“Eles? Eles dão-se lindamente! Não têm muita diferença de idades, sabe?” podia ser uma frase dita numa escola que Portugal e a Catedral de Notre-Dame tivessem frequentado, pelos respectivos encarregados de educação. É que aquele país e esta Catedral nasceram quase na mesma altura, com vinte anos de vantagem para Portugal, uma ninharia na história da Europa. Podiam ter andado no mesmo infantário. Não é bonito ver um colega de turma nesta situação.
Fogo, Notre. 850 não é nada uma boa idade para cair, Notre. Tivesses caído mais cedo. É que ninguém quer realmente saber de monumentos recentes. Talvez ninguém gostasse de Notre Dame no início. Quem sabe se a Catedral de Notre Dame não foi considerada um mamarracho no seu tempo? “Já viram, estas modernices? Porcaria de Igreja. Arcos em ogiva e não sei que mais, não gosto nada. Olha-me para estas abóbadas da treta. Depois, é tudo altíssimo. Que é isso de pináculos? Isto é arquitetura de bárbaros.”
Agora, será empático fazer luto por um edifício? Eu julgo que não é surpreendente que sintamos empatia por esta perda dos franceses. Já quando ocorreram os atentados de 2015, sofremos mais com o ataque ao Charlie Hebdo do que com as atrocidades do Boko Haram. É uma questão de proximidade, dizia-se. Os jornais fizeram belas capas com a queda do pináculo de Notre Dame, mas se calhar o furacão Idaí não foi tão imediatamente mediatizado. Porquê? Será que ainda é proximidade? Paris é geograficamente mais perto, mas Moçambique não é emocionalmente mais longínquo.
Possivelmente, é uma questão do que é que faz parte do nosso imaginário, da nossa autoimagem e de algum egoísmo. Custa-nos a destruição daquilo a que gostamos de estar associados. Mas lá está, sabem o que é que é menos empático? Estar a comparar lutos. “O meu luto é maior que o teu”; “Sinto-me mal porque acho que o meu luto podia ser maior”; “O luto dos asiáticos costuma ser mesmo muito pequenino”. A não ser, claro está, que a Humanidade se tenha tornado num balneário de ginásio low-cost, nesse caso começarei a andar de luto ao léu.
Se procurarmos relativizar tudo, isto de chorar a destruição de património também é um privilégio ocidental. Quando o Estado Islâmico varreu o Iraque e a Síria causaram danos na História (neste caso, de propósito), destruindo dois monumentos na cidade de Palmira. Mas depois também tinham aquela mania de fazer vlogs de decapitação e a malta não se focou muito nisso.
Aliás, sinto que há pessoas a desejar que o que aconteceu em Paris seja algo mais do que um acidente, para que possam sair da toca, procurando demonizar algum grupo de pessoas e sublinhar o ataque ao símbolo da europa cristã branca bonita e que só dá um beijinho. Esperemos é que não tenha sido um encarregado da obra a fumar um cigarro displicente. Seria uma involuntária, todavia excelente, campanha publicitária para as marcas de tabaco aquecido e ninguém quer a proliferação de tais máquinas, essas sim, do demo.
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