“Esperamos que Portugal, enquanto assume a presidência rotativa da UE, possa dar um ‘empurrão’ ao processo e, idealmente, esperamos que na primeira metade deste ano possamos assinar estes documentos” preliminares, diz o embaixador Zhang Ming, chefe da missão da China para a UE, em entrevista à agência Lusa e outros meios de comunicação social portugueses em Bruxelas.

Questionado na ocasião pela Lusa sobre o acordo de princípio sobre investimentos alcançado entre Bruxelas e Pequim no final do ano passado, que tem ainda de ser ratificado, o responsável notou que, “depois da assinatura, os documentos serão submetidos aos parlamentos de ambos os blocos para ratificação”.

“Num cenário ideal, o acordo estará formalmente finalizado no final deste ano ou início do próximo e aí entrará em vigor”, estima Zhang Ming.

O representante do bloco chinês para o espaço comunitário precisa que, de momento, os dois lados estão a “tratar do escrutínio legal e da tradução”.

“Não está em causa recomeçar as negociações, apenas estamos a tratar e finalizar os detalhes”, adianta.

Frisando que “a China e Portugal são parceiros bons e próximos”, Zhang Ming diz nesta entrevista à Lusa e outros ‘media’ portugueses que, “Portugal, enquanto Estado-membro, vai de certeza beneficiar com este acordo”.

“O acordo vai facilitar o acesso de investidores chineses e europeus a estes mercados”, pelo que “haverá mais investimento europeu na China e também mais investimento chinês na UE, incluindo em Portugal”, conclui o responsável.

No final de 2020, Bruxelas e Pequim chegaram a consenso preliminar para um acordo global de investimento UE-China, após sete anos de negociações (começaram em novembro de 2013).

O objetivo é, através deste acordo de investimento, proteger mutuamente os investimentos europeus na China e os investimentos chineses na UE, tornando nomeadamente mais fácil que investidores da Europa comprem participações em empresas chinesas, para esta passar a ser uma relação recíproca.

O grupo dos 27 exige também maior respeito pela propriedade intelectual, o fim das transferências forçadas de tecnologia impostas a empresas estrangeiras na China e os subsídios excessivos atribuídos às empresas públicas chinesas.

Os baixos padrões laborais chineses, e em particular a questão do trabalho forçado, constituíam, para vários Estados-membros da UE, o principal obstáculo à conclusão de um acordo com Pequim.

O texto do acordo deverá agora ser finalizado pelas partes e aprovado pelo Conselho (Estados-membros) e pelo Parlamento Europeu.

Portugal e China têm exemplar e de respeito mútuo

“Penso que podemos considerar a relação de Portugal e China como exemplar e penso que o segredo é o respeito mútuo”, afirma o embaixador Zhang Ming na mesma entrevista à agência Lusa.

Nesta entrevista dada a propósito da presidência portuguesa da UE, o responsável insiste que “Portugal tem vindo a demonstrar um grande respeito pela China e a China ainda mais respeito por Portugal”.

“Nunca interviemos nos assuntos internos um do outro, o que é importante, e espero que continuemos a promover a nossa cooperação em prol do interesse dos dois países e dos seus cidadãos”, vinca Zhang Ming.

Notando que “Portugal não foi dos primeiros países a estabelecer ligações diplomáticas com a China [e que] talvez tenha sido até dos últimos”, o embaixador observa que, “desde o final dos anos 1970, aquando do estabelecimento dessas ligações, a relação bilateral entre os dois países tem vindo a desenvolver-se de forma suave, rápida e amigável”.

“Agora podemos ver uma cooperação bastante próxima entre os dois países”, frisa.

Nos últimos anos, após a crise financeira anterior, o investimento chinês tem vindo a marcar forte presença em Portugal, através de novas empresas ou da entrada de capital em companhias nacionais, esperando Pequim que haja ainda mais aposta no país devido ao novo acordo de investimento UE-China que será ratificado até final do ano.

Questionado pela Lusa sobre os constantes avisos da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu para os Estados-membros porem fim a programas de autorização de residência ou de nacionalidade perante investimento, como o português ‘vistos gold’, Zhang Ming escusa-se a comentar, dizendo que esta é “uma matéria interna da UE”.

Ainda assim, vinca: “Há alguns investidores de países terceiros a tentar obter autorizações ou autorizações ou vistos de residência [nalguns países da UE] através do investimento e isto não é algo incentivado pelo governo chinês”.

Em outubro passado, o Parlamento Europeu defendeu que os países da UE devem “acabar imediatamente” com os programas de vistos ‘gold’ que dão residência ou cidadania a investidores estrangeiros, criticando que esta é uma “entrada rápida para criminosos”.

Depois de severos avisos do executivo comunitários, os eurodeputados tomaram nessa altura posição para exigir o fim dos designados programas de passaportes dourados, existentes em 19 Estados-membros, vincando que “a cidadania da UE não pode ser comercializada como uma mercadoria”, assinala a instituição em comunicado de imprensa.

Em Portugal, existe há mais de oito anos um programa de vistos ‘gold’, que fornece autorizações de residência a investidores estrangeiros, não lhes garantindo porém cidadania.

Entre os maiores beneficiários estão, normalmente, investidores da China, Brasil e Estados Unidos.

Em 2020, o investimento captado através dos vistos 'gold' em Portugal caiu 13% face ao ano anterior, para 646,7 milhões de euros, segundo contas feitas pela Lusa com base nas estatísticas do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

Espera-se que o Governo acabe gradualmente com este instrumento em Lisboa e Porto, de forma a aliviar a pressão no mercado nas duas cidades.

China “respeita plenamente” desenvolvimento de relação UE-Índia

“A União Europeia é um poder importante na comunidade internacional e respeitamos plenamente a sua política externa. Também ficamos contentes de ver mais progresso e desenvolvimentos nas relações da UE e de outros membros da comunidade internacional, incluindo na relação UE-Índia”, sublinha Zhang Ming.

O embaixador da China reage assim à prioridade identificada pela presidência portuguesa do Conselho da UE de diversificar as relações com os parceiros do Indo-Pacífico, nomeadamente com a Índia, através da organização, a 08 de maio no Porto, de uma cimeira informal que irá juntar os líderes dos 27 ao Presidente indiano, Narendra Modi.

Frisando que não acha que “nenhuma relação bilateral” se baseie “na redução da dependência a um país terceiro”, Zhang Ming descarta a ideia de que uma nova relação entre a UE a Índia possa servir para tornar o bloco menos dependente da China.

“Há décadas que testemunhamos a globalização e o mundo beneficiou com a globalização. E, devido à globalização, os membros da comunidade internacional tornam-se mais dependentes uns dos outros, é uma característica significativa do mundo atual”, salienta o embaixador.

Zhang Ming qualifica assim a Índia de “poder emergente” que atingiu “progressos promissores nas últimas décadas”, e salientou que Pequim, por ser vizinha da Índia, também dá “grande importância” à “relação bilateral Índia-China”.

Nesse sentido, o embaixador chinês adianta que é preciso manter o “caminho da globalização”, fortalecendo a “cooperação entre todos os membros da comunidade internacional” o que, por sua vez, fará com que “dependam mais dos outros”.

“É por isso que advocamos por uma comunidade de futuro partilhado. Todas as pessoas, todos os países, partilham o futuro do mundo”, refere.

Zhang Ming frisa assim que os países não devem “tentar separar-se uns dos outros” – afastando a tese de ‘decoupling’ [dissociação] das economias mundiais – mas antes “ligar-se” de maneira a trabalhar para um “futuro partilhado”.