Andreja Pejic, nascida na Bósnia em 1991, foi para a Austrália em pequena como “refugiada”. Foi naquele país que descobriu que “tinha problemas de género”. “Sentia-me uma rapariga”, contou hoje em Lisboa, na Web Summit. À Internet agradeceu o facto de ter “descoberto muito nova o que era ser trans”.
Aos 17 anos, quando trabalhava numa cadeia de ‘fast-food’ foi 'descoberta'. No início da carreira trabalhava como modelo andrógino. “Era apelidada de o rapaz mais bonito do mundo”, disse. Há dois anos decidiu “completar a transição e viver a vida como uma modelo”.
Acordar da operação de mudança de género foi “uma experiência surreal”. “Não muda a pessoa que és, sou a mesma, tenho as mesmas ideias”, referiu, acrescentando que “não é fácil, é duro”. “Mas estou esperançosa no futuro e que as pessoas abram a mente, para que o nível de respeito aumente”, partilhou.
A transição foi algo que fez por si mesma. A ideia de, através do documentário, “fazê-lo publicamente foi uma causa maior”.
“Estava em boa posição de mudar a moda, de ajudar a acabar com o preconceito”, referiu, sublinhando a consciência que tinha do risco que corria.
Se o tivesse feito cinco anos antes, “provavelmente não estaria hoje a falar na Web Summit”. “Há cinco anos era completamente diferente. Não havia respeito nos ‘media’, mas o movimento tornou-se mais visível, com pessoas a assumirem a mudança. Não sei se a minha carreira continuaria. Corri um risco, mas correu tudo bem”, considerou.
Andreja Pejic tem noção que teve “muita sorte”. “A maioria das pessoas da minha comunidade não tem estas oportunidades. Eu tenho sorte, porque posso falar publicamente disto e continuo a trabalhar e isso é novo”, afirmou.
Hoje, “mais do que nunca”, a modelo sente que tem “responsabilidade de espalhar paz e amor”.
“Ainda há muitos trans a viver em segredo. Nem toda a gente tem que ser ativista, mas é diferente não levares isto muito a sério e teres medo de contar porque vai estragar-te a vida”, lamentou.
Na vida diária, tal como na indústria em que trabalha, a modelo disse não sentir preconceito. “Passo bem por mulher e isso ajuda [a que não sinta preconceito quando anda nas ruas]”, referiu, sublinhando que sente “mais preconceito online”.
“Quando sai um artigo sobre mim [num jornal ou revista na internet] leio muitos comentários negativos. As pessoas são muito ignorantes”, lamentou.
A viver em Nova Iorque, Andreja Pejic esteve atenta às eleições norte-americanas. Para ela, o novo presidente do país, Donald Trump, representa uma “rebelião contra o status quo, mas não numa maneira boa”.
“É perigoso para as minorias, é mau para quase toda a população, também para quem votou nele”, afirmou, garantindo não querer mudar de país. “É bom voltar lá, enfrentar a opressão e construir um movimento para um novo mundo, [até porque] o mundo está a ficar um lugar problemático em todo o lado”, disse.
Para uma pessoa que, “desde o liceu, avisava os outros que o capitalismo estava a levar-nos a uma altura de fascismo e de guerra é triste ver o fascismo crescer nos dois lados do atlântico”.
Nos dias em que está menos bem, Andreja Pejic acede às suas contas nas redes sociais Facebook e Twitter, através das quais é contactada por “pessoas de todo o mundo”: “É maravilhoso receber mensagens de pessoas que sentem que têm um exemplo positivo, alguém para mostrar aos pais, um ponto de referência”.
A Web Summit de Lisboa, que arrancou na segunda-feira e termina hoje, conta com mais de 53.000 participantes, de 166 países, incluindo 15.000 empresas, 7.000 presidentes executivos e 700 investidores.
Entre os oradores, estarão os fundadores e presidentes executivos das maiores empresas de tecnologia, bem como importantes personalidades das áreas de desporto, moda e música.
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