Em causa está concessão da recolha de biorresíduos - restos de alimentos de casas e restaurantes e resíduos de jardins -, que o Governo quis no ano passado dar à empresa EGF, privatizada em 2014 para o grupo Mota-Engil e que já tem concessão para recolha de resíduos urbanos na maior parte dos municípios.

Ouvido na Comissão Parlamentar de Ambiente, Orlando Borges afirmou que é "insultuoso dizer que o regulador não é competente", o que acusa o executivo de fazer quando procurou dar, por despacho, os biorresíduos à EGF quando o regulador se opunha por considerar que prejudicava a concorrência no setor e não beneficiava o interesse público.

"O ministro do Ambiente não tem competência nenhuma para avaliar a entidade reguladora, que foi sempre avaliada de forma elogiosa pelas entidades que a avaliam", afirmou Orlando Borges, afirmando que o ministro Matos Fernandes não podia ter dito que a Entidade Reguladora do Setor da Água e Resíduos "desestabiliza o setor e não o compreende".

O regulador opunha-se também a que os investimentos que a EGF teria que fazer para assumir os biorresíduos pudessem ser incluídos nos "ativos regulados" do grupo, que teriam que ser suportados pelos consumidores nas tarifas que pagassem.

Aos deputados, Orlando Borges afirmou que entregar os biorresíduos à EGF "poderia ser mais caro [para os cidadãos] porque não haveria concorrência".

O despacho acabaria por ser vetado pelo Presidente da República e revogado pelo Governo, de que João Ataíde das Neves era secretário de Estado do Ambiente.

O ex-governante, também ouvido pelos deputados, reiterou as posições do Governo que integrou, afirmando que entregar a recolha de biorresíduos à EGF, que já tem uma estrutura montada de recolha de outros resíduos, seria a única maneira de Portugal cumprir as metas a que a União Europeia a obriga nesta matéria até 2023.

O investimento necessário para assumir esta competência seria "residual, uma vez que a EGF já faz a recolha dos resíduos urbanos", argumentou.

Recusou que o Governo tivesse querido proporcionar um negócio milionário à EGF sem concurso público, argumentando que agora, revogado o despacho pode haver "308 concursos", um por cada município, em que cidades sem ser Porto e Lisboa terão que montar a infraestrutura, "isso sim, um negócio chorudo".

"As aparências iludem. Não há [no despacho] um negócio, há uma interpretação do que é relevante para o interesse público", acrescentou.