Entre apelos à união e quezílias, o CDS-PP reúne-se para escolher o novo líder — e Melo toma a dianteira

António Moura dos Santos
António Moura dos Santos

Se Guimarães é conhecida como o "berço da nação", o CDS-PP quererá que signifique também, para si, como o renascer de um partido determinado por muitos como já morto antes de morrer.

Nova reunião magna dos centristas, o 29º Congresso do CDS acontece dois meses depois das eleições legislativas de 30 de janeiro, nas quais o partido teve o pior resultado de sempre (1,6%) e perdeu pela primeira vez a representação na Assembleia da República — a debacle, de resto, levou o Presidente do CDS-PP, Francisco Rodrigues dos Santos, a anunciar a sua demissão, lançando o mote para uma corrida à liderança

Havendo quatro candidatos assumidos nesta disputa — Nuno Melo (eurodeputado e líder da distrital de Braga), Miguel Mattos Chaves, Nuno Correia da Silva (ambos vogais da Comissão Política Nacional) e o militante e ex-dirigente concelhio Bruno Filipe Costa —, a expectativa que coroou este Congresso foi de que não se repetisse o tom de acrimónia que caracterizou o anterior, onde o demarcar das fações não impediu Rodrigues dos Santos de ser eleito Presidente.

Considerado por muitos como o principal favorito a vencer, Nuno Melo, chegado ao espaço do Multiusos de Guimarães após conduzir uma Renault 4L antiga, foi recebido com aplausos, que se repetiram quando entrou na sala, ouvindo também “Nuno, Nuno” por grande parte dos delegados, de pé, em contraste com a receção mais morna a que teve direito o líder cessante, Francisco Rodrigues dos Santos, poucos minutos antes.

Ao longo do dia, Melo foi recebendo apoios de peso — até de personalidades com quem colidiu no passado. Manuel Monteiro — há 20 anos alheado das lides do CDS-PP — compareceu para declarar-lhe apoio; amanhã segue-se Paulo Portas, outro ex-líder que se afastou mas que já fez saber que vai a Guimarães para estar ao lado de Melo. De antemão, já se sabia que Assunção Cristas — também antiga Presidente do partido — também conferia o seu apoio ao eurodeputado, tal como António Lobo Xavier.

No interior e no exterior do Pavilhão, João Rebelo, ex-deputado e antigo secretário-geral, a ex-deputada Cecília Meireles, o antigo chefe de gabinete do ex-ministro Paulo Portas, antigo líder, Bourbon Ribeiro, o ex-líder parlamentar Nuno Magalhães, entre outras figuras do partido, da atual e da anterior direção, também marcaram presença.

Sem fugir às suas responsabilidades, foi justamente o Rodrigues dos Santos a colocar a bola a rolar neste Congresso. No seu discurso de despedida, o líder cessante afirmou querer "hastear a bandeira da união" e assegurou que não faria "ajustes de contas", não deixando, no entanto, de apontar responsabilidades à oposição interna, que apelidou de “fogo amigo”.

“Derrotámo-nos numa guerra interna sem precedentes, qual haraquíri partidário, onde o fogo amigo nos feriu de morte e nos alheou por completo do país", lamentou. Ou seja, sem querer ajustar contas, ajustou-as.

Foi assim que se desenrolou este Congresso ao longo do dia, em que pontuaram os discursos dos apoiantes de Melo, mas ficando também patentes as divisões e algum ressentimento pelo passado recente do partido.

Manuel Monteiro, que não discursava num Congresso do CDS desde janeiro de 2002, quando apresentou uma moção à liderança contra Paulo Portas, e perdeu, procurou dar ânimo aos congressistas num discurso programático de cerca de 30 minutos, recebendo aplausos — e declarando que é o eurodeputado que “está em melhores condições” para assumir o cargo da liderança.

Também em apoio a Nuno Melo, e já depois de algumas intervenções, o antigo líder parlamentar Pedro Mota Soares destacou a “coragem” para avançar no atual momento do CDS-PP, e pediu que o partido não perca tempo com “amarguras ou azedumes”, que ficaram contudo patentes ao longo de sucessivas intervenções.

Nem tudo, porém, foram salamaleques para Nuno Melo. Filipe Lobo d'Ávila, que aceitou uma vice-presidência no congresso de 2020 (ganho por Rodrigues dos Santos) e saiu um ano depois, deixou-lhe uma “alfinetada”, dizendo que o eurodeputado teria sido “um belo candidato” há sete anos.

"Que belo candidato serias há 7 anos. Provavelmente teríamos tido a oportunidade de evitar muitos dos erros que se cometeram ao longo destes anos", declarou, defendendo que o CDS tem de “aprender verdadeiramente a lição com o que fez mal ao longo dos últimos anos”.

"Se queremos iniciar um novo ciclo, não vale a pena atirar o pó para debaixo do tapete, é preciso sacudi-lo, falar dos problemas, dos erros” que, disse, “não foram exclusivos de Rodrigues dos Santos”.

À tarde, a líder da distrital de Leiria, Rosa Guerra, lamentou os “ataques tumultuosos e constantes” que a direção sofreu ao longo do mandato por parte da oposição interna e considerou que esse foi um dos fatores que contribuiu para que o “partido tivesse o resultado que teve”.

Antes, na apresentação da moção "Pelas mesmas razões de sempre", subscrita por líderes de 11 distritais, o presidente da estrutura de Aveiro criticou também o “clima de instabilidade deliberadamente criado nos últimos dois anos” e defendeu que, “para ter futuro o CDS tem de aprender a ser maior do que os seus conflitos”.

Ao fim da tarde, surgiu a única vaia no primeiro dia do congresso. A dirigente do CDS-PP Margarida Bentes Penedo acusou a oposição interna de ter agido “contra o partido” e antigos dirigentes ligados à direção de Portas de atuarem neste congresso como “uns fingidores” e de estarem com “um ar solene” a fazer de conta que “querem unir o partido”.

Bentes Penedo, membro da Comissão Política Nacional, admitiu que a direção que integrou pode ter tido falhas, mas disse não estar disposta a “dividir culpas e responsabilidades” e acusou a “fação derrotada [no anterior Congresso]” de nunca ter reconhecido a liderança de Francisco Rodrigues do Santos e de fazer “uma campanha de destruição ativa do CDS”.

Nas palavras do presidente de José Manuel Pessanha, da Federação dos Trabalhadores Democratas-Cristãos, que apresentou uma moção global: “Ou nos entendemos, ou isto acaba”.

No meio disto tudo, o que disse o próprio Nuno Melo? O candidato assegurou que, se for eleito, acabará com “processos autofágicos e pouco inteligentes de purificação doutrinária”, apelando à união e ao regresso ao partido de militantes como António Pires de Lima ou Adolfo Mesquita Nunes.

“Eu quero construir pontes. Acho que temos que dar um sinal ao país e não venho aqui escavar ainda mais trincheiras, conto realmente com todas as pessoas que tenham disponibilidade, talento e que estejam de boa-fé”, afirmou o único eurodeputado eleito pelo CDS-PP.

Nuno Melo justificou a sua candidatura “no momento mais difícil” dos 47 anos do partido, quando perdeu a representação parlamentar, para devolver ao CDS o que o partido lhe deu. “Estou aqui porque é tempo de salvar o CDS”, sublinhou.

Amanhã, saberemos se o partido está com ele.

*com Lusa

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