A jovem de 13 anos vive no arquipélago da Madeira, onde lhe foi diagnosticada uma cardiomiopatia restritiva com hipertensão arterial pulmonar grave e insuficiência cardíaca, tendo sido reencaminhada para o Hospital Santa Marta, o Centro de Referência de Cardiopatias Congénitas da Unidade Local de Saúde (ULS) São José.
A cardiologista pediátrica e diretora clínica adjunta do Hospital de Santa Marta, Fátima Pinto, explicou à agência Lusa que “o coração precisa de contrair e relaxar, como uma bomba”, uma função que a cardiomiopatia restritiva, uma doença das células do músculo cardíaco, impede que seja feita corretamente.
“É como se o músculo [cardíaco] estivesse sempre em tensão e isso vai causando ao longo do tempo insuficiência cardíaca (…) e tem repercussões a nível do pulmão”, causando hipertensão pulmonar, “uma doença muito grave que, associada à insuficiência cardíaca”, pode ter vários sintomas, desde desmaios a morte.
No caso da jovem, a doença estava “num estado já bastante avançado”, impedindo-a de fazer a sua vida normal, sem capacidade de realizar “qualquer tipo de esforço” devido ao cansaço, contou Fátima Pinto.
O cirurgião pediátrico José Diogo Martins, que liderou a equipa multidisciplinar que acompanhou a menina, disse à Lusa que só foi possível fazer este procedimento inovador, porque a União Europeia aprovou um novo dispositivo médico que se coloca por via percutânea, através das veias, sem implicar uma cirurgia.
“Este dispositivo tem a função de criar e manter aberta uma comunicação entre as duas aurículas de modo a que se faça a descompressão da aurícula esquerda que estava na base da hipertensão arterial desta menina”, explicou.
O cirurgião observou que este procedimento “não é curativo, mas sim paliativo” e visa garantir uma estabilidade clínica que permita avançar para outro tipo de tratamentos, sendo neste caso o transplante cardíaco.
Disse, contudo, que o procedimento tem "um risco que não é negligenciável" e, por isso, a situação foi discutida com os pais e a própria menina, tendo-se concluído que havia “uma situação de risco-benefício favorável para avançar com o procedimento”, que foi realizado em maio e durou cerca de quatro horas.
A intervenção foi realizada com sucesso, tendo havido uma redução significativa da pressão da aurícula esquerda e redução da hipertensão arterial pulmonar, com recuperação rápida que permitiu a alta da jovem para o domicílio.
Apesar de este procedimento não curar, vai melhorar a qualidade de vida da menina e dar-lhe uma estabilidade que permita dar os próximos passos necessários, que envolvem um conjunto de técnicas muito diferenciadas que vão desde os cuidados intensivos cardíacos até a cirurgia cardíaca.
“E abriu-se a porta para se poder fazer o transplante que vai ser necessário para podermos continuar a cuidar desta menina”, realçou.
Citando o distribuidor do dispositivo, José Diogo Martins disse que foi a primeira vez que esta intervenção foi realizada em Portugal e uma das primeiras vezes na Europa.
“Mesmo nos Estados Unidos os casos contam-se como algumas dezenas (…) porque são casos muito, muito raros”, comentou.
Questionado sobre se há doentes em lista de espera para fazer este procedimento, disse que não, mas avançou que têm a aprovação do conselho de administração do hospital para fazer se aparecerem outras crianças com este problema.
“Estamos neste momento, uma vez que há esta técnica nova, a rever o nosso conjunto de doentes com hipertensão pulmonar para perceber em quais deles poderá ser benéfico a realização deste procedimento”, avançou o cirurgião pediátrico.
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