Excesso de imaginação dá nisto: exercícios de vida que podem contribuir para gargalhadas ou tomadas de decisão que mudam drasticamente a nossa forma de estar ou de ser.
Nem todas as pessoas têm direito a um obituário na imprensa. Em alguns países, existe a tradição do obituário e é um trabalho de pesquisa louvável que não se resume ao que diz a Wikipédia. Como não sou uma pop star nem exerço cargos públicos, creio que o meu será bastante simples. O da maioria das pessoas pode ter simplicidade, embora o que seja simples nem sempre seja o mais verdadeiro. O que gostaria que dissessem sobre si depois de morrer?

A esta pergunta, a minha grande amiga Patrícia Fonseca deu resposta há uns tempos numa crónica escrita para a revista Visão, sublinhando que não gostaria nada de ser recordada como alguém que está sempre cansado. Claro que no caso da Patrícia Fonseca a explicação é simples: está cansada porque faz mil coisas ao mesmo tempo, portanto não creio que vá ser  o enfoque do seu obituário, mas nunca se sabe, porque o mundo também é injusto.

Bom, faça comigo este exercício para começar o ano, veja lá se as pessoas sabem quem é, se têm a ideia certa, se, afinal, está a trabalhar profissionalmente no que seria suposto, no que irá ao encontro do seu talento. Talvez seja arquitecto e queira ser actor, ou vice-versa. O tempo que temos é curto, não chega a um pavio de uma vela, os anos correm velozes, logo desperdiçá-lo não é a melhor opção.

Não sendo adepta do mindfullness ou outra tendência mais espiritual, confronto-me com a idade que vou tendo e a lista de desejos por cumprir. Vivemos na velocidade máxima, estamos ligados ao mundo como nunca antes estivemos, somos informação e engolimos informação (engolir não significa necessariamente processá-la convenientemente, já se sabe) e, sobretudo, somos alvo de pressões sociais para cumprir determinados papéis. A pressão reflecte-se depois em estudos sobre os mais jovens – que dizem estar infelizes e perdidos, –sobre hábitos comportamentais, e lá estamos nós, portugueses, no topo da lista de consumo de anti-depressivos. A pressão para sermos e produzirmos o que a sociedade aprova não é, manifestamente, uma coisa benéfica e tão pouco contribui para o tal obituário que nos faria justiça.

Encaro o novo ano com a bonomia de quem sabe que as boas intenções e o inferno são mais do que um cliché, mas mantenho a pergunta: será que, depois de morta, dirão sobre mim o que me parece justo e certeiro? Terei eu cumprido com os meus desejos e talentos? Ah, se as respostas fossem simples não existiria qualquer forma de angústia e o mundo seria mais leve.