“Amy”, percebe-se. A voz parece a de uma criança. Aguda, desengonçada. Todavia, não é um humano que fala. É uma baleia. Uma orca, ou baleia assassina, chamada Wikie, que consegue “falar”.

Posto assim, parece a premissa para um filme de domingo à tarde. Sendo justos à ciência, não podemos dizer que o animal fala. Antes, imita alguns padrões do discurso humano. São as conclusões de um estudo que mostra que as orcas são capazes, por vezes logo à primeira tentativa, de dizer — imitar — palavras como “hello” (olá), “one, two” (um, dois) e “bye-bye” (adeus).

Os responsáveis pelo estudo, citados pelo jornal britânico ‘The Guardian’, dizem que esta descoberta ajuda a perceber de que forma as diferentes comunidades de orcas desenvolveram diferentes dialetos. As novas conclusões apontam para a ideia de que resultam de alguma forma de imitação.

Já se sabia que as orcas eram capazes de imitar movimentos de outras orcas e até sons de outros animais, como golfinhos ou leões marinhos. A experiência com padrões de comunicação humanos pretendia testar a flexibilidade destas orcas na cópia de sons. Para isso, era necessário confrontar estas baleias assassinas com um leque de sons que não estivesse no “repertório” habitual destes animais. “‘Olá’ é uma coisa que uma baleia assassina diria”, explica Josep Call, professor de origens evolucionárias na universidade de St. Andrews e co-autor deste estudo.

Não será possível, contudo, ter uma conversa com estes gigantes dos mares. É que não há indícios de que os animais percebem os significados por trás dos sons que emitem, explica Call, que fez parte da equipa que pôs Wikie a dizer coisas.

Os investigadores da Alemanha, Reino Unido, Espanha e Chile que se puseram a falar com a baleia francesa de 14 anos dificilmente poderão, por isso, esclarecer junto da orca outro género de assuntos.

Ou talvez não. Jose Abramson, da Universidade Complutense de Madrid, co-investigador, disse que, no futuro, pode ser possível ter “conversações” básicas com o animal. “Se houver etiquetas do que as coisas são”, diz o cientista, citado pela BBC. “Isso já foi feito no passado com um famoso papagaio cinzento e com golfinhos que usavam língua gestual americana; frases como ‘traz-me este objeto’ ou ‘põe este objeto por baixo ou por cima de outro’”.

Todavia, ensinar baleias a falar inglês pode não ser o caminho para perceber mais sobre a comunicação destes animais, alerta o investigador. “Temos mais a ganhar se tentarmos perceber a forma natural como cada espécie comunica no próprio ambiente do que a tentar ensinar-lhes uma linguagem humana”, diz Abramson.

Na revista especializada 'Proceedings of the Royal Society B: Biological Sciences', os investigadores descrevem como puseram o animal, uma fêmea que live num aquário em França. Esta orca já tinha experiência na imitação de ações de outras orcas, reagindo a gestos humanos.

Depois de alguns treinos, que passaram pela imitação de sons de orca pela orca e pela imitação de sons de orca por humanos, foram-lhe introduzidas palavras (ou sons de palavras) humanas. São seis sons humanos: “hello”, “Amy”, “ah ha”, “one, two” e “bye bye”.

São palavras simples. Traduzindo para português, estamos a falar de olá, adeus, números e o nome Amy. “Não podes escolher uma palavra que seja muito complicada porque depois, penso, estás a pedir demasiado — quisemos coisas que fossem curtas, mas também distintivas”, explica Josep Call.

A simplicidade, todavia, não significa que a avaliação não fosse formal. Wikie foi avaliada pelos treinadores e por seis avaliadores independentes. E passou com distinção. A palavra “hello”, por exemplo, foi corretamente reproduzida mais de 50% das vezes.