O que aconteceu?

Como se soube ontem ao fim do dia, a Carla Alves coube a dúbia honra de ser a 12ª demissão no Governo, e a mais rápida também: 26 horas depois de ser empossada, a Secretária de Estado da Agricultura pediu escusa.

Em causa, como avançou o Correio da Manhã, esteve o facto de Carla Alves ter várias contas bancárias arrestadas, no âmbito de uma investigação que envolve o seu marido e antigo presidente da Câmara de Vinhais, Américo Pereira.

Apesar de não estar em causa — para já — algum problema legal, cedo se verificou que a governante não teria condições para continuar no cargo, especialmente tendo em conta a onda de escândalos que tem afetado o executivo de António Costa. E ainda mais tendo em conta que se soube no mesmo dia da discussão da moção de censura ao Governo, rejeitada pela maioria PS, e após o anúncio do sistema de verificação aos governantes que o primeiro-ministro propôs ao Presidente da República.

Então porque é que estamos a falar no assunto?

Porque só hoje é que sentimos as ondas de choque de um caso avoluma o confrangedor número de controvérsias e demissões que têm afetado este Governo.

Em particular, o país acordou a indagar-se porque é que a ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, nada fez para evitar mais um episódio comprometedor para o executivo. E a situação piorou com a manchete do Público, que explicitava que a ministra soube das circunstâncias de Carla Alves e convidou-a à mesma.

Pouco depois, ainda durante a manhã, surgiu o desmentido.

“O Ministério da Agricultura e da Alimentação informa que a Ministra da Agricultura e da Alimentação, Maria do Céu Antunes, não tinha conhecimento de qualquer envolvimento de Carla Alves em processos judiciais”, salienta o comunicado de imprensa.

Ao longo desta sexta-feira, vários jornalistas tentaram falar com a ministra à entrada e saída do seu gabinete, mas Maria do Céu Antunes fechou-se em copas, e apenas falou para mencionar que já tinha sido publicado um desmentido.

Que consequências políticas terá o caso?

Pelo que António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa disseram hoje, as mesmas que Fernando Medina — que foi hoje à Assembleia da República falar sobre a TAP, negar responsabilidades e lamentar o sucedido — sofrerá pelo caso Alexandra Reis: nenhumas.

Primeiro foi António Costa, que declarou o caso como “encerrado”. Interrogado se a ministra da Agricultura tem condições para continuar nas suas funções, após a demissão da sua secretária de Estado, o primeiro-ministro respondeu com um “sim”.

“O que disse na Assembleia da República – e posso continuar a repetir - é que a doutora Carla Alves não foi objeto de nenhuma acusação judicial. Foi questionada através do meu gabinete relativamente às suas contas [bancárias] e aquilo que disse é que era titular de uma conta conjunta e tinha declarado tudo o que tinha a declarar às finanças. Ela própria entendeu apresentar a sua demissão. É um caso que está encerrado”, sustentou.

Já questionado se o Presidente da República contribuiu para a instabilidade política ao afirmar que a secretária de Estado demissionária da Agricultura estava diminuída do ponto de vista político, António Costa contrapôs que “o primeiro-ministro não comenta as palavras” do chefe de Estado.

E Marcelo?

Alinhou pelo mesmo diapasão, mesmo perante esta ideia que terá sido ele a precipitar a saída de Carla Alves com o seu aviso público.

Quando questionado se Maria do Céu Antunes tem condições para se manter em funções ou está politicamente limitada, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu: "Quanto ao ponto específico que me pergunta, eu penso que é uma questão ultrapassada".

"A senhora secretária de Estado [da Agricultura] entendeu que havia razões políticas que justificavam o pedido de exoneração do cargo, pediu. Portanto esse é um juízo que só cada qual pode fazer", disse, referindo que cada governante pode fazer esse juízo "a qualquer momento: quando entra, durante o exercício".

Interrogado sobre como avalia a situação da ministra da Agricultura, o chefe de Estado deu a mesma resposta: "Essa matéria, é uma matéria ultrapassada, rigorosamente. A senhora secretária de Estado pediu a exoneração da função".

A oposição, como reagiu?

Da mesma forma que reagiu aos outros casos, entre a censura, os pedidos de esclarecimento e as promessas de chamar à Assembleia da República os envolvidos. Aqui, a reação mais radical, pelo menos em termos discursivos, pode ter sido mesmo a da deputada única do PAN.

Para Inês Sousa Real, “António Costa tem de pôr um ponto final e, se necessário, que deite abaixo o próprio Governo sem eleições antecipadas e crie um novo”. “O país não pode estar sujeito a esta deriva de um Governo perdido na sua própria maioria absoluta”, acrescentou.

Essa ideia, porém, não passa disso mesmo, já que nem Costa pretende mandar o seu governo abaixo, nem Marcelo quer ir pelo mesmo caminho.

“O Governo está coeso”, declarou Costa esta tarde. De acordo o líder do executivo, “até agora”, dentro da sua equipa governativa, “nenhuma das alterações ou remodelações teve a ver com coesão do Governo”.

“Tiveram a natureza mais diversa: Pessoas que infelizmente adoeceram; pessoas que tiveram problemas políticos, ou outras razões. Mas não há um problema de coesão e, por isso, como tenho e dito – e as pessoas têm constatado -, o essencial tem sido assegurado, a estabilidade das políticas” defendeu.

Já Marcelo deixou um aviso aos críticos: “não contem com a dissolução. Agora, é fundamental que o Governo governe e governe bem".”É melhor à partida não contarem. Contam comigo para ter o mesmo comportamento institucional que tive durante sete anos", atirou.

*com Lusa