Pelo canal de YouTube do duo de Coimbra MusicSign já se contabilizam mais de dez vídeos, onde os intérpretes de língua gestual portuguesa Rui Oliveira e Rafaela Silva levam as letras de canções de Ed Sheeran, Ana Moura ou Salvador Sobral à comunidade surda.
Tudo começou como uma brincadeira: em 2015, os dois intérpretes de língua gestual portuguesa na Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC) decidiram gravar um vídeo em que interpretam “Atrevimento”, de Kataleya e Anselmo Ralph.
A receção por parte da comunidade surda não poderia ter sido melhor, conta à agência Lusa Rafaela Silva, também docente na ESEC.
“O vídeo foi muito partilhado nas redes sociais e as pessoas pediram mais, queriam mais músicas, porque os surdos também sentem a música. Aquilo a que não têm acesso é à letra”, sublinha.
Em vez da postura formal do intérprete, com um fundo branco por trás, nestes vídeos Rui e Rafaela aprimoram o trabalho, com cenário, diferentes planos, figurino, maquilhagem e até coreografias, quase numa espécie de segundo take do videoclipe da canção, tornando-o “mais interessante e apelativo” para a comunidade.
“Aqui, temos mais liberdade. Podemos ser mais criativos na produção”, sublinha.
Os dois intérpretes transformam-se quase em dançarinos nos vídeos, onde, com a expressão da cara, mas também do corpo, procuram complementar a língua gestual.
“Temos a liberdade de nos mover no espaço e brincar um com o outro. Até harmonizamos [os gestos], em que ele usa uma mão e eu a outra, e conjugamos o gesto. É muito mais criativo e tudo isso reflete a emoção e o teor daquilo que está na música”, realça Rafaela.
Desta forma, uma balada pode apresentar gestos mais calmos e vagarosos, enquanto um ‘hit’ qualquer de verão pode levar a movimentos mais rápidos ou aguerridos.
“Nós tentamos passar o ritmo da música através da expressão corporal e também no ritmo como fazemos os gestos. Quando é mais calma, o gesto é um pouco mais amplificado, é aumentado no espaço ou prolongamos o movimento. Se for, por exemplo, rap, o gesto pode ser mais curto e muito mais rápido”, explica Rui Oliveira, considerando que é no hip-hop que se encontram mais dificuldades em conseguir a interpretação.
Para além de o projeto pensar nos surdos, esta é também uma forma de “sensibilizar a comunidade ouvinte para a existência das pessoas surdas, da língua gestual e de todo este mundo”, realça Rafaela.
Para a intérprete da ESEC, quando se fala em cultura – não apenas em música, mas também teatro – esta ainda está muito pouco acessível à comunidade surda.
Apesar de algumas situações em Lisboa e no Porto com peças de teatro com interpretação, as oportunidades são “esporádicas” para esta comunidade, referiu.
Nesse sentido, o duo, para além de querer continuar a fazer mais vídeos em dueto, quer abraçar o desafio de subir ao palco, num concerto, e fazer “uma apresentação ao vivo para a comunidade surda”.
“Seria muito bom sensibilizar os profissionais da música que este também é um público, estas pessoas também podem ir e apreciar os seus espetáculos e sentir a sua música”, disse Rafaela Silva.
Hoje, assinala-se o Dia Nacional de Língua Gestual Portuguesa, sendo que na ESEC decorre um evento, a partir das 14:00, para celebrar a data com a participação de alunos da licenciatura em Língua Gestual Portuguesa e uma atuação dos MusicSign.
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