Da guerra “em banho maria” na Ucrânia ao início das sanções à Rússia. O que sabemos sobre o conflito?

Alexandra Antunes
Alexandra Antunes

Como começou o conflito entre a Rússia e a Ucrânia?

Em 2014, a Rússia anexou a península ucraniana da Crimeia, depois da queda do Governo pró-russo em Kiev, sob o pretexto de estar a defender os interesses da população do território, maioritariamente russa. Para isso, elaborou um referendo sobre o regresso do território à Federação Russa. Desde então, Kiev está em conflito com separatistas pró-russos no leste do país, a região de Dombas, onde a maioria da população é também russófona.

A escalada da violência foi evitada com os acordos de Minsk de 2015, assinados pela Rússia e pela Ucrânia, sob mediação franco-alemã, sendo negociado um cessar-fogo entre ucranianos e separatistas russófonos.

Todavia, apesar da "paz oficial", nunca deixou de haver violência na região, com contínuas escaramuças, bombardeamentos e atentados desde então — o conflito fez, até ao momento, mais de 14 mil mortos, de acordo com as Nações Unidas.

A guerra, desde então, esteve "em banho maria" até ao final de 2021, quando as tensões voltaram a surgir com a Rússia a denunciar as intenções da Ucrânia de entrar na NATO, a Aliança Atlântica militar que permanece desde os tempos da Guerra Fria.

Sentindo-se acossada pela militarização da Ucrânia, a Rússia começou a mobilizar tropas junto à fronteira, contando com o apoio do seu mais próximo aliado, a Bielorrússia. A partir desse momento, os países ocidentais começaram a acusar Moscovo de estar a preparar uma invasão, cifrando o número de soldados russos em 150 mil, além de denunciando vários exercícios militares.

A Rússia nega qualquer plano de invasão, mas exige garantias de segurança, como a retirada da NATO do Leste Europeu, pedido rejeitado pelo Ocidente.

O que fez o conflito agudizar-se, esta semana?

O Presidente russo, Vladimir Putin, assinou, na segunda-feira à noite, um decreto que reconhece as autoproclamadas repúblicas de Lugansk e de Donetsk, no Donbass (leste da Ucrânia), ordenando mais tarde a mobilização do exército russo para “manutenção da paz” nestes territórios separatistas pró-russos.

A decisão de Putin foi condenada pela generalidade dos países ocidentais, que temiam há meses que a Rússia invadisse novamente a Ucrânia, depois de ter anexado a Crimeia.

A gravidade desta questão prende-se com o facto de a Ucrânia continuar a considerar Donetsk e Luhansk parte do seu território. Por outras palavras, o executivo ucraniano defende que, se a Rússia movimentar tropas para as áreas disputadas, já estará a “invadir” o país.

Quais são as sanções à Rússia já anunciadas durante esta terça-feira?

União Europeia

  • O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, anunciou a aprovação, por unanimidade entre os 27 Estados-membros, de um pacote de sanções à Rússia, visando “atingir e muito” as autoridades russas, após reconhecimento de territórios separatistas no leste ucraniano;
  • “Estamos em forte coordenação com os nossos parceiros, Estados Unidos, Reino Unido e Canadá, com os quais tenho estado em estreito contacto durante estas horas”, afirmou Josep Borrell, ameaçando “aumentar o nível de sanções substancialmente consoante o comportamento russo”;
  • Em concreto, as sanções hoje aprovadas abrangem 27 indivíduos e entidades e 350 membros da câmara baixa do parlamento russo (Duma);
  • No que toca às sanções financeiras, preveem-se restrições às relações económicas da UE com as duas regiões separatistas, de Donetsk e Lugansk, bem como o congelamento de bens de dois bancos privados russos, especificou Josep Borrell;
  • Também o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, indicou, em declarações à Lusa, que a União Europeia vai impor “um primeiro pacote de sanções económicas e financeiras” por “flagrante violação do direito internacional”;
  • “As orientações são claras: vão no sentido de aprovar um primeiro pacote de sanções económicas e financeiras à Rússia. Estamos a falar de sanções dirigidas a todos aqueles que na Duma, o parlamento russo, no Ministério da Defesa e em outras instâncias do poder político russo contribuíram para esta decisão ilegal e ilegítima tomada pelas autoridades russas – a saber, reconhecer as chamadas Repúblicas Populares de Donetsk e de Lugansk e enviar também supostas forças de paz russas para esses territórios”, disse;
  • Trata-se de sanções dirigidas a mais de quatro centenas de pessoas, que consistem “na interdição de quaisquer viagens no espaço europeu e no congelamento de ativos financeiros de que sejam titulares na Europa”, precisou o chefe da diplomacia português;
  • “Também demos indicação para a aprovação de um segundo pacote de sanções relativo à interdição de quaisquer importações a partir desses territórios [ucranianos] agora ocupados, as regiões separatistas de Donetsk e Lugansk”, acrescentou.

Estados Unidos

  • O Presidente norte-americano, Joe Biden, anunciou um conjunto de sanções económicas a indivíduos, entidades e bancos russos, motivadas pelas ações da Rússia no leste ucraniano, afirmando estar em causa o "início de uma invasão na Ucrânia";
  • Num discurso na Casa Branca, sem direito a perguntas, Biden anunciou sanções às elites russas e a bancos, e alertou que a Rússia "irá pagar um preço ainda mais alto se continuar com as agressões" a Kiev;
  • O chefe de Estado norte-americano anunciou ainda que autorizou o reforço de tropas norte-americanas já presentes nos países do Báltico. Todavia, foi deixada uma promessa: "não temos intenções de lutar com a Rússia";
  • O presidente dos EUA advertiu que Putin está "a estabelecer uma lógica para ir muito mais longe" na Ucrânia, prevendo um ataque em maior escala nos próximos dias. "Este é o início de uma invasão russa da Ucrânia", disse. "Não é preciso sangue para iniciar uma guerra", apontou ainda;
  • Neste sentido, Biden alertou que se "a Rússia for mais longe com esta invasão, estamos dispostos a ir mais longe como com as sanções".

Reino Unido, França, Noruega, Polónia, Finlândia

  • O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, e o Presidente francês, Emmanuel Macron, vão continuar a “trabalhar em conjunto” para aplicar sanções a interesses russos, na sequência do reconhecimento pela Rússia das autoproclamadas “repúblicas” do Donbass, divulgou hoje Downing Street;
  • “Os líderes concordaram com a necessidade de continuarem a trabalhar juntos para atingir indivíduos e entidades russas que financiam a abordagem agressiva do presidente Putin na Ucrânia”, revelou o gabinete do primeiro-ministro do Reino Unido em comunicado;
  • O Reino Unido anunciou hoje sanções contra três oligarcas conhecidos por serem próximos do Presidente russo, Vladimir Putin, e contra cinco bancos russos;
  • Já a Noruega, que não pertence à UE, anunciou hoje que se irá juntar às sanções do organismo europeu contra a Rússia. O país escandinavo também confirmou a realização em março de grandes manobras bianuais da NATO, naquele que deverá ser o maior exercício militar da Aliança Atlântica este ano;
  • O líder do Partido Conservador da Polónia, Jaroslaw Kaczynski, defendeu hoje que as sanções contra a política de Moscovo em relação à Ucrânia devem afetar diretamente o Presidente Vladimir Putin e os oligarcas russos;
  • O também vice-primeiro-ministro polaco frisou que as sanções do Ocidente devem afetar os gasodutos Nord Stream 1 e Nord Stream 2 e contemplar a exclusão da Rússia do sistema internacional de acordos financeiros, além de "sanções pessoais". "Na minha opinião, estas devem atingir Putin pessoalmente", atirou;
  • Já a Finlândia, pela voz da sua primeira-ministra, Sanna Marin, vai reconsiderar o projeto para uma nova central nuclear com participação russa no norte do país.

Qual foi a reação da ONU?

O secretário-geral da ONU, António Guterres, criticando a posição do Kremlin, disse que os princípios da “Carta das Nações Unidas não são um 'menu à la carte'” e a Rússia deve “aplicá-los todos” em relação à Ucrânia.

“Não podem ser aplicados [os princípios da Carta] de forma seletiva. Todos os Estados-membros aceitaram-nos e todos devem aplicá-los”, insistiu Guterres, reafirmando que o reconhecimento por Moscovo da “dita independência” das regiões separatistas ucranianas, Donetsk e Lugansk, é “uma violação da integridade territorial e soberania da Ucrânia”.

Num discurso forte, o secretário-geral da ONU disse ainda que “quando as tropas de um país entram no território de outro país sem o seu consentimento, não podem ser consideradas forças de paz imparciais”, e como tal “não são forças de manutenção da paz”, expressão usada pelo Presidente russo Vladimir Putin para justificar uma intervenção militar russa nas "repúblicas" separatistas.

“Deixem-me ser claro: a decisão da Federação Russa de reconhecer a chamada ‘independência’ de certas áreas das regiões de Donetsk e Lugansk é uma violação da integridade territorial e soberania da Ucrânia”, frisou.

No fim de contas, o que diz a Rússia?

Depois de reconhecer a independência das duas autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk, Vladimir Putin justificou a decisão com um pretexto histórico, considerando que a Ucrânia enquanto estado independente é um erro fruto de decisões da União Soviética, deixando de forma relativamente explícita o desígnio de reunificar os dois países.

Além disso, voltou a citar a possível entrada da Ucrânia na NATO como motor para agir preventivamente.

Hoje, a Rússia deu mais um passo, ao estabelecer oficialmente relações diplomáticas com os territórios ucranianos separatistas pró-russos na região ucraniana de Donbas. Moscovo e as autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk, que não são reconhecidas pela comunidade internacional, concordaram com o “estabelecimento de relações diplomáticas”, referiu em comunicado o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo.

Além de ter assinado os decretos relativos ao reconhecimento de Lugansk e de Donetsk, Putin anunciou que as forças armadas russas poderão deslocar-se para aqueles territórios ucranianos em missão de “manutenção da paz”.

Todavia, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, afirmou hoje que o envio de tropas russas para a região dependerá da situação no terreno.

Numa conferência de imprensa em que também pediu o reconhecimento internacional da soberania da Rússia sobre a Crimeia, península ucraniana que Moscovo anexou em 2014, Putin disse que tudo dependerá do desenvolvimento dos acontecimentos.

O presidente, que falava depois de autorizado pelo Senado a enviar tropas russas para fora do país, afirmou que os combates na zona de conflito "continuam" e tendem a agravar-se.

"Não disse que as tropas vão para lá agora, já a seguir”, disse o líder russo aos jornalistas, acrescentando que neste momento é "impossível" prever o que vai acontecer e tudo dependerá da "situação concreta no terreno".

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