Sublinhando que a lei internacional e da União Europeia proíbe a devolução dos refugiados aos países de origem se houver risco de perseguição, tortura ou outro tipo de punição, a Agência para os Direitos Fundamentais (FRA) da União Europeia denuncia, num relatório hoje divulgado, que a situação continua a acontecer com regularidade.

“A tendência de devolver pessoas resgatadas à Líbia continuou em 2019, embora o conflito armado se tenha intensificado”, refere o relatório anual da FRA, lamentando que os esforços políticos para resolver o problema dos desembarques (ou da sua impossibilidade em alguns países) de migrantes e refugiados resgatados no mar Mediterrâneo não tenham conseguido adotar uma solução definitiva.

“Os ministros do interior da França, Alemanha, Itália e Malta adotaram uma declaração em La Valeta, Malta, em 23 de setembro, para adoção de procedimentos de realocação mais eficientes e estruturados, mas os barcos de resgate continuam no mar por muito tempo enquanto aguardam porto seguro”, aponta a agência.

“Estima-se que 1.866 pessoas tenham morrido ou desaparecido em 2019 ao atravessar o mar Mediterrâneo para chegar à Europa, cerca de 60% das quais tentavam deixar a Líbia”, refere o documento hoje divulgado.

Segundo adianta o relatório, os incidentes mais mortais ocorreram em janeiro, no sul de Lampedusa, Itália, com 117 vítimas, e em 25 de julho, na costa da Líbia, com 150 vítimas.

“Os atrasos nos desembarques põem em risco a segurança e a integridade física dos migrantes e refugiados resgatados no mar”, diz a agência no relatório, admitindo que “o legislador da UE equipou a Frontex com vários instrumentos internos para proteger os direitos fundamentais”, mas lembrando que “poderes reforçados trazem mais responsabilidade em relação aos direitos fundamentais”.

“Embora o número de mortes no mar em 2019 tenha sido menor do que em anos anteriores, ainda atinge, em média, mais de quatro vítimas por dia ou uma vítima a cada quatro horas e 42 minutos”, sublinha a FRA.

Outro dos problemas graves da União Europeia em relação a migrantes e refugiados prende-se com a tutela de crianças desacompanhadas, já que “continuam a existir lacunas sérias” na legislação.

“Crianças desacompanhadas são particularmente vulneráveis a violações de direitos. Um sistema de tutela eficaz para crianças desacompanhadas é uma condição prévia para garantir os melhores interesses e o bem-estar geral da criança”, defende a agência da UE.

Embora nos últimos anos tenha havido “um progresso significativo na reforma de alguns dos sistemas nacionais de tutela”, na prática, “muitas crianças desacompanhadas que chegaram às fronteiras terrestres e marítimas externas em 2019 não tiveram o apoio de um tutor que pudesse efetivamente promover os seus melhores interesses”, denuncia, apontando casos específicos.

“A Grécia adotou uma nova lei de tutela, mas ainda não a tinha implementado no final do ano”, enquanto na Croácia os centros locais de assistência social exercem o papel de guardiões das crianças, mas “não têm formação para o fazer adequadamente”.

Na Hungria, continua o relatório, a lei determina que só crianças menores de 14 anos recebem um tutor, excluindo as crianças com idades entre 14 e 18 anos da legislação de proteção à criança.

Em Malta, a reforma do sistema de tutela está pendente e a realocação de crianças desacompanhadas está suspensa, sendo que, uma vez adotada efetivamente, a lei irá garantir uma separação entre guardiões e funcionários responsáveis pela receção de refugiados que pretendem solicitar asilo.

O relatório da FRA aborda ainda outro problema grave na UE relativamente a refugiados: a violência de género contra as mulheres.

“Muitas mulheres migrantes em busca de asilo e refugiadas sofrem violência de género, segundo uma pesquisa do Instituto Europeu de Prevenção e Controlo do Crime, alerta a FRA, defendendo que os Estados-membros devem adotar medidas apropriadas para prevenir a violência de género, incluindo agressões sexuais e assédio nas instalações e centros de acolhimento.