Hugo van der Ding foi o quarto convidado da segunda temporada do RESET, o podcast conduzido por Mariana Cabral (Bumba na Fofinha), cujo o objetivo é falar sobre o falhanço. Fazer a sua própria apresentação torna-se um desafio, uma vez que o entrevistado não sabe bem em que categoria profissional se deve inserir. Não se considera humorista, mas é difícil negar o traço cómico de um dos projetos que o tornou mais influente: os cartoons d’A Criada Malcriada.

A conversa contou com várias revelações e numa delas a anfitriã não conseguiu esconder o espanto ao saber que Hugo van der Ding tinha feito parte dos Onda Choc. Com uma presença muito figurativa, porque, nas palavras do próprio, "eles precisavam de pessoas mais brancas e loiras porque já havia as outras todas". Saiu pelo próprio pé do conjunto infantil. Não sabia cantar, embora ainda hoje sinta o desejo de possuir esse talento, já que "a voz humana não tem ali nenhum instrumento se não o próprio corpo". Conformado, fica-se pela escrita, aquilo para que acha que nasceu.

Na Antena 3, apresenta o programa "Vamos Todos Morrer", sob a teoria de que "há duas coisas certas na vida: que a Ivete Sangalo vai ao Rock in Rio" e que esse é o destino de todos nós. Nesse espaço, na rádio pública, que fala sobre pessoas que já atravessaram essa fronteira, diz-se "fascinado com as pessoas que são imortais mesmo não sabendo", tal como Platão, que, mesmo tendo vivido há mais de 2 mil anos, continua a ser lido e é a "raiz do pensamento ocidental".

Na sua própria morte pensou uma vez, depois de ter tido alucinações ao tomar "cogumelos" em Amesterdão. Na altura, vivia na capital da Holanda e imaginou que tinha morrido pelas próprias mãos. Quando tomou consciência de que tudo não passava de um sonho, percebeu que "estava subjacente uma enorme vontade de fazer isso", mas que, ao mesmo tempo, não queria de facto fazê-lo.

À época deste episódio, Hugo van der Ding não tomava qualquer tipo de medicação para a doença que só lhe foi diagnosticada aos 30 anos de idade: a bipolaridade. Antes de procurar ajuda médica, teve cerca de cinco fases depressivas, típicas da oscilação emocional, que lhe causaram um sofrimento que não entendia. "Pode ser muito doloroso para as pessoas antes de estarem diagnosticadas porque escavam, escavam e não conseguem perceber rigorosamente nada", explicou.

Hugo van der Ding considera que a sociedade ainda não "respeita a diferença" da saúde mental. Confessa que já teve a sensação de acordar de manhã e "a vida ser absurda", sendo que nada faz sentido para além do ato de sair da cama na hora de começar o dia. Mas, atualmente, a sua bipolaridade é controlada com estabilizadores de humor e terapia.

O convidado de Mariana Cabral adora comer gomas, mas não era capaz de ter a profissão de comer gomas, porque "tudo o que se torna uma obrigação” passa a ser aborrecido. Por isso, considera que no dia em que ele não gostar de fazer as crónicas diárias na rádio provavelmente não consegue mesmo fazê-las. Amante assumido daquilo que faz, admite que às vezes tem bloqueios criativos em que sente que não tem "nada para dizer". A validação dos outros é, no entanto, uma espécie de amparo, porque "serve de estatística" que o ajudou a encontrar o tom no qual queria falar.

Nota:

Hugo van der Ding foi o terceiro de oito convidados da segunda temporada do RESET. Para ouvir os restantes episódios, basta ir ao Spotify ou ao YouTube.

O podcast de Mariana Cabral tem um cunho social e solidário. Conta com o apoio da Delta Q, que doa, depois de cada episódio, 500 euros a uma causa escolhida pelo convidado cada um dos convidados. Hugo van der Ding escolheu o Conselho Português para os Refugiados, porque "todos nós, ao longo da nossa vida, podemos, fisicamente ou figurativamente, ser refugiados". E, acrescenta, "todos nós gostaríamos de ter alguém que nos tratasse como se estivéssemos em casa".