Desde a sua admissão tardia como Estado-membro, em finais de 1955, as relações entre Portugal e a Organização das Nações Unidas (ONU) sempre foram tensas devido à questão colonial, valendo-lhe várias condenações nos anos seguintes, uma situação que só viria a mudar depois do 25 de Abril de 1974.

Nesse período intermédio, em que algumas alianças conseguiram atenuar a situação portuguesa, a campanha contra a política colonial portuguesa na ONU ia sendo liderada pelos países africanos, asiáticos e socialistas.

Estes países, explicou à Lusa Aurora Almada e Santos, investigadora do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa, formaram uma aliança informal contra Portugal e procuravam arregimentar votos entre outros grupos, nomeadamente os latino-americanos.

Esse bloco anticolonial detinha os votos necessários para a aprovação de resoluções contra Portugal na Assembleia Geral, mas o seu poder dentro da ONU estava sujeito a algumas limitações.

Uma dessas limitações era o facto de o Conselho de Segurança, o órgão da ONU com poderes para impor medidas vinculativas contra Portugal, como embargos e sanções, ter estado condicionado pela Guerra Fria.

"A rivalidade bipolar que opunha os Estados Unidos à União Soviética transformou Portugal, devido à importância que a Base das Laje tinha para os norte-americanos, num importante aliado", destacou a investigadora.

"Ou seja, Portugal mantinha não só acordos bilaterais com os EUA que permitiam aos americanos manter a sua base militar nos Açores, como tinha também sido convidado a beneficiar do Plano Marshall e a ser membro fundador na NATO", apontou Luís Nuno Rodrigues, professor catedrático do Departamento de História do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa.

Esta circunstância, indicou, revelou-se benéfica para o regime de Oliveira Salazar no contexto da ONU, onde as vozes dos aliados ocidentais raramente se fizeram ouvir ao longo do período das guerras coloniais.

Além dos EUA, Portugal, um dos membros fundadores da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), contava com o apoio de outros países ocidentais que detinham o poder de veto no Conselho de Segurança, como o Reino Unido e França.

O Reino Unido, apesar de ainda ser uma potência colonial na ocasião, iniciara há muito a sua descolonização. Por razões históricas, dispunha de especiais condições para pressionar Portugal.

"Na ONU manteve sempre uma posição negativa, votando contra - ou, no máximo, abstendo-se — as resoluções condenatórias de Portugal, sobrevalorizando os aspetos positivos da colonização portuguesa e minimizando a ameaça à paz e à segurança internacionais", observou A. E. Duarte Silva, no artigo "O litígio entre Portugal e a ONU (1960-1974)".

As razões para uma tal política eram variadas, notou Duarte Silva, referindo interesses económicos, o temor de o percurso das colónias portuguesas afetar as suas próprias colónias ou os limites da sua posição perante os EUA e a Europa.

Nesse período, "Lisboa também contava com o apoio da China nacionalista - representava o governo de Taiwan, sendo que a República Popular da China foi excluída da ONU até 1971-, que alinhava a sua política com a dos Estados Unidos", lembrou Aurora Almada e Santos.

Além das grandes potências, Portugal tinha apoiantes entre outros países europeus, antigas potências coloniais, como Bélgica, Holanda e Itália, e aqueles com os quais tinha afinidades, com Espanha e Brasil.

Estes dois últimos países, em particular, “colaboraram com a diplomacia portuguesa e anualmente procuravam que outros Estados-membros, nomeadamente os latino-americanos, votassem contra as resoluções que condenavam Portugal", disse a investigadora.

Apesar de recusar que a sua política colonial fosse conotada com o sistema de ‘apartheid’, o Portugal contava ainda com o apoio da África do Sul.

Além disso, com o uso da sua diplomacia ou de pressões económicas, nomeadamente sobre os países africanos que dependiam dos portos e caminhos-de-ferro de Angola e Moçambique para escoarem as suas matérias-primas, Portugal conseguiu contar com os votos favoráveis ou abstenções de Estados como Paquistão, Filipinas, Japão, Malawi ou Zâmbia em projetos votadas na ONU, lembrou também Aurora Almada e Santos.

Contudo, a partir do final da década de 1960 começaram a surgir maiores dificuldades para Portugal no relacionamento com os seus aliados europeus.

Segundo Luís Nuno Rodrigues, tornava-se cada vez mais difícil para os Governos do Reino Unido, França e Alemanha convencer os eleitores, sobretudo as gerações mais jovens com uma cultura de ativismo bastante mais acentuada e forjada nas lutas contra a intervenção americana no Vietname, "da legitimidade de uma política de apoio a um país colonialista e governado por uma ditadura que mantinha três guerras coloniais no continente africano".