“Há um aumento do nível de combate, combate ativo” na área da central nuclear, disse Rafael Mariano Grossi numa entrevista à agência norte-americana AP.
Grossi, que deverá visitar a central pela segunda vez na quarta-feira, contou que as equipas da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) “relatam diariamente” combates com armamento pesado.
“Isto é praticamente constante”, afirmou.
Situada no sudeste da Ucrânia, a central de Zaporijia está sob ocupação russa desde as primeiras semanas da invasão do país, em 24 de fevereiro de 2022, embora continue a ser operada por técnicos ucranianos.
A região de Zaporijia também é uma das quatro que o Presidente russo, Vladimir Putin, integrou no território da Rússia no final de setembro do ano passado, juntamente com Kherson, Donetsk e Lugansk.
A Rússia já tinha anexado a península ucraniana da Crimeia em 2014.
Grossi há muito que pede a criação de uma zona de proteção em torno da central, que fica muito perto da linha da frente da guerra, mas sem sucesso até agora.
O restabelecimento da segurança na central, a maior da Europa, é um dos pontos do plano de paz proposto pelo Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, em novembro do ano passado.
A Ucrânia tem quatro centrais nucleares com um total de 15 reatores, seis dos quais em Zaporijia.
O diretor da AIEA reuniu-se com Zelensky na segunda-feira, na cidade de Zaporijia, e admitiu à AP que “muito provavelmente” viajará para Moscovo nos próximos dias.
“É uma zona de extrema volatilidade. Portanto, as negociações são, naturalmente, afetadas pelas operações militares em curso”, disse Grossi.
“Não caracterizaria o processo dos últimos meses como um processo que não tenha levado a qualquer progresso”, afirmou, numa nota positiva.
Grossi disse que tem mantido um diálogo profissional com as autoridades russas e ucranianas sobre um acordo, para garantir que não haja um “acidente radiológico, um acidente catastrófico grave, na Europa”.
Grossi admitiu a possibilidade de um acordo em breve, mas disse que para isso é necessário um compromisso político.
“E, neste caso, o que quero sublinhar é que o que eles estariam a concordar seria com a proteção da central. Não estariam de acordo um com o outro”, disse, referindo-se aos líderes dos dois países.
Grossi insistiu que o compromisso político que pretende de Zelensky e Putin é com a AIEA e com a segurança nuclear.
“Este é um elemento muito importante que, em minha opinião, deve ser tido em consideração”, declarou.
Grossi disse que o facto de se tratar de uma negociação específica para evitar um desastre nuclear, e não um cessar-fogo mais alargado, “deve tornar um acordo possível”.
“Vejo um aumento do nível de perigo. Acho que o princípio aqui é evitar um acidente, e a possibilidade de acontecer está a aumentar. Isso é uma questão de facto”, alertou.
A AIEA, com sede na capital da Áustria, Viena, tem uma equipa rotativa em permanência na central de Zaporijia.
A central recebe a eletricidade de que necessita para evitar a fusão dos reatores, que estão parados, através de uma rede elétrica ainda em funcionamento.
Mas, em 13 meses de guerra, os funcionários da central tiveram de recorrer aos geradores de emergência em seis ocasiões para alimentar os sistemas de refrigeração essenciais dos reatores.
Quando as fontes de alimentação de emergência forem necessárias novamente, a situação é “absolutamente imprevisível”, disse Grossi.
“E se nos basearmos no que temos visto, isso vai acontecer novamente”, alertou, aludindo aos combates perto da central.
Analistas militares esperam que os combates aumentem à medida que a primavera avança e o terreno, agora lamacento, permita o envio de armamento pesado para a linha da frente.
“Fala-se em ofensivas, contraofensivas”, disse Grossi.
“A concentração de tropas, a concentração de equipamento militar, de armamento pesado tem crescido exponencialmente na zona próxima da central, o que, naturalmente, nos faz crer que a possibilidade de um acidente, de um novo ataque (…) poderá aumentar”, insistiu.
Grossi salientou que o acordo “visa evitar um acidente nuclear” num país em que ocorreu a pior catástrofe do género, em 1986, na central de Chernobyl.
“Não é para criar qualquer situação que possa ter uma vantagem ou desvantagem militar ou uma legitimação da situação”, acrescentou.
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