Xi Jinping, recebido calorosamente em Moscovo, pode ser mediador credível de uma negociação para o fim da guerra na Ucrânia?

O líder do dragão chinês é autor da única proposta negocial lançada para a arena internacional. Putin já declarou a Rússia aberta “a uma solução geopolítica da crise da Ucrânia”. Acrescentou a definição dos contornos: “uma conversa séria, tendo em conta a realidade geopolítica prevalecente”.

Entra aqui o problema: Putin abre-se à negociação do fim do confronto, tendo como base a realidade no terreno, que é de ocupação militar russa de territórios da Ucrânia, designadamente a Crimeia (desde 2014) e o Donbass (neste último base). São pontos de partida intoleráveis para a Ucrânia e para os aliados ocidentais.

É bom sinal que finalmente se fale de cessar-fogo. É preciso parar a devastação e matança em curso. Mas a proposta chinesa não tem em conta a realidade criada com a invasão russa: há território de uma nação soberana que está a ser agredido e brutalmente ocupado pelo invasor russo, com prática de crimes de guerra. Putin, em fase de organização da acusação de genocida, já está formalmente acusado de ser ladrão de crianças da Ucrânia.

O urso russo, na véspera de receber o dragão chinês quis marcar o terreno: Putin foi à cidade de Mariupol que martirizou barbaramente há um ano e, agora, envolveu-se numa encenação para mostrar como a Rússia está a controlar a cidade e a região e faz “a felicidade dos habitantes” de um bairro da cidade costeira já reconstruído pelos russos para habitantes que até falam, agradecidos, de “novo paraíso”. Teatro eficaz para a propaganda na Rússia.

A iniciativa negocial chinesa aparece no momento que convém a Putin: as tropas russas alimentadas pelos mercenários Wagner recuperaram a vantagem territorial na Ucrânia que tinham conquistado no início da guerra e sabe-se que a Ucrânia está a ser equipada para poder, já nas próximas semanas, lançar contra-ofensiva robusta. 

Este é, portanto, o momento que interessa a Putin e que serve à China para aparecer aos países do hemisfério sul como promotor de paz. Xi, numa operação de equilibrismo, propaga a imagem de líder pacifista, apesar da subtil retórica anti-americana e anti-ocidental.

A Ucrânia e os aliados ocidentais, ao recusarem a negociação com base na atual realidade, ficam expostas á acusação de Putin de serem quem não quer negociar a paz.