi a atitude dos maiores de 18 anos perante o voto e neste âmbito os resultados parecem mostram que, entre os eleitores mais novos, 53% dizem votar em todas as eleições e apenas 14% nunca votaram.
A maioria (74%) defende ainda que “quem não vota também não tem direito a queixar-se dos governantes”.
O retrato será apresentado e discutido no Encontro da FFMS, “Juventudes”, que reúne entre hoje e domingo especialistas nacionais e internacionais para falar sobre os jovens e debater os desafios que enfrentam no Pavilhão Carlos Lopes, em Lisboa.
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