Poucas horas depois do encerramento do Congresso do PS, ainda o discurso de Pedro Nuno Santos estava a ser analisado pelos comentadores políticos, e pela a oposição, e já a atenção mediática se virava para a Alfândega do Porto, onde a Aliança Democrática oficializava o acordo de coligação.

Embora a Aliança Democrática tenha jogado uma boa cartada ao conseguir que se virasse a atenção do congresso socialista, precisa ainda de um bom trunfo. Porque se foi impressão geral que o discurso de vitória do Secretário Geral deixou a desejar, este encheu-lhe todas as medidas. Com propostas concretas e a piscar o olho a um eleitorado mais à esquerda, que lhe é tão confortável. Entre outras medidas, Pedro Nuno Santos quer salário mínimo nos mil euros, alterar a forma de financiamento da segurança social e mudar o indexante de atualização das rendas para que tenha em consideração a evolução dos salários.

A AD aproveitou a veia canhota de Pedro Nuno Santos e, no primeiro discurso de formalização da Aliança, Luís Montenegro posicionou-se e o posicionou a AD como a hipótese do centrão e daqueles que quiseram cortar com o PS. O líder do PSD fez mesmo um apelo ao voto dos que, nas últimas eleições, deram maioria absoluta ao PS. “Àqueles que acreditaram no PS há dois anos, quero dizer que este projeto da AD é também para vós, para os que se desiludiram. Que bela oportunidade deram ao PS e que o PS desperdiçou completamente”, considerou.

Na primeira aparição pública, em conjunto, dos líderes dos partidos que agora se coligaram houve vários temas nos discursos onde falaram a uma só voz. Por exemplo, na evocação da memória dos fundadores da primeira Aliança Democrática, o Presidente do CDS, Nuno Melo, lembrou que os que fizeram a primeira AD mudaram Portugal, lembrando Sá Carneiro, Freitas do Amaral, Adelino Amaro da Costa e Gonçalo Ribeiro Telles. E acrescentou que em comum com esses "temos a mesma determinação no combate ao socialista e no amor a Portugal”. Já muitas comparações têm sido feitas entre os nomes iniciais, e os três atuais. Resta agora saber se terão a mesma capacidade reformadora e de transformar o país. Ou, até, se terão hipótese de mostrar essas capacidades, porque do ponto de vista das intenções de voto há uma diferença entre a AD de 1979 e a de 2024.

Mas se houve tema em que Luís Montenegro, Nuno Melo e Gonçalo da Câmara Pereira falaram a uma só voz foi na saúde, centrando os seus discursos no SNS e na importância que tem nos seus planos de futuro. Dizendo não haver tempo para experimentalismos, o presidente do CDS-PP apelou ao voto na Aliança Democrática por ser uma "aposta segura", ter sido criada para fazer crescer a economia, devolver eficácia ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) e dar esperança aos portugueses.

O líder do PSD elegeu esta área como “a grande prioridade social do Governo da AD” e apelou a uma reflexão sobre o estado do SNS nas legislativas antecipadas de 10 de março.

“Há muitas razões para mudar de Governo, mas a degradação do SNS por si já era suficiente para pôr o Governo socialista na rua e para pôr um novo governo a cuidar da saúde dos portugueses”, considerou.

A saúde marcou de tal forma a tarde na Alfândega do Porto, que o primeiro a falar foi o independente Miguel Guimarães, o ex-bastonário da Ordem dos médicos. Tal como a AD de 1979, também esta pisca os olhos aos independentes e aos apoiantes de peso e históricos do partido que se deslocaram ao Porto.

Miguel Guimarães, com a confiança de quem tem autoridade no tema, chegou a dizer "se o PS criou o SNS, agora está a destruí-lo". Fez duras críticas ao funcionamento da saúde em Portugal - que classificou como "o calcanhar de Aquiles" da governação do PS, dizendo que se o SNS fosse uma empresa estaria falido, uma falência que atribuiu aos principais responsáveis, como o ministro Manuel Pizarro e o diretor-executivo do SNS.

O antigo bastonário questionou se, sendo o orçamento da saúde o maior de sempre, como diz o Governo socialista, e existindo mais profissionais de saúde, "o que é que está a falhar", respondendo que é "falta de competência para gerir corretamente" o SNS.