O intenso calor não desmotivou os participantes, entre balões e bandeiras com as cores do arco-íris - símbolo LGBT – para se concentrarem no Jardim do Príncipe Real a partir das 17:00, empunhando cartazes que apelavam à "saída do armário", expressão usada para o assumir da orientação sexual.
"O combate à discriminação sexual tem de ser feito em todo o lado: a partir das escolas - o Estado tem uma obrigação de educar a sua população em matérias de respeito de direitos e da dignidade humana - e a família tem de ser um ponto de acolhimento, de carinho e amor, em vez de rejeitar as suas crianças porque elas saem de uma norma", defendeu Alice Cunha, da organização da marcha, em declarações à agência Lusa.
A edição da marcha deste ano tem como lema “Autodeterminação do género, autodeterminação do corpo para todas as pessoas trans”, e é organizada por cerca de duas dezenas de associações e coletivos com iniciativas na área dos direitos humanos, e contra a discriminação sexual e racial.
Sobre as expetativas de adesão, Alice Cunha disse que, no ano passado, a marcha teve a "maior participação de sempre, com cerca de 7.000 pessoas, e este ano são esperadas 8.000".
"Mais uma vez, estamos a ocupar as ruas, a reclamar os nossos direitos, para que toda a gente nos oiça" comentou, sobre a marcha, que tem, entre outros objetivos: "Lutar por uma lei de identidade de género, que despatologize as identidades transgénero, que tire o controlo médico sobre os nossos corpos, que nos permita a autonomia sobre as nossas vidas, e das nossas vivências, pelo fim do ‘bullying’ nas escolas".
Questionada pela Lusa sobre a evolução, nos últimos anos, da situação de descriminação por orientação sexual, a organizadora da marcha comentou que a questão "não se pode medir por estatística, já está enraizada na sociedade".
"Vivemos numa cultura patriarcal, sexista, homofóbica, transfóbica. Estamos, lentamente, com demonstrações como esta, a ir às raízes do problema, a desconstruir estas noções, e, a pouco e pouco, com um passo de cada vez, a mudar mentalidades, e, mais tarde, comportamentos", considerou.
Ao princípio da tarde de hoje foi inaugurado um memorial às vítimas de homofobia e transfobia, no jardim do Príncipe Real, com uma grande peça escultórica, de autoria de Rui Pereira, colocada por iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa e da Junta de Freguesia da Misericórdia.
Sobre esta iniciativa, Alice Cunha considerou o memorial "bonito e relevante, por ter sido colocado na zona do Príncipe Real, zona historicamente LGBT em Lisboa".
"Mas não nos podemos ficar pela memória, temos de continuar a lutar e a combater a discriminação, a homofobia e a transfobia", afirmou.
Também presente no desfile esteve a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Catarina Marcelino, que considerou importante a realização de eventos como esta marcha "que ajudam a fazer a afirmação dos direitos e deveres das pessoas LGBT".
Em declarações à agência Lusa, a secretária de Estado recordou que o Governo associa-se ao evento pelo segundo ano consecutivo "porque é uma matéria importante quando se fala de direitos, liberdades e garantias".
"Temos feito avanços importantes ao nível da lei, mas é ainda preciso mudar muito as mentalidades", defendeu Catarina Marcelino.
Questionada pela Lusa sobre a existência de medidas em curso relativas à legislação nesta área, a governante disse que se encontra no parlamento uma proposta de lei do Governo no âmbito da identidade de género.
"Essa proposta de lei permite que estas pessoas, quando forem mudar o nome e sexo no cartão de cidadão, não precisem de relatório médico, como agora é exibido, e também que possam fazê-lo a partir dos 16 anos", indicou.
A lei, segundo a secretária de Estado, vai ainda mais longe nestas matérias e prevê que nas escolas, crianças abaixo dos 16 anos que sejam transgénero possam usar o nome próprio com que se identificam.
"É um aspeto muito importante, sobretudo na adolescência, porque há muitas crianças que sofrem por terem de usar o nome que não corresponde à sua identidade de género", disse, acrescentando que o Governo espera que esta proposta de lei seja discutida ainda este ano.
Questionada sobre a situação da legislação em Portugal comparativamente a outros países, a governante indicou que a ILGA-Europa (Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo) "tem um ‘ranking’ no qual Portugal está em sexto lugar".
"É muito importante porque temos uma legislação muito avançada. Temos a não discriminação por orientação sexual estabelecida na Constituição Portuguesa. Só há nove países no mundo que o têm", sublinhou a secretária de Estado.
A marcha deverá terminar na Ribeira das Naus, estando prevista uma festa final, como título "Now sissy that walk", pelas 22:00, no Rive-Rouge.
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