Caro José António Saraiva, espero encontrá-lo bem. Bem sei que estando em 1814 a vida é mais difícil do que em 2018. Volta e meia há acidentes graves de carroça puxada a pretos a caminho de um restaurante onde não entram mulheres, como tenho sabido, além de que também aí não descobriram ainda a penicilina, por exemplo. Por isso, espero que ande agasalhado, não vá soprar uma aragem de liberdade individual e deixar-lhe os valores patriarcais todos engripados.
Tive o prazer de ler a crónica que publicou há dias no pergaminho Sol. Não lhe minto, foi um regozijo. Mas vamos por partes.
No início da crónica, começa por falar de assédio sexual dizendo: “Há uma responsabilidade do assediador. Mas também há uma responsabilidade do assediado. Cada pessoa tem a hipótese de dizer ‘não’, a menos que seja ameaçada com uma pistola".
Fala de alguns casos pontuais de pessoas que tiram vantagens de casos de “assédio”, pondo-as no mesmo saco que todas as vítimas de abusos sexuais. Como o compreendo! Em cada 1000 casos de assédio, há 1 que é um aproveitamento da vítima, por isso é uma generalização perfeitamente aceitável. E nem percebo como é que o José António é acusado de ser um rígido conservador extremista quando até se rege por uma versão mais ligeira do “foi violada porque andava sempre de mini-saia”. Muito razoável.
Mas o meu parágrafo preferido é o seguinte: “Está-se a ir depressa de mais e longe de mais. Nos últimos 50 anos tem sido uma loucura: destruição da família tradicional, legalização das drogas leves, salas de chuto, legalização do aborto, legalização do casamento gay, adoção por casais homossexuais, operações de mudança de sexo, ataques a pessoas com opiniões diferentes, etc". Se houvesse uma t-shirt com este pensamento, usava-a todos os dias.
José, está carregado de razão. Aqui, em 2018, a família tradicional está a destruir-se, com isto de se achar que as mulheres e os homossexuais devem ter os mesmos direitos que os homens ou com a moda que é consagrar a liberdade individual de não constituir família a sério (homem mais mulher mais filhos). É absurdo as pessoas acharem que podem escolher levar uma vida diferente do padrão vigente, pensando apenas na sua felicidade e sabendo que vão magoar os sentimentos dos porta-estandartes da tradição.
Legalização das drogas leves, vergonhoso e um perigo para toda a sociedade. Como sabemos, morrem milhões de pessoas todos os dias por fumarem erva. Já as mortes provocadas pelo consumo de açúcar (diabetes), sal (problemas cardiovasculares), álcool e tabaco são praticamente residuais.
Salas de chuto e a descriminalização do consumo de droga foi mais um grande erro na História de Portugal. O consumo de heroína, e as mortes por overdose, diminuíram drasticamente e é uma pena porque era uma forma de selecção natural que eliminava os mais fracos que sucumbiam à tentação do cavalo.
Aborto, nem em casos de violação devia ser legal por duas razões. Se uma criança foi gerada é porque foi vontade de Deus, e porque, lá está, se foi violada é muito provável que tenha sido por se pôr a jeito.
Já o casamento gay, a adopção por casais gay e até mesmo a mudança de sexo são apenas aberrações que destroem os valores construídos tão justamente há séculos e séculos na sociedade ocidental cristã. As pessoas têm de perceber que não podem almejar serem felizes na sua sexualidade e afetividade se isso causar repulsa (ou fizer vir à tona desejos reprimidos) nos outros.
Portanto, caro José, aqui em 2018, o cenário está negro. As pessoas querem ser felizes, aceitando a sua própria natureza e lutando para sê-lo, em vez de se acomodarem na infelicidade dos velhos e bons costumes até estarem tão absortas na tradição imposta que já nem ligam ao supérfluo conceito de felicidade.
Deixe-se estar aí que aqui é difícil compreender a sua excelente moralidade, mas se vier é bem-vindo.
Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:
- BecaBeca: Novo espectáculo d’ Os Improváveis. É às quartas-feiras, no Villaret, e na próxima vou estar a entrevistar o chef Ljubomir.
- Obrigado, Internet!: Espectáculo de Fernando Alvim, Pedro Paulos e Nuno Dias. Amanhã (domingo) no S. Jorge.
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