Luís Pinheiro - que está a ser ouvido na comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas em Lisboa com um dos medicamentos mais caros do mundo - disse que a sinalização do casos das duas crianças com atrofia muscular espinal foi "feita junto do departamento de pediatria pela secretaria de Estado, através de mensagem de correio eletrónico".
"Na sequência dessa sinalização foi tomada a decisão por parte da equipa clínica, corroborada por mim próprio, de que haveria indicação clínica para a realização da consulta", que aconteceu em 05 de dezembro de 2019, afirmou o responsável na primeira ronda de perguntas dos deputados.
O ex-diretor salientou que a "decisão de marcar ou não marcar uma consulta é uma decisão clínica" e considerou que "é irrelevante a origem da sinalização ou da referenciação".
Aos deputados, Luís Pinheiro negou ter insistido para o que o agendamento fosse feito.
"Eu não fiz nenhuma insistência, nem tal seria necessário", indicou, justificando que também não recebeu "nenhum contacto de ninguém superior, inferior ou paralelo ao senhor secretário de Estado".
Quando foi ouvida na mesma comissão de inquérito, a médica que acompanhou as crianças disse que a diretora de pediatria do Hospital de Santa Maria, Ana Isabel Lopes, lhe transmitiu que o pedido de marcação da consulta das duas gémeas teria sido feito por "alguém superior ao secretário de Estado" da Saúde. A neuropediatra Teresa Moreno relatou também insistências por parte de Ana Isabel Lopes para que o agendamento fosse feito, com referências a Luís Pinheiro, que a diretora do departamento recusou, tal como o ex-diretor clínico.
"A afirmação da doutora Teresa Moreno é, no que me diz respeito, falsa", afirmou Luís Pinheiro, insistindo: "Não transmiti a Ana Isabel Lopes que tivesse recebido de quem quer que fosse - superior, inferior, paralelo, lateral ao senhor secretário de Estado - qualquer indicação, porque não recebi indicação de ninguém para a marcação de nenhuma consulta".
O antigo diretor justificou a sua intervenção "dado o contexto particular desta doença" e a possibilidade de implicar um tratamento com um contexto financeiro particular, mas defendeu que um "diretor clínico não dá ordens sobre a atuação clínica dos médicos", que atuam livremente e "de acordo com a sua consciência".
Luís Pinheiro assinalou que as gémeas luso-brasileiras não passaram à frente de outras crianças, e que "não há lista de espera".
O ex-diretor clínico, que é um dos arguidos neste caso que está a ser investigado também pelo Ministério Público, disse ainda não se rever "no reparo" da IGAS quanto a não ter sido respeitada a portaria que regula o acesso dos utentes ao Serviço Nacional de Saúde, questionando "quantas consultas são feitas no país todos os dias que não seguem a via da portaria".
"Isto está errado que aconteça? Acho que não, desde que ninguém seja prejudicado", sustentou, indicando que "foi o que aconteceu nesta situação" e que "não houve compromisso da equidade".
O ex-diretor clínico contrariou outro relato da neuropediatra Teresa Moreno, nomeadamente quando disse que a mãe das crianças terá garantido ter todas as assinaturas necessárias, até à ministra da Saúde, que na altura era Marta Temido.
O clínico disse que a "ministra da Saúde não tem nenhuma interferência em nenhum momento neste processo" de acesso ao medicamento, pois "não é preciso mais nenhuma assinatura" para acesso ao Zolgensma além dos médicos, do hospital e do Infarmed. E considerou que esta situação "revela que [a mãe] era alguém que estava muito desesperado e não sabia do que estava a falar".
FM/JML // JPS
Lusa/Fim
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