Após quatro sessões e a inquirição de cerca de 20 testemunhas, a juíza presidente, Ângela Reguengo, agendou para as 09:30 de 15 de dezembro as alegações finais, nas quais o procurador do Ministério Público (MP), Luís Carvalho, e o advogado do arguido, Tiago Rodrigues Bastos, vão apresentar os argumentos para a condenação ou absolvição do presidente da Câmara do Porto.
Rui Moreira está a ser julgado no Tribunal de São João Novo, no Porto, no processo Selminho, acusado de prevaricação, por favorecer a imobiliária da família (Selminho), da qual era sócio, em detrimento do município, no litígio judicial que opunha a autarquia à imobiliária, que pretendia construir um edifício de apartamentos num terreno na Calçada da Arrábida.
A defesa de Rui Moreira prescindiu da inquirição de Paulo Morais e de Pedro Baganha, antigo e atual vereador do urbanismo.
Gonçalo Gonçalves, vereador com o pelouro do urbanismoque, entre 2009 e 2013, no último mandato do então presidente do município, Rui Rio, foi a única testemunha arrolada pela defesa do arguido a ser ouvida em julgamento.
O ex-vereador explicou que, atendendo a um parecer do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), que “abria a porta e apontava para que pudesse haver zonas edificadas” no terreno da Selminho, os serviços camarários decidiram que a pretensão da imobiliária não podia ser acolhida na alteração do PDM, de 2012, mas que podia ser “reequacionada” em sede de revisão do PDM, de 2016.
“Eram precisos mais estudos aprofundados. Estudos geológicos, geotécnicos. Entendeu-se na altura que a pretensão da Selminho não podia ser acolhida em sede de alteração do PDM e que devia ser reequacionada em sede de revisão do PDM, o que implicava uma maior complexidade de estudos”, explicou a testemunha.
Rui Moreira marcou presença em todas as sessões de julgamento, que arrancou em 16 de novembro.
O autarca assumiu em tribunal ter sido “incauto” ao assinar uma procuração a um advogado para representar o município no litígio que mantinha com a Selminho, sublinhando que o fez por indicação de Azeredo Lopes.
Na primeira sessão de julgamento, Moreira justificou que só passou a procuração ao advogado Pedro Neves de Sousa, externo ao município, em dezembro de 2013, cerca de dois meses após tomar posse como presidente da câmara, porque o seu então chefe de gabinete, o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, lhe disse que devia assinar o documento, pois, só assim, estariam salvaguardados os interesses do município no litígio judicial.
Ouvido pelo tribunal em 17 de novembro, Azeredo Lopes explicou que, quando aconselhou Rui Moreira a passar a procuração, estava convicto de que o departamento jurídico da Câmara do Porto sabia da ligação familiar do autarca à Selminho.
Já o diretor municipal do departamento jurídico do município, entre fins de setembro de 2013 e 11 de dezembro de 2013, afirmou desconhecer “em absoluto” a procuração em causa.
“Desconheço em absoluto essa procuração. Se ela é de 28 de novembro [de 2013] como é referido, eu ainda estava em funções e não conheço essa procuração. O departamento jurídico e contencioso devia estar envolvido neste processo e não foi”, declarou Miguel Queirós, após a inquirição de Azeredo Lopes.
Por seu lado, a ex-chefe do departamento jurídico da câmara Raquel Maia disse em tribunal que não recebeu instruções de Rui Moreira nem o autarca teve intervenção nas negociações entre o município e a Selminho.
Rui Moreira tomou posse em 22 de outubro de 2013 e, questionada sobre a procuração, passada pelo autarca em 28 de novembro, Raquel Maia revelou também desconhecer essa procuração com poderes especiais.
Guilhermina Rego, antiga vice-presidente de Rui Moreira, disse que assinou o acordo com a Selminho por ser “a melhor solução” para o município do Porto, em função da informação transmitida pelos departamentos de urbanismo e jurídico, garantindo que Moreira “nunca” falou com ela sobre o processo.
Questionada em 18 de novembro pelo procurador do MP se tinha conhecimento da procuração, a ex-autarca também disse desconhecer.
“Não me foi dito da existência de uma procuração”, respondeu Guilhermina Rego.
O acordo entre o município e a Selminho, assinado em 24 de julho de 2014, previa o reconhecimento da edificabilidade do terreno em causa, por alteração do Plano Diretor Municipal (PDM), ou, se isso não fosse possível, indemnizar a imobiliária num valor a ser definido em tribunal arbitral, caso houvesse lugar ao eventual pagamento de indemnização.
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