"Depois de consultar especialistas em todo o mundo e rever as evidências de maneira exaustiva, decidimos que essa condição deveria ser acrescentada", disse à AFP Shekhar Saxena, diretor do departamento de saúde mental e abuso de substâncias da organização Mundial de Saúde (OMS).  O "distúrbio de jogos" on-line e off-line é agrupado com os "transtornos relacionados ao uso de substâncias ou comportamentos viciantes" na 11ª edição da CID, a primeira grande revisão em quase três décadas.

A OMS anunciou em janeiro que o problema seria reconhecido como uma condição patológica.

Os principais sintomas incluem "controle deficiente" - notavelmente a incapacidade de parar de jogar - e se concentrar no jogo excluindo todo o resto.

"A pessoa joga tanto que outros interesses e atividades são ignorados, incluindo dormir e comer", disse Saxena.

Em casos extremos, os jogadores que não conseguem se distanciar de um ecrã desistem da escola, perdem empregos e ficam isolados dos amigos e da família. A maioria esmagadora dos adeptos aos videojogos é jovem, muitos deles adolescentes.

O comportamento sintomático deve continuar por pelo menos um ano antes de ser considerado perigosamente nocivo, de acordo com a nova classificação.

Cerca de 2,5 mil milhões de pessoas - uma em cada três no mundo - jogam algum tipo de jogo gratuito em ecrãs, especialmente em telemóveis, mas o distúrbio afeta apenas uma "pequena minoria", disse Saxena. "Não estamos a dizer que todo jogo é patológico"

A indústria de videojogos arrecadou 108 mil milhões de dólares em todo o mundo em 2017, mais do que o dobro das bilheterias de filmes, segundo a Superdata, que monitora o setor de jogos e de media interativa.

Quase 40% dessas vendas foram no leste da Ásia, especialmente na China e na Coreia do Sul. Outros mercados importantes incluem os Estados Unidos, a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha e o Brasil.

Na Coreia do Sul e nos Estados Unidos surgiram clínicas para tratar o vício em videojogos, em conjunto com  com grupos de apoio comunitários e on-line.

A inclusão do "distúrbio de videojogos" no catálogo revisto de doenças da OMS encontrou resistência, tanto da indústria como de alguns especialistas.

"O processo da OMS carece de transparência, é profundamente defeituoso e carece de apoio científico", disse Michael Gallagher, presidente e CEO da Entertainment Software Association, em comunicado em março.

Num estudo a ser publicado no Journal of Behavioral Addictions, um grupo de 36 investigadores disse que havia evidências insuficientes para justificar a nova categoria.

"Dada a gravidade da classificação diagnóstica e do seu impacto social mais amplo, pedimos aos nossos colegas da OMS para pecarem por excesso de precaução por enquanto e adiarem a formalização", escreveram num estudo que reviu a literatura académica.

O CID identifica cerca de 55.000 lesões, doenças, condições e causas de morte, e é amplamente utilizado como referência para diagnósticos e seguros de saúde.

"Isso permite-nos entender muito sobre o que faz as pessoas adoecerem e morrerem, e tomar medidas para evitar o sofrimento e salvar vidas", disse o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, num comunicado.

O novo CID também inclui pela primeira vez um capítulo sobre medicamentos tradicionais, usados por milhões de pessoas em todo o mundo.