Pessoalmente, não estou assim tão apreensivo. Vivo no centro de Lisboa, é certo, mas num prédio que sobreviveu ao terramoto de 1755. Tau, pré-pombalino na vossa cara! Quem sobrevive a um, sobrevive a dois. Todavia, estou, naturalmente, preocupado com os meus concidadãos.

Em primeiro lugar, espero que não ocorra de manhã. Tenho um sono pesado. Se a vibração do telemóvel não me acorda, duvido que a da Terra o consiga fazer. Julgo que só me vou aperceber, sei lá, quando vir um cacilheiro na crista do tsunami, tipo Garrett McNamara dos transportes públicos. É que eu prometi a mim mesmo ser uma pessoa mais sensível no ano de 2018, mas não fui capaz de sentir o sismo de 15 de Janeiro.

A verdade é que os lisboetas não estão preparados para um cataclismo de tal dimensão. Por exemplo, já ninguém anda com rádios a pilhas. Apenas alguns idosos de fato treino – e isto se fosse dia de jogo - seriam capazes de receber as informações da proteção civil no caso de uma tragédia destas. Aliás, se o terramoto ocorresse de manhã, possivelmente ainda teríamos de lidar com a boa disposição dos animadores das estações mais ouvidas. “BOOOOOM DIAAAA, ISTO FOI ED SHEERAN COM SHAPE OF YOU, MAIS UMA SEGUNDA FEIRA ANIMADA, HOJE É DIA DE SISMOOOO, ESTAMOS EM DIRECTO PARA O FACEBOOK, DIGA-NOS COMO É QUE ESTÁ A SENTIR ESTE TERRAMOTO, ESTÁ A GOSTAR? ONDE É QUE ESTÁ ENCURRALADO? JÁ A SEGUIR, DIOGO PIÇARRA E DEPOIS, ANTÓNIO RAMINHOS”. Ninguém merece.

Sinceramente, o protocolo de segurança dos sismos não me descansa minimamente. Esconder-me debaixo da mesa? Uma coisa era quando as casas estavam equipadas de mobiliário de madeira maciça, como uma sólida escrivaninha de mogno. Agora, proteger-me da força da natureza por baixo de uma mesa MELLTORP do IKEA? Não vai correr bem, digo eu. O aglomerado não salva vidas. Aliás, tendo em conta o envolvimento dessa empresa no comércio de madeira ilegal, se eu levasse com uma viga no lombo por causa do IKEA, não era azar, era karma.

Quem rejubilaria com um terramoto em Lisboa seriam os investidores imobiliários. Que melhor incentivo à reabilitação urbana do que um bom abanão para mandar património abaixo? O dinheiro que não se poupava. Também tenho a certeza de que, estando a nossa cidade reduzida a escombros, a Joana Vasconcelos diria que tal devastação era uma instalação artística e reclamaria para si a autoria. Não podemos dizer que sairíamos todos prejudicados.

Ainda assim, são mais os contras do que os prós. Tudo bem que é importante que Lisboa esteja na moda, mas não há a necessidade de abanar isto tudo só para que os turistas japoneses se sintam em casa. Agora, se vier mesmo a acontecer, espero sinceramente que as placas tectónicas tenham a decência de sincronizar o terramoto com as férias de quem quer que seja que esteja à frente do Ministério da Administração Interna. Há que respeitar os direitos dos governantes.

Em todo o caso, esperemos que a Terra tenha piedade. Piedade ou vergonha na cara, até porque os sismos não são mais do que a natureza a masturbar-se. Por isso é que Deus não os consegue evitar.

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