O ministro do Trabalho, Vieira da Silva, definiu como prioridades o combate à precariedade e a dinamização da contratação coletiva e já disse que as medidas vão seguir o que está no Programa do Governo, podendo entrar em vigor este ano, embora não tenha ainda apresentado propostas.
Até agora, o Governo apresentou dois documentos com perguntas aos parceiros sobre quais as melhores soluções para a redução da segmentação do mercado de trabalho e para a negociação coletiva. As duas centrais sindicais têm posições divergentes, enquanto as confederações patronais alinham na defesa de que não se deve alterar a lei laboral numa altura em que a economia e o emprego estão a crescer.
Eis as principais medidas sobre a lei laboral que estão em discussão entre os parceiros sociais:
Diferenciação da Taxa Social Única
No combate à precariedade, uma das medidas inscritas no programa do Governo e acordada com o Bloco de Esquerda é o agravamento da contribuição para a Segurança Social (Taxa Social Única – TSU) das empresas com excesso de rotatividade de trabalhadores. Porém, no documento enviado aos parceiros em novembro, o Governo retoma a ideia inicial e questiona sobre a possibilidade de se alterar a TSU para os contratos a termo, mas também para os contratos sem termo (reduzindo a taxa nestes últimos).
Para o líder da CGTP, Arménio Carlos, a diferenciação da TSU “não faz sentido, pois não se combate a precariedade com pequenas multas às empresas”. Para a intersindical, o combate à precariedade deve seguir o princípio de que “a um posto de trabalho permanente deve corresponder um vínculo efetivo”.
A UGT coloca “reservas” à intenção do Governo de mexer na TSU, mas o dirigente sindical Sérgio Monte diz que a medida pode ser aceite desde que seja “neutra” para as receitas da Segurança Social.
Do lado do patronato, o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), Vieira Lopes, diz estar disposto a discutir “desde que haja atuação dos dois lados”, ou seja, desde que haja também uma redução da TSU para os contratos permanentes.
Também o presidente da Confederação do Turismo Português (CTP), Francisco Calheiros, afirma estar “disponível para debater o tema”, mas diz que a prioridade deve ser a redução da TSU nos contratos sem termo. Por outro lado, afirma que, se o aumento da taxa avançar, deve circunscrever-se a setores “onde não se justifica o recurso a modalidades flexíveis de emprego”, categoria onde o turismo não se encaixa.
A contratação a termo no setor do turismo “constitui um dos instrumentos jurídicos de modelação das relações laborais a que as empresas têm necessariamente de recorrer”, defende.
Na mesma linha, o presidente da CIP – Confederação Empresarial Portuguesa, António Saraiva, afasta a medida, salientando que o emprego está a crescer e que a contratação sem termo aumentou em 2017.
Já a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) aguarda pela proposta do ministro, lembrando que o Governo “já deu sinais” de que não será aplicado o aumento da TSU “aos contratos a termo nos setores que necessitam de recorrer ao trabalho sazonal”, como é o caso da agricultura, diz Eduardo Oliveira e Sousa.
A diferenciação da TSU já está prevista no Código Contributivo, mas nunca chegou a ser aplicada. A lei estabelece um aumento de três pontos percentuais (de 23,75% para 26,75%) para a entidade empregadora quando estiverem em causa contratos a prazo. Por outro lado, prevê uma redução de um ponto percentual para os contratos permanentes.
Limitar os contratos a prazo
No Programa do Governo está prevista a revogação da norma do Código do Trabalho que permite a contratação a termo de jovens à procura do primeiro emprego e de desempregados de longa duração.
No documento apresentado aos parceiros sociais em novembro, Vieira da Silva quis saber qual a disponibilidade de patrões e sindicatos sobre possíveis alterações que limitem os fundamentos da contratação a termo, bem como quanto à sua duração máxima.
As centrais sindicais aplaudem limitações à contratação a termo, mas as quatro confederações patronais consideram que não se deve mexer na lei.
A existirem alterações, diz o presidente da CCP, devem apontar no sentido de “melhorar a fiscalização” para travar “algumas empresas que fazem contratos a prazo fora das condições previstas na lei”. Em tudo o resto, a lei deve ficar como está, diz Vieira Lopes.
Já o presidente da CTP sublinha que “a flutuação da procura é uma característica da atividade turística que implica para as empresas um contínuo ajustamento do seu quadro de pessoal, sobretudo através do recurso da contratação a termo”.
Também a agricultura é marcada pela sazonalidade, “um dos fundamentos previstos no atual Código do Trabalho para a utilização do contrato a termo certo e incerto”, afirma, por sua vez, Eduardo Oliveira e Sousa.
Segundo o Código do Trabalho, o contrato a termo só pode ser celebrado para satisfazer necessidades temporárias na empresa, como substituição de um trabalhador ausente, atividade sazonal ou picos de produção, entre outros. A lei prevê ainda que possa ser celebrado contrato a termo para início de laboração de empresa com menos de 750 trabalhadores, contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego e em situação de desemprego de longa duração.
O contrato de trabalho a termo certo pode ser renovado até três vezes, não podendo exceder 18 meses para pessoa à procura de primeiro emprego, dois anos em caso de desemprego de longa duração, e três anos, na generalidade dos restantes casos.
Fim do banco de horas individual
No âmbito da negociação coletiva, o Governo defende a revogação da norma que permite o banco de horas individual (por acordo entre empregador e trabalhador), prevista no Código do Trabalho desde 2012. A ideia é remeter o banco de horas apenas para a negociação coletiva ou acordos de grupo.
A CGTP quer acabar com a possibilidade de bancos de horas, sejam eles individuais ou coletivos, mas a UGT tem uma posição diferente. Segundo Sérgio Monte, se o banco de horas for negociado entre representantes dos trabalhadores e empregadores “pode trazer vantagens para uns e para outros”.
Do lado do patronato, Francisco Calheiros considera que o banco de horas individual “é essencial para uma economia moderna, global e competitiva” e pode contribuir para “a manutenção de níveis de emprego em determinadas áreas de atividade, como o turismo”.
O regime de banco de horas individual é instituído por acordo entre o empregador e o trabalhador, podendo o período normal de trabalho ser aumentado até duas horas diárias e atingir 50 horas semanais, com limite de 150 horas por ano. O acordo pode ser celebrado mediante proposta do empregador, presumindo-se a aceitação por parte de trabalhador. Se for contra, o trabalhador tem 14 dias para se opor.
No documento que o ministro apresentou aos parceiros sociais, entre as questões, o Governo pergunta se, além do previsto na lei, “existem matérias que devem ser reservadas ou remetidas preferencialmente para a esfera da contratação coletiva, não devendo ser reguladas por contrato de trabalho”.
Caducidade dos contratos coletivos
A CGTP defende o fim da norma da caducidade das convenções coletivas, que permite que tanto empregadores como representantes dos trabalhadores possam denunciar a convenção para que ela caduque ao fim de algum tempo em vigor. Porém, o ministro já recusou esta proposta da CGTP: “Não está no Programa do Governo”, afirmou Vieira da Silva. Contudo, o governante admitiu que poderá haver melhorias nesta área.
Aliás, no documento apresentado aos parceiros com as cinco perguntas sobre contratação coletiva, o tema da caducidade não é referido. O executivo pergunta, no entanto, se os parceiros consideram que os mecanismos de arbitragem “poderão ser aprofundados”.
Por sua vez, a UGT propõe alterações à norma da caducidade, defendendo que a mesma deve ser “justificada e bem fundamentada”. Além disso, a central sindical de Carlos Silva quer definir quais as matérias laborais que, em caso de caducidade da convenção coletiva, transitam para o contrato individual.
O patronato considera importante dinamizar a contratação coletiva, mas defende que “acabar com a caducidade é completamente errado”, segundo Vieira Lopes.
Princípio do tratamento mais favorável
Quanto ao princípio do tratamento mais favorável, também as posições das duas centrais sindicais são diferentes. Enquanto a CGTP exige a reintrodução do princípio que caiu em 2003, a UGT defende alterações, no sentido de alargar as matérias que devem ser abrangidas por esta regra.
O princípio do tratamento mais favorável estabelecia que, por negociação coletiva, era possível estabelecer um regime diferente da lei geral, desde que mais favorável para o trabalhador. Atualmente, o leque de matérias laborais em que este princípio se aplica é menor (é o caso, por exemplo, do regime de férias que, por negociação, só pode ser aumentado).
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