"Só não haverá acordo sobre a Lei de Bases da saúde se não houver vontade política para [que] esse acordo não exista, e se persistirmos em querer confundir a árvore com a floresta e não nos concentrarmos no que é essencial", respondeu António Costa, depois de interpelado pelo comunista durante o debate quinzenal, na Assembleia da República, em Lisboa.
Na ótica do chefe de Governo, isso passa por "acabar com a Lei de Bases de 1990, assegurar a cada português isenção da taxa moderadora de todos os tratamentos e consultas quando prescritos por profissionais, condição essencial para melhorar a sua acessibilidade" e, ainda, por afirmar "de uma forma muito clara a natureza pública, em qualquer circunstância, da gestão de todos os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde" (SNS).
"É isto que deve ser consagrado", salientou o primeiro-ministro.
Antes, Jerónimo de Sousa tinha questionado António Costa se "está, ou não, disponível, apesar do pouco tempo, para concretizar um processo de diálogo que leve a uma solução para uma revisão da lei em vigor, que defenda e valorize o SNS".
"Da nossa parte, vamos continuar à procura dessa convergência, mas sempre com o objetivo de defender o SNS da gula dos privados da saúde, para que seja efetivamente garantido o direito do povo português", considerou o secretário-geral do PCP.
Num comentário à metáfora utilizada por Costa, Jerónimo apontou que as palavras do primeiro-ministro lhe fizeram lembrar "o perigo que constitui para as florestas haver apenas uma acácia que, de repente, invade todo o terreno".
"Essa alteração feita pode permitir essa invasão dessa espécie", referiu.
Antes, quando levantou a questão, o líder do PCP afirmou que o partido considerou "todas as possibilidades de consenso relativamente a aspetos estruturantes da futura lei, processo que estava a dar resultados positivos".
Por isso, "foi com surpresa que, após um anúncio público precipitado e uma divulgação inadvertida de documentos, logo aproveitada por setores associados aos grupos privados de saúde", os comunistas viram "o PS a negociar uma posição inaceitável", a "natureza da gestão".
Assim, Jerónimo de Sousa alertou para o facto de, na sua opinião, dar "possibilidade aos privados [de] poderem gerir hospitais públicos e centros de saúde, apenas servirá para escancarar as portas a uma ofensiva até ao fim contra o SNS".
Em resposta ao PCP, o primeiro-ministro apontou que o Governo quer "convergir na Lei de Bases da Saúde", por considerar "essencial substituir a atual lei de bases, que incumbe o Estado de promover o setor privado para concorrer com o setor público, e substituir por uma lei que afirme claramente que o Estado desenvolve o acesso à saúde através da criação de um Serviço Nacional de Saúde público, universal e tendencialmente gratuito, organizado por serviços públicos e que acaba com essa ideia de concorrência entre público e privado, remetendo o setor privado e o setor social para a posição que devem ter, uma natureza complementar e supletiva".
Notando que "a questão da gestão é importante", o chefe de Governo defendeu que as Parcerias Público Privadas (PPP) representam "4% do total da despesa", e clarificou que a gestão das unidades de saúde "é sempre pública e tem de ser feita através de um contrato de direito público, e só poderá existir em casos excecionais, com caráter complementar e supletivo, como seja, quando o Estado não tiver condições de internalizar de um só momento, todas essas PPP".
Manter privados no SNS é apenas “lavar a cara” à lei de bases da saúde da direita
"Se a esquerda aprovar uma lei de bases que mantém os privados dentro do Serviço Nacional de Saúde, não estará a fazer mais do que a lavar a cara à lei da direita, para que fique tudo na mesma e isso nem António Arnaut nem João Semedo nos perdoariam", atirou a coordenadora do BE.
Avisando Catarina Martins de que "não vale a pena querer transformar a árvore na floresta", porque "as PPP no seu total representam 4,6% da despesa do SNS", ou seja, 450 milhões de euros, o primeiro-ministro deixou claro que em relação a estas parcerias aquilo que o PS defende não é um recuo, mas sim "um avanço" em relação à proposta do Governo.
"Senhor primeiro-ministro, foi a direita, contra o PS, que abriu esta porta. E o que hoje o PS está a pedir à esquerda é que deixe a porta aberta para que a gestão privada se mantenha e possa até expandir-se no futuro, ao sabor das opções do momento. No fim de contas, o PS propõe à esquerda que, 30 anos depois e pela primeira vez, dê razão a Cavaco Silva e admita a lógica da privatização do SNS. Com o voto do Bloco, isso não acontecerá", avisou.
(Notícia atualizada às 22h02)
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