Da fuga à extradição. O que sabemos sobre o caso João Rendeiro?
A história de Rendeiro tem vindo a ocupar a atualidade desde setembro, altura em que foi conhecido que tinha saído do país. Hoje, o ex-banqueiro foi detido no norte da cidade portuária de Durban e enfrenta agora um processo de extradição para que cumpra pena de prisão em Portugal.
Segundo o diretor nacional da Polícia Judiciária (PJ), Luís Neves, João Rendeiro reagiu com surpresa à detenção. Mas o que levou a este final?
Vejamos:
Quais as acusações em causa?
Rendeiro e outros ex-administradores do BPP estavam acusados de crimes de fraude fiscal qualificada, abuso de confiança qualificado e branqueamento de capitais por factos que ocorreram entre 2003 e 2008, na sequência de se terem atribuído prémios e apropriado de dinheiro do banco de forma indevida.
O tribunal deu como provado que os arguidos João Rendeiro, Fezas Vital, Paulo Guichard e Fernando Lima retiraram, no total, 31,280 milhões de euros para a sua esfera pessoal. Do valor total, mais de 28 milhões de euros foram retirados entre 2005 e 2008.
João Rendeiro retirou do banco para si 13,613 milhões de euros, Salvador Fezas Vital 7,770 milhões de euros, António Paulo Guichard 7,703 milhões de euros e Fernando Lima 2,193 milhões de euros.
O que motivou o julgamento?
Na origem deste julgamento está a queixa do embaixador jubilado Júlio Mascarenhas que, em 2008, investiu 250 mil euros em obrigações do BPP, poucos meses antes de ser público que a instituição liderada por João Rendeiro estava numa situação grave e ter pedido um aval do Estado de 750 milhões de euros.
Quando fugiu João Rendeiro?
O ex-banqueiro João Rendeiro fugiu para "parte incerta" em setembro e era alvo de um mandado de detenção internacional. Só hoje se soube que a PJ conhecia os pormenores do caso: o ex-banqueiro saiu do Reino Unido a 14 de setembro e entrou na África do Sul a 18 de setembro.
O que disse Rendeiro sobre a fuga?
A 28 de setembro, João Rendeiro assumiu ao SAPO24 que não estava em Portugal. "Estou no estrangeiro e não vou voltar", disse.
João Rendeiro referiu também, através de um artigo publicado no seu blogue Arma Crítica, que não estava em Portugal e não pretendia regressar, por se sentir injustiçado. “É uma opção difícil, tomada após profunda reflexão. Solicitei aos meus advogados que a comunicassem aos processos e quero por esta via tornar essa decisão pública”, escreveu na altura.
Entretanto, o que aconteceu em Portugal?
Em 4 de novembro, o Tribunal de Instrução Criminal (TIC) de Lisboa decidiu colocar a mulher de João Rendeiro em prisão domiciliária com vigilância eletrónica, por suspeitas de crimes ligados às obras de arte do ex-banqueiro e por considerar que havia perigo de fuga, perigo de perturbação do inquérito/investigação e perigo de continuação da atividade criminosa.
Maria de Jesus Rendeiro foi detida no âmbito da operação D’Arte Asas, dirigida pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal e executada pela Polícia Judiciária.
A mulher de João Rendeiro era fiel depositária dos quadros arrestados ao ex-banqueiro, considerando o tribunal que esta sabia das falsificações e do desvio das obras.
Ao SAPO24, o antigo presidente do Banco Privado Português (BPP), disse que "só um erro de advogado" levou a que a sua mulher fosse ainda fiel depositária no caso das obras de arte arrestadas: "Como é evidente, era fiel depositária só de nome. Aliás, pensava que já não era", afirmou.
Todavia, a prisão domiciliária da mulher não motivou o regresso do ex-banqueiro, que em 22 de novembro, em entrevista à CNN Portugal, disse que só regressava a Portugal se fosse “ilibado ou com indulto do Presidente [da República]”.
De recordar, também, que a sua mulher afirmou perante o TIC que o ex-banqueiro estaria na África do Sul.
A polícia de África do Sul esteve envolvida na detenção?
Sim. “Ele já estava sob nossa vigilância e assim que a necessária documentação chegou prendemos este indivíduo, esta manhã, em Umhlanga Rocks, norte de Durban”, disse o porta-voz do comissário nacional da polícia sul-africana Vishnu Naidoo, à Lusa.
De acordo com a Polícia da África do Sul (SAPS), "agentes da Interpol NCB em Pretória, atuando na sequência de um aviso vermelho da Interpol, rastrearam o fugitivo até um local em Umhlanga Rocks, onde foi preso às 07:00 (locais) desta manhã".
"Ele estava sozinho no hotel. Foi difícil localizá-lo, mas no final conseguimos apreendê-lo com o auxílio de informadores”, segundo fonte da polícia.
O ex-banqueiro não andava disfarçado, "mas tinha muitos cuidados e não circulava livremente" na África do Sul. Todavia, foram registados "saídas e entradas nos países que fazem fronteira" com o país.
Quais os próximos passos neste processo?
O ex-banqueiro será presente a tribunal nas próximas 48 horas e, segundo a PJ, pode ser extraditado, sendo que o objetivo agora é “decretar o cumprimento da prisão” de João Rendeiro.
Sobre isto, o professor de Direito Penal Paulo Saragoça da Matta refere que João Rendeiro possa estar a cumprir pena de prisão em Portugal no máximo em oito meses, concluído o processo de extradição.
Sabe-se também que Rendeiro não tem dupla nacionalidade, mas a eventualidade de ter não comprometia o seu processo de extradição para Portugal, de acordo com o diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves.
Qual era a condenação anterior à fuga?
Em maio deste ano, o tribunal condenou Rendeiro a 10 anos de prisão efetiva. Já anteriormente, em outro processo também relacionado com o BPP, Rendeiro tinha sido condenado a cinco anos e oito meses de prisão efetiva.
Já em 28 de setembro, o ex-banqueiro foi condenado a três anos e seis meses de prisão efetiva num processo por crimes de burla qualificada.
As autoridades portuguesas já tinham emitido dois mandados de detenção, europeu e internacional, para o antigo presidente do BPP, para que o ex-banqueiro cumpra a medida de coação de prisão preventiva.
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