A tempestade depois da tempestade e como um livro consola como um bom prato de sopa

Pedro Soares Botelho
Pedro Soares Botelho

Lá fora, a chuva continua. Ora miúda, ora bátega violenta, desaba sobre a calçada, escorrendo rua abaixo como se de rio se tratasse este caminho estreito. Ali para a foz, quer em Gaia, quer no Porto, a água continua a subir. As arcadas de Miragaia têm um metro de Douro debaixo.

Um pouco por todo o país o cenário de ontem mantém-se, com a depressão Elsa a fazer-se sentir. Há linhas de comboio cortadas, rios que galgam margens, estradas encerradas e ligações fluviais interrompidas. Temos estado a sistematizar todas estas informações no longo artigo, que pode ver aqui: Depressão Elsa continua a afetar todo o país. Cheias, queda de árvores e transportes afetados.

Entretanto, para o fim-de-semana, vem a caminho Fabien, outra tempestade. Esta, porém, não deverá ter no território continental tão grandes efeitos — o que não significa que se possa baixar a guarda.

Assim, à beira de um fim de semana, resta-me recomendar para uns dias amenos — em casa (isto, claro, apenas para aqueles que podem ter o luxo ficar em casa).

Ler

São Lázaro. É este o nome do jardim que se estica diante da fachada branca e cansada da velhinha Biblioteca Pública Municipal do Porto. Tem graça que aqui fique a biblioteca: o morto que tornou viver e o convento dos livros, que, embora não mortos, penam pelas estantes e os salões frios do granito nortenho.

Mas este penar é só a espera ansiosa por mãos que os folheiem. E há muitas mãos a folhear os livros nesta biblioteca: até 30 de novembro de 2019, 17.490 livros foram emprestados para um passeio a casa dos leitores portuenses. Consultados em sala, nos espaços da biblioteca, foram mais de 41 mil.

Estes números, que pedi esta semana e me foram solicitamente enviados pela divisão de bibliotecas da câmara do Porto, mostram, inclusive um crescimento desde 2017:

É interessante olhar para isto numa altura em que toda a gente anda metida na tecnologia. Afinal, as grandes bibliotecas de pedra ainda têm curiosos nos seus corredores.

Há imensos espaços como este por todo o país. As bibliotecas públicas estão disponíveis nos municípios para que se possa ler, aprender e conhecer — sem pagar. Bom, eu disse que não ia sugerir andar na rua — e não vou. Por isso, não sugiro uma visita às bibliotecas municipais por esse Portugal fora (a menos que o tempo o permita), mas, antes, às estantes aí de casa.

Um meu professor um dia procurou desmistificar a ideia de que ler um livro demora muito tempo. Pediu a uma aluna que lesse páginas de um livro: e cronometrou. Chegámos à conclusão de cada página leva pouco mais de um minuto a ser lida. Um livro de duzentas páginas ocupa uma meia tarde.

Assim, é pegar nesses livros que andam para aí a ser adiados desde a Feira do Livro de 2006, ou o dia dos namorados de 1999. Ou, mesmo, aqueles calhamaços grandes do Círculo de Leitores (quanto me fascinaram sempre os volumes imensos do Portugal Séc XX: Crónica em Imagens, do Joaquim Vieira…).

Desta vez, para quebrar a imagem pedante que, estou certo, por esta altura já hei de ter conseguido erguer, não sugiro títulos: é ler.

Oferecer

A segunda sugestão sai dos livros — mas pode na mesma ser feita em casa. Para ultimar as compras de Natal, uma sugestão que chega de Braga: oferecer arte.

A zet gallery criou vouchers de arte contemporânea, uma “opção segura com a garantia de que se oferece, em todos os momentos, o presente certo”. Estão disponíveis a partir dos vinte euros (embora a relação de obras sugeridas pela galeria comece nos 500 euros). Mas vale pelo menos a pena ver as obras da galeria bracarense, mais que não seja, para regalar os olhos.

Resta-me, então, esperar que depois da tempestade e da tempestade, possa vir a bonança. Eu sou o Pedro Soares Botelho e hoje o dia continuou molhado.

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