A braços com o mundo

António Moura dos Santos
António Moura dos Santos

No que toca a matérias do foro lúdico, poucos jogos são de compreensão mais imediata do que o braço-de-ferro.

Segundo a definição do Priberam — prefiro recorrer à descrição desapaixonada e rigorosa de um dicionário à minha experiência pessoal — trata-se de um “jogo em que dois adversários, colocados frente a frente, mantendo os cotovelos assentes numa superfície fixa e os braços flectidos e agarrando na mão um do outro, fazem força para que um deles perca o desafio ao bater com as costas da mão na superfície de apoio”. Simples, intuitivo, deselegante.

Contudo, nem todas as modalidades do braço-de-ferro são assim, algumas incluem três adversários. É o caso do braço-de-ferro que tem anteposto o Sindicato Nacional dos Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP), a Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias (ANTRAM)  e o Governo.

Soma-se o terceiro dia da greve dos motoristas de matérias perigosas e de mercadorias e o seu fim não parece estar à vista, estando as forças de cada braço proporcionalmente distribuídas. As novidades quanto a este embate seguem em permanente atualização no SAPO24.

Depois de prometer que os motoristas não iam cumprir serviços mínimos nem a requisição civil decretada, o porta-voz do SNMMP desafiou a ANTRAM para uma reunião, apesar de não desarmar a greve. A associação desafiada, à data da conclusão deste texto, ainda não tinha respondido, tal como o Governo ainda não sabia se a requisição civil tinha sido cumprida, havendo, pelo menos, um caso de incumprimento a registar em Faro.

Do outro lado do mundo, outro braço-de-ferro mantém-se em curso, desta feita no seio de uma crise política que pôs em confronto ativistas e polícia em Hong Kong. Há mais de dois meses que o mundo tem vindo a observar este choque, que começou por ser a objeção a um projeto-lei mas agora reveste-se de uma verdadeira incerteza quanto ao futuro político desta região autónoma chinesa. Também aqui, não se sabe quando irá terminar, se bem que o avolumar de militares chineses junto à fronteira fornece algumas pistas (nem por isso auspiciosas).

Já há, contudo, um braço-de-ferro que chegou ao fim e de forma inesperada. Depois de uma primeira ronda algo débil, mas vitoriosa, o FC Porto foi surpreendido com um golpe súbito do Krasnodar em casa — uma crónica que pode ler aqui — e caiu para a Liga Europa, onde possivelmente encontrará o Vitória de Guimarães, que disputa neste momento o seu retorno às competições europeias com o Ventspils da Estónia.

E, se para o emblema comandado por Ivo Vieira, este braço-de-ferro ainda não garantiu um lugar nos palcos europeus, para a representação feminina é já uma certeza. Esta é também uma noite histórica, porque pela primeira vez uma árbitra irá apitar uma final de uma competição europeia. Liverpool e Chelsea encontram-se em Istambul num jogo de forças pela Supertaça Europeia e será Stéphanie Frappart a mediar o conflito.

Numa nota final, e porque os braços não servem apenas para guerrear entre si, hoje dá-se o início da 27ª edição do Festival Vodafone Paredes de Coura 2019, onde os festivaleiros poderão usá-los para ajudar ao crowdsurfing, elevar-se em palmas ou simplesmente dar abraços.

Idos são os tempos em que a sua entrada era grátis e o cartaz consistia na nata das bandas de garagem — só hoje há The National, Boogarins e Julia Jacklin — mas o espírito de libertação e festa é o mesmo. Aí, o braço-de-ferro é apenas entre o descanso e a folia, cabendo a cada um a qual dar mais força.


Hoje o dia foi assim por António Moura dos Santos.

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