Estado da arte: viver com o vírus e os riscos do longo prazo

Marta Pedreira Mixão
Marta Pedreira Mixão

Regressaram as reuniões no Infarmed e hoje deu-se a primeira desde que saímos do estado de emergência e os especialistas recomendaram que, por enquanto, se mantenha a atual matriz de risco composta por dois critérios – o índice de transmissibilidade (Rt) do vírus e a taxa de incidência de novos casos de covid-19 por cem mil habitantes – que tem servido de base para a decisão do processo de desconfinamento.

Apresentaram também uma nova proposta de modelo de desconfinamento de três patamares. “A nova proposta assenta em pilares que deverão ser mantidos: primeiro, a velocidade a que a população está a ser vacinada, a política de testagem alargada, que é a única forma de garantirmos que os números que temos são reais e que os casos são detetados de forma precoce; a vigilância serológica das variantes; a monitorização dos indicadores; o cumprimento das medidas de proteção individual e a ventilação eficaz dos espaços interiores”, explicou a investigadora Raquel Duarte, da Universidade do Porto.

Além disso, foram apresentadas várias conclusões e informações que nos permitem ter uma melhor noção da evolução da pandemia no país.

Ora, começando pela chamada Taxa de Incidência da pandemia, esta cresceu na última semana, sobretudo na região de Lisboa e Vale do Tejo, que se encontra agora em situação de alerta - depois de ter registado o triplo de novos casos do esperado. Este aumento deve-se, segundo sugere André Peralta Santos, diretor de serviços de Informação e Análise da Direção-Geral da Saúde, à "grande densidade e movimentos pendulares intensos”.

As freguesias do centro de Lisboa são as que apresentam maior incidência, superior a 240 casos por 100 mil habitantes. No entanto, “algumas das freguesias mais centrais da cidade têm já alguma tendência de descida”, mas o “crescimento está a dispersar-se pelas freguesias vizinhas” e até por outros concelhos.

Portugal tinha, esta sexta-feira, 18 concelhos com incidência de novos casos de infeção superior a 120 casos por 100 mil habitantes nos últimos 14 dias, menos três que os registados há uma semana.

Segundo dados divulgados esta sexta-feira no boletim epidemiológico da Direção-Geral da Saúde, continua a não haver registo de concelhos em risco muito elevado, ou seja, com uma incidência superior a 960 casos por 100 mil habitantes a 14 dias.

Quanto à maior incidência, em termos de faixa etária, aí verificamos que os casos de infeção de registam sobretudo nos jovens adultos, mais concretamente os grupos dos 20 aos 29 anos, 30 aos 40 e com o pico nos 25 anos. Pelo contrário, nos 80 anos, o número de casos continua a descer devido ao esforço de vacinação.

A tendência de hospitalizações, pelo menos até ao momento, também tem baixado, afetando principalmente a faixa dos 40 aos 59. Algo que poderemos considerar expectável, porque a vacinação da população com mais idade permitirá ver a redução dos internamentos nestas idades.

Em relação às variantes, a indiana já representa quase 5% dos casos e agora admite-se a possibilidade de transmissão comunitária, segundo sugere o relatório de monitorização das linhas vermelhas para a covid-19, da autoria da Direção-Geral da Saúde e do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), que reporta a “ausência de ligação epidemiológica em alguns dos casos mais recentes”.

Em situação inversa encontra-se a variante britânica, que em abril representava 91% dos casos e em maio baixou para 87,2%.

Ainda na reunião do Infarmed, ao apresentar o estudo "Da epidemia à endemia. Da infeção aguda às consequências crónicas", Henrique Barros, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, deu conta de uma "endemização" da covid-19. De acordo com o professor, o medo de estar infetado e a ansiedade quanto à doença foram baixando e a população nacional começou a aprender a viver com o vírus.

“Podemos pensar se esta doença, que emergiu há cerca de ano e meio, de uma fase de evidente epidemia e pandemia, estará ou não a entrar num momento de endemia e de que maneira é que aquilo que identificamos – o facto de a infeção ter um curso agudo - se está a desenvolver como uma síndrome pós-covid ou ‘covid longa’ pela presença de sintomas e de doenças para lá de 12 semanas após a resolução da fase aguda”, afirmou Henrique Barros.

Há dois pontos ainda a destacar das conclusões apresentadas por Henrique Barros. Um é que "a probabilidade de morrer desceu brutalmente", passando de uma em cada cinco pessoas infetadas para "um em cada 20 pessoas infetadas" — sendo claro o papel da vacinação neste aspecto. Outro é que o “o vírus chegou para viver entre nós”.

E é importante relembrar: um terço dos infetados ainda sofrem de efeitos prolongados da infeção e o risco de ter uma forma crónica da doença entre quem se infeta mantém-se exatamente o mesmo.

Hoje, ainda recebemos novidades na área da vacinação, com a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) a dar luz verde à administração da vacina da Pfizer a crianças entre os 12 e os 15 anos

Com o ritmo de vacinação contra a covid-19 a aumentar, começam a surgir sinais de esperança para os próximos meses, mas nunca é demais relembrar que as medidas de prevenção são para manter.

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