A razão perdeu-se com a lista de mortos a crescer diariamente, com os raptados a viver dias de terror. Não vou escrever sobre as crianças. Não deveria ser necessário bradar aos céus, e a toda a forma de Deus que queiram ter, como o terror da guerra atinge, prejudica e molda os mais novos. A pergunta não se pode fazer; ainda assim, deixo-a: uma criança israelita vale mais que uma criança na Palestina?

Os mortos de uns não valem mais do que os mortos dos outros. Acredito nisto.

A história não tem justificações apenas num sentido. Não há uma só versão dos factos, se fosse simples não seria uma questão há tanto tempo. A complexidade é tamanha, mas também é o passado. Importaria pensar no futuro com um sentido de dignidade, de ética, se quiserem, com uma bússola moral que seja básica: a vida humana preserva-se; concordar que discordamos do Outro não impede o diálogo; a violência não é resposta.

Os senhores do Hamas estarão sentados lá longe, suspeita-se que no Qatar. Que ideias têm sobre o futuro? O seu anti-semitismo justifica a morte de inocentes? Quem está a falar com esta gente? E em Israel? Quem é que cria estratégias humanistas com base nos princípios do cuidado com o Outro, um ensinamento judeu? Posso ser muito ingénua e simplesmente não entender a complexidade do “negócio da guerra”, que enriquece uns quantos e devasta a vida de muitos outros; no entanto, não seria de esperar, depois de tudo o que a civilização percorreu, que a opção da guerra fosse eliminada de vez?

Rirão da minha forma simplista de querer um mundo mais adulto, mais comunicante, responsável e respeitador do próximo. Não faz mal, aceito esse riso com a mesma bonomia com que aceito outras opiniões. Desde que não morra ninguém. Desde que façamos o exercício de entender que a vida é, deveria ser, um valor maior.

A guerra no Médio Oriente começou há mais de um mês; a guerra na Ucrânia continua, desde 24 de Fevereiro de 2022. Fará dois anos, não tarda.

Os mortos que se contabilizam não têm rosto, ninguém anda a contar as suas histórias – se o fizessem elas seriam como todas as outras, teriam altos e baixos: um homem começou a trabalhar com o sonho de um qualquer outro ofício, depois apaixonou-se e mudou a sua vida; aquela mãe mantinha os filhos na universidade, à custa de dois empregos; um certo jovem adorava música e tinha conseguido uma bolsa de estudos…  são histórias de vida como estas que o terrorismo e a violência da guerra interrompem.

Os mortos de uns não valem mais do que os mortos dos outros.