Já perto do final da 26.ª sessão do julgamento, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, o advogado de Aníbal Pinto, João Pereira dos Santos, apresentou um requerimento – subscrito também pela defesa de Rui Pinto - para que Nélio Lucas comprovasse que era mesmo administrador à data dos factos do processo no que toca à alegada tentativa de extorsão, solicitando a apresentação de “certidões comprovativas das posições societárias”.

No entanto, o coletivo de juízes entendeu não avançar neste momento com a junção do documento e, perante a insistência do representante de Aníbal Pinto - que vincou que as provas de um vínculo efetivo entre o empresário e o fundo de investimento reportavam apenas a 2011 e 2012 -, deixou um reparo ao ‘timing’ de levantamento desta questão.

“Muito se estranha que nesta fase processual, depois de dezenas de sessões e testemunhas, só agora a defesa de Aníbal Pinto diga que [essa informação] é essencial para a prova”, referiu a presidente do coletivo, Margarida Alves.

Com efeito, já ao longo do dia, também os representantes de Rui Pinto – que se mostrou bastante ativo e deu constantes indicações aos advogados - tinham analisado a organização da Doyen, os titulares de investimentos efetuados, as instituições bancárias com que o fundo de investimento trabalhava e empréstimos de dinheiro realizados enquanto operação paralela ao cerne da sua atividade de intermediação de transferências.

E foi esse ponto que gerou também alguma polémica na sessão, com Nélio Lucas a confirmar um empréstimo ao FC Porto, levantando-se dúvidas sobre o responsável da operação, já que o clube portista divulgou nas suas contas que o empréstimo tinha tido origem no Banco Carregosa.

“Não me recordo”, disse o empresário, numa resposta que se repetiria a diversas perguntas dos advogados de defesa durante a sessão.

O antigo administrador do fundo de investimento confirmou também um empréstimo ao ex-presidente do Sevilha José Maria Del Nido, um dirigente espanhol que viria a ser, entretanto, condenado por corrupção.

“Fizemos o empréstimo, foi precisamente para pagar uma caução. Perguntámos às autoridades espanholas se havia algum problema nisso e disseram-nos que era uma opção nossa”, esclareceu.

O passado de Nélio Lucas voltou ainda a ser falado no âmbito do seu registo criminal, depois de ter defendido que o Football Leaks fez muito “barulho” e que não foi “condenado” por nada relacionado com as divulgações da plataforma.

Como consequência dessa afirmação, a defesa de Rui Pinto questionou sobre uma eventual condenação anterior relacionada com cheques sem provisão, mas Nélio Lucas foi lacónico: “Não tenho nada a dizer”.

O julgamento prossegue na quarta-feira, com a audição do advogado Pedro Henriques, antigo colaborador de Nélio Lucas na Doyen, que vai prestar declarações enquanto testemunha.

Rui Pinto, de 32 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.

O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 07 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.