Empossada na quarta-feira, dia quatro de janeiro, às 18h00, pelo Presidente da República como secretária de Estado da Agricultura, Carla Pereira Alvez apresentou a demissão esta quinta-feira pelas 20h00.
Foi uma das oito alterações levadas a cabo no elenco governativo na sequência do caso Alexandra Reis, que levou à demissão não só da secretária de Estado como de Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas, e Hugo Mendes, secretário de Estado do ex-ministro.
As 26 horas em que esteve no Governo foram tudo menos tranquilas, terão sido, muito provavelmente, as mais catastróficas das duas mãos cheias de demissões do atual Governo devido a "casos e casinhos" - para utilizar a expressão utilizada hoje pelo próprio primeiro-ministro durante o debate em que se discutiu a moção de censura ao atual executivo apresentada pela Iniciativa Liberal.
O pesadelo de Carla Alves começou esta manhã, com uma notícia do Correio da Manhã que dava conta que a nova secretária de Estado da Agricultura tem várias contas bancárias arrestadas, no âmbito de uma investigação que envolve o seu marido e antigo presidente da Câmara de Vinhais, Américo Pereira.
De acordo com o Correio da Manhã, entre 2013 e 2020, o casal declarou rendimentos inferiores aos montantes que tinha no banco, uma discrepância que foi constatada após ter sido levantado o segredo bancário.
O Ministério Público mandou arrestar bens do antigo autarca, num processo que envolve mais de 4,7 milhões de euros.
Em causa estão vários negócios celebrados entre 2006 e 2015, que envolvem também uma sociedade, um empresário e o reitor do antigo seminário deste concelho do distrito de Bragança.
Américo Pereira assegurou hoje aos jornalistas que a governante não tem qualquer processo judicial e que já contestou o arresto de bens.
O antigo autarca, que é advogado de profissão, disse que apenas uma conta conjunta, em nome dele e da mulher, foi arrestada “com um valor miserável”, e em relação aos restantes bens a agora ex-secretária de Estado já “foi ao processo pedir embargos do arresto”.
Segundo referiu, a esposa “não responde financeiramente legalmente” porque não é arguida no processo e a chamada meação do casal não pode ser arrestada, ou seja, a parte dos bens que pertence a ela.
“Eu nunca pensei que a maldade de alguém pudesse chegar ao ponto de envolver a esposa de um ex-autarca porque ele é arguido num processo-crime. Não percebo porque é que ela tem que ser envolvida nisto”, lamentou.
O tema marcou o dia e foi, inevitavelmente, discutido no Parlamento, no debate sobre a moção de censura ao Governo apresentada pela Iniciativa Liberal, onde o primeiro-ministro defendeu que se algum membro do Governo tiver rendimentos não declarados deve sair do executivo, salientando que a secretária de Estado da Agricultura lhe garantiu que na sua conta não tem rendimentos não declarados.
“Se em abstrato, algum membro do Governo tiver rendimentos não declarados, claro que não se pode manter como membro do governo. É evidente, creio que isso é uma coisa clara e transparente. Estamos de acordo sobre esse ponto, vá lá, já é bom estarmos de acordo em mínimos”, afirmou António Costa.
Ainda antes da moção ser votada - e chumbada, sem surpresas - o Presidente da República falava aos jornalistas para dizer que a secretária de Estado da Agricultura tinha “uma limitação política", pelo caso judicial que envolve o marido, notando que esta devia ajuizar se reunia condições para se manter em funções.
Marcelo Rebelo de Sousa referiu que a então recém-empossada secretária de Estado "não é arguida, não é acusada", portanto, "não há, neste momento, com os factos conhecidos, nenhum caso de inconstitucionalidade ou ilegalidade".
"Outra coisa é a questão política. E no domínio da questão política naturalmente que a questão é a seguinte: alguém, em abstrato, que tem uma ligação familiar próxima com alguém que é acusado num processo de uma determinada natureza, qualquer que seja a natureza criminal, à partida tem uma limitação política, é um ónus político", considerou.
Carla Alves foi diretora regional de Agricultura e Pescas do Norte desde 2018, é o rosto do processo de desenvolvimento e certificação do fumeiro regional de Vinhais e da Raça Bísara e foi secretária de Estado durante pouco mais de um dia, naquela que é a 12ª demissão do atual Governo.
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