Naquela que foi uma edição totalmente virtual da Web Summit, a programação incidiu em várias conferências cujos protagonistas foram aqueles que este ano nos habituámos a ver atuar quase unicamente no pequeno ecrã: os jogadores de futebol. Tal como este evento — cimeira de tecnologia e inovação empresarial que, não fossem as condições extraordinárias proporcionadas pela pandemia da Covid-19, teria decorrido no Parque das Nações, em Lisboa — também os estádios têm estado interditados ao grande público.

A ausência dos adeptos nos estádios ao longo de 2020 foi um tónico que serviu de lamento ao longo de várias conversas. Não é só de paixão que se trata - em causa está também a sustentabilidade da indústria desportiva num cenários de fortes quebras de rendimentos por ausência das receitas de bilheteira, entre outros fatores. Foquemo-nos, porém, nos protagonistas, os futebolistas, ouvindo o que alguns partilharam sobre aquilo que é a realidade do jogador moderno.

Diogo Jota foi campeão no ePremier League Invitational

Um dos convidados em destaque foi Diogo Jota, extremo português de 24 anos que teve uma ascensão meteórica nos últimos cinco anos até tomar o desporto de assalto com as suas prestações goleadoras desde que assinou pelo Liverpool. Numa conversa com James Pearce, do portal britânico ‘The Athletic’, e Nuno Moura, diretor de marketing da Federação Portuguesa de Futebol, o futebolista traçou o seu percurso desde os tempos em que jogava casualmente até ter contrato com um dos maiores clubes do mundo.

“Até ter 16 anos, jogava apenas para me divertir, até paguei para jogar. Hoje em dia, os miúdos de 14 ou 15 anos já têm contratos profissionais, o que é uma coisa boa, mas no meu caso não. Eu tive a sorte de jogar numa equipa [Gondomar] que foi uma família para mim, jogámos 9 ou 10 anos juntos e atingimos coisas boas àquele nível. Apesar de ter treinado em alguns clubes maiores, nunca fiquei. São pequenas desilusões, claro, porque o objetivo é sempre o topo, mas no final correu tudo bem. O segredo é nunca desistir”, lembrou.

Diogo Jota

Essa perseverança, contou o jogador, foi a chave do sucesso que hoje tem, não baixando a cabeça depois da experiência falhada no Atlético de Madrid, clube com o qual assinou em 2016 mas cuja camisola nunca chegou a vestir em jogos oficiais, sendo sucessivamente emprestado a outros emblemas até ser vendido ao Wolverhampton Wolves. “Mesmo quando as coisas não correm como esperado, podemos sempre aprender com as experiências e com o que vivemos. Eu não me arrependo”, disse.

Tendo assinado este ano pelo Liverpool, Jota tem impressionado ao contar já com nove golos em 15 jogos, muitos deles a sair do banco para ser decisivo. Mais do que demonstrar talento, o segredo foi, afirma, manter uma certa humildade. “Quando chegas a um novo clube, ter uma mente aberta é a chave para te adaptares o mais rápido possível. Como a temporada já estava em andamento, cabia-me encontrar uma forma de entrar na equipa e não o contrário, provando ao treinador que podia ser importante em campo”, explicou.

Mas o futebol não tem sido o seu único foco - ou pelo menos não apenas aquele que é jogado dentro de campo. Aficionado por esports — jogos de vídeo — Jota deu cartas em abril ao vencer o ePremier League Invitational, torneio dos jogos FIFA disputado por futebolistas do escalão principal do futebol inglês. “No mundo dos desportos eletrónicos, sinto que posso ter três coisas juntas: a minha paixão pelo futebol, a competição de jogar contra outras pessoas e também a gestão de equipas”, explicou.

Esse hobby, porém, começou a desenvolver-se mais seriamente durante a pandemia, chegando a ser encarado como uma futura atividade profissional. “Comecei a procurar por jogadores de esports profissionais e eu próprio comecei a jogar melhor, porque aprendi com eles, o que me levou a pensar: 'porque é que não me envolvo?'” revelou, deixando antever um investimento futuro na área.

Para "tirar a cabeça do futebol", Eric Dier lançou uma rede social

Quem também se encontra com um projeto paralelo à vida nos relvados é Eric Dier, jogador britânico formado no Sporting CP e que veste atualmente a camisola do Tottenham Hotspurs, clube comandado por José Mourinho. Em conjunto com o irmão, Patrick, e outra co-fundadora, Zoe, o atleta tem investido no Spotlas, uma rede social na qual trabalha há dois anos, tendo como objetivo que os seus utilizadores recomendem locais entre si — de cafés a praias ou hotéis — para fruição.

O jogador desdobrou-se em várias iniciativas nesta Web Summit, apresentando o projeto ao lado de Patrick, mas também respondendo a solo numa sessão de perguntas e respostas chamada “Um dia na vida de um futebolista profissional”. Foi assim que, por exemplo, aproveitou para desmistificar a ideia de que é apenas uma cara famosa associada ao Spotlas e que não está de facto envolvido no projeto.

As pessoas estão completamente erradas, é algo em que estou investido desde o início, tanto o meu tempo como o meu esforço”, defendeu. Dier adiantou também que, apesar do seu calendário enquanto jogador, tenta encontrar-se com a restante equipa pelo menos uma vez por semana para discutir ideias para o projeto e que ter uma atividade paralela não só o ajuda a ter um escape — “tirar a cabeça do futebol”, como disse —, como permite-lhe sair da zona de conforto, ainda que essa gestão possa ser complicada.

A sua vida a jogar ao mais alto nível, de resto, foi um tema que abordou durante as sessões, explicando que a sua rotina “depende de dia para dia”, consoante haja, por exemplo, jogos europeus durante a semana. “Um dia típico passa por acordar e ir treinar às 9 da manhã, tomar as refeições lá — pequeno almoço e almoço — e depois do treino fazer o trabalho individual que seja necessário. Depois da hora de almoço, regresso a casa”, contou, admitindo que, apesar da exigência que enfrenta nas suas funções, não tem um "dia completo de trabalho como é para muitas pessoas”.

Eric Dier

É com esse tempo livre que se tem dedicado à sua startup, tendo também a noção de que, ao fazê-lo, está a “criar agora as bases” para uma vida após se reformar enquanto jogador, dado o cariz efémero que tem a carreira de um futebolista, sendo o primeiro a admitir que será ainda muito jovem quando tal acontecer.

“Para mim é muito importante dar tudo o que tenho ao futebol e certificar-me de que não tenho arrependimentos quando a minha carreira terminar. O Spotlas é a primeira iniciativa fora do futebol em que me envolvi e é algo de que gostei muito de criar. Eu quero fazer mais coisas enquanto ainda jogo e depois levá-las para depois do futebol”, contou durante a sessão de perguntas e respostas, não fechando a porta, porém, a uma carreira ligada ao futebol mesmo depois da reforma.

A noção de que há mais vida para além do futebol não lhe é exclusiva — Dier, aliás, revelou que não é o único empreendedor no balneário do Tottenham, não querendo, todavia, divulgar a identidade dos colegas —, mas o atleta salientou um aspeto importante que, diz, “não é mencionado o suficiente” e não tem tido a atenção devida por parte dos responsáveis da indústria: a necessidade de preparar jogadores que não consigam singrar ao mais alto nível para uma atividade paralela.

Algo que prezo muito no Sporting é o foco que eles tiveram na nossa formação quando eu estava na Academia [de Alcochete], foram extremamente exigentes com a nossa educação e o nosso comportamento na escola. Isso é muito importante para aqueles que não se safam, ter a certeza que eles não abandonam os estudos. Esse é o meu conselho, que se dê a atenção merecida à educação, porque é possível estudar e jogar ao mesmo tempo”, apontou.

Para além disso, a seu ver, é importante os jogadores terem boas bases e apoio e serem “honestos consigo mesmos” — o que, adianta, é muito difícil quando se estão a lançar na sua carreira, dada a sua tenra idade — e “serem capazes de reconhecer na altura certa que este pode não ser o seu futuro”.

Esta questão, aliás, foi também abordada por Nuno Moura, diretor de marketing da FPF, na sua conversa com Diogo Jota. "Apenas 2% dos futebolistas atingem muito sucesso. Por cada um que atinge o topo, temos centenas que não vão chegar ao mesmo nível e talvez não possam sequer jogar profissionalmente e viver do desporto”, alertou o responsável. Por isso mesmo, advogou pela “criação de “condições que permitam aos futebolistas fazerem o que amam e, mesmo que não atinjam o topo, terem ferramentas e conhecimento no seu percurso que lhes permita encontrar outros trabalhos e atividades na vida", citando a iniciativa Portugal Football School como exemplo.

Banhos gelados, sorte e sabedoria: a combinação para uma carreira longa

Planear a vida para lá dos relvados é um assunto que, mais tarde ou mais cedo, a todos toca, mas, para vários atletas, o foco está ainda assim em manter a forma para prolongar a carreira tanto quanto possível, desde que mantendo um certo nível de performance. 

Um desses atletas é Pepe, central luso-brasileiro que, aos 37 anos, não só renovou com o FC Porto por mais dois anos, como mantém-se a pedra e cal como esteio da defesa da seleção nacional. O segredo para uma carreira tão longa e tão recheada — nos 10 anos em que esteve no Real Madrid, venceu três Ligas dos Campeões e três campeonatos espanhóis, para além dos títulos obtidos nas suas duas passagens pelos dragões — é simples, mas nem por isso fácil de concretizar.

"Tive a sorte de trabalhar sempre com pessoas inovadoras. Também fui sempre curioso ao ponto de perguntar aos meus treinadores e aos meus companheiros como poderia evoluir e como é que a tecnologia me poderia ajudar também. Procurei sempre saber o que poderia melhorar depois de um jogo, até para saber como recuperar para a partida seguinte", disse ao jornalista Sílvio Vieira, da Rádio Renascença.

Pepe

Essa curiosidade, juntamente com o nível de exigência que foi subindo desde que se mudou do Marítimo para o FC Porto e deste clube para o Real Madrid, levou-o a ter os maiores cuidados possíveis com a sua capacidade física, tal como demonstrou num exemplo que protagonizou com Cristiano Ronaldo quando ambos jogavam pelos merengues.

"Eu e o Cristiano chegávamos às 02:00 e fazíamos água fria para recuperarmos para o jogo seguinte. Tínhamos essa rotina para permitir a recuperação. Hoje já não é tanto a água fria, mas as máquinas de frio que ajudam à nossa recuperação. Se antigamente o preparador físico era o mau da fita, porque nos punha em corridas contínuas, hoje já é o maior aliado para estarmos bem no jogo, que é o que o jogador atual quer".

Ao trabalho de preparação física, de recuperação e de suplementação, deve juntar-se uma vontade férrea de continuar, o que, no seu caso, se soma ao facto de ser o capitão da equipa comandada por Sérgio Conceição. “Tento passar aos meus companheiros a importância de se trabalhar e de se ter rigor e paixão em cada exercício que fazemos - é assim que cheguei aqui hoje", destaca o central luso-brasileiro.

Ricardo Quaresma: "Posso dizer que houve coisas que, se fosse hoje, não faria, se calhar decidia de outra maneira"

Outro exemplo de longevidade é o de Ricardo Quaresma, que, tendo também 37 anos, regressou este ano a Portugal para jogar no Vitória de Guimarães. Para ele, ter uma carreira longa é fruto de alguma sorte com lesões. “Sou uma pessoa que, graças a Deus, não tive grandes lesões na minha vida. Vejo muitos colegas meus, grandes profissionais, todos os dias no ginásio, que parece que as lesões os perseguem. Tal nunca me aconteceu”, confessou à jornalista Patrícia Matos.

Essa sorte, todavia, procura-se também, através de boa alimentação, descanso e rejeitando vícios. Admitindo que, quando era mais novo, tinha descuidos na forma como comia, apercebeu-se que tinha de mudar. “Para estar 20 anos ao mais alto nível, tens de cortar muita coisa", frisa.

Ao longo dessas duas décadas, sublinha o extremo formado no Sporting, todas as decisões que tomou — das passagens frustradas pelo Barcelona e Inter de Milão às renascenças de carreira no FC Porto e Besiktas — partiram da sua vontade. "Nem sempre correu bem, mas sempre fui pela minha cabeça. Posso dizer que houve coisas que, se fosse hoje, não faria, se calhar decidia de outra maneira", adianta.

Ricardo Quaresma

Uma dessa decisões foi a ida, aos 29 anos, para o Al-Ahli, clube situado no Dubai. "Uma das coisas que me deu muita força foi quando caí no Dubai. Quando fui, ainda era muito novo, foi das maiores asneiras que cometi ao longo da minha carreira. Porque o campeonato lá não tem nada a ver com europeu. É algo mais para fim de carreira, porque não é tão exigente nem competitivo. Na minha ida para lá, comecei a perceber que as pessoas me estavam a esquecer, Muita gente dizia que eu estava acabado, a ficar gordo, que já não era o mesmo”, desabafou o jogador.

Querendo evitar um fim de carreira precoce, Quaresma diz ter percebido “que o dinheiro não era tudo” e voltou à Europa. “Tenho muito a agradecer ao presidente Pinto da Costa, por me abrir de novo as portas do FC Porto. Foi o maior teste que tive para mim mesmo, para eu mostrar que estava bem vivo", vincou, considerando mesmo o “ponto mais alto” do seu percurso.

Tal como outros atletas já mencionados, também o jogador português prevê ocupar-se numa vida pós-futebol, sendo que isso, para já, passa pela criação de uma fundação em nome próprio, sem, no entanto, dizer qual o fim a que se destina. O papel de ação social a que se propõe, porém, não é novo para quem tem acompanhado o atleta, que, sendo de origem cigana, tem-se insurgido contra a discriminação demonstrada contra a sua etnia.

"Não tinha [a noção do papel social que tinha], mas depois de responder à pessoa que toda a gente sabe [uma alusão ao deputado do Chega, André Ventura], aí percebi que tinha muita gente do meu lado e que felizmente ainda há muita gente boa neste mundo. Enquanto poder defender esse tipo de causas, estarei sempre aqui. Todos somos iguais e merecemos ser tratados da mesma maneira, independentemente da cor ou do dinheiro. Ninguém tem o direito de olhar para ti e criticar-te por seres negro, por seres branco, por seres cigano", disse. "Vou lutar pela igualdade, sempre que puder", prometeu.

Figuras do passado a zelar pelo futuro

A faceta política de Quaresma não é caso isolado. Marcus Rashford, jovem prodígio do Manchester United, é um exemplo firmado de um jogador de futebol que se torna um agente de mudança. E há uma lenda do futebol brasileiro que concorda com tudo isto.

Vencedor do Campeonato do Mundo pelo Brasil em 2002 e parte da equipa dos “Invencíveis” do Arsenal que conquistou a Premier League de 2003/04, Gilberto Silva é hoje um agente desportivo que se dedica a vários projetos e não teve papas na língua quanto ao papel dos jogadores. 

“Eu acredito que os jogadores devem falar sobre política porque fazem parte da sociedade, não sei porque é que algumas pessoas discordam disso. Se te posicionares de uma forma em que sabes o que dizer e o que fazer, se perceberes o contexto do ambiente onde vais falar e o que vais dizer, não vejo problemas. A questão é que se considera que os jogadores não podem falar sobre futebol, política e religião. Eu acho que é preciso falar destas coisas, mas de forma respeitosa e sendo racional para acrescentar à discussão", comentou.

Gilberto Silva

A nota foi proferida a propósito de uma conversa sobre as formas de interação entre adeptos e jogadores, com Rob Harris, jornalista da Associated Press, e Tim Chase, fundador da startup TruChallenge, uma rede social onde atletas e outras personalidades podem dar a cara por desafios para promover o envolvimento com os fãs, com a qual Gilberto Silva tem colaborado.

Parte de uma era onde o contacto era feito através de autógrafos, encontros e postais personalidades, o ex-futebolista acredita que as redes sociais vieram aproximar fãs e futebolistas. “Acredito que eles se sentem muito reconhecidos por às vezes terem uma resposta rápida ou um like, uma mensagem, é uma boa forma de comunicação. Os jogadores podem ter as suas plataformas para interagir com os seus fãs sem intermediários como os jornais ou a televisão”, indica.

Há, porém, um lado perverso nesta nova relação e queafetou um jogador que Gilberto Silva representa desde 2017, ano em que, ele próprio, decidiu tornar-se um agente depois de uma experiência falhada como diretor desportivo. Fred, médio brasileiro que alinhava pelos ucranianos do Shakhtar Donetsk, foi com a sua ajuda para o Manchester United. “Fui muito honesto com ele: disse-lhe que nunca tinha feito isto mas que iria fazer tudo para ajudá-lo”, conta o lendário jogador.

A chegada à Inglaterra, porém, foi turbulenta, Fred teve dificuldades de adaptação quando ao estilo de jogo, à língua e ao facto de estar prestes a ser pai. Foi aí que entrou a TruChallenge, já que foi criado um desafio para os fãs que se tornou viral e que criou uma narrativa de superação que beneficiou bastante a imagem do futebolista, o que, em conjunto com o aconselhamento próximo do seu agente, o ajudou a subir de rendimento.

“Os jogadores têm consciência do que estão a fazer, mas não podem focar-se nos comentários negativos, porque uma pessoa gosta de ti e outra não. Esse não é o problema. O problema é quando tu não correspondes num clube, quando não trabalhas no duro para ajudar a equipa. Os jogadores devem usar estes comentários dos adeptos e dos media para trabalharem mais e para melhorar a sua performance. É a melhor resposta a quem te critica”, garante Gilberto Silva.

Ser tanto um agente como um mentor é algo que dá alento ao campeão do mundo, que também é embaixador pela The Street League, organização de caridade que organiza jogos para criar fundos para pessoas sem-abrigo, refugiados e requerentes de asilo. “O que é importante para mim é que ainda me mantenho ligado ao futebol, a ajudar jovens talentos a tornarem-se jogadores, mas também a pensar nas suas próprias vidas, especialmente para fazerem melhor do que eu fiz”, finalizou.

Um inglês, um espanhol e um búlgaro e uma ideia de negócio

Aconselhar jogadores a tomar as melhores decisões possíveis, especialmente para acautelar o seu futuro é também o que motivou um inglês, um espanhol e um búlgaro a formarem uma empresa. Não, não é o início de uma anedota; pelo contrário, as motivações de Emile Heskey, Gaizka Mendieta e Stiliyan Petrov para formar a Player 4 Player são bem sérias.

Um pouco à semelhança do que tem feito o francês Louis Saha com o seu projeto AxisStars, estes três antigos futebolistas olharam para o panorama futebolístico após conhecerem-se a propósito de um mestrado executivo para ex-jogadores e notaram a falta de um serviço de consultoria para atletas no ativo.

“Estávamos a falar dos nossos altos e baixos, dos nossos desafios, de como lidámos com a transição, como vamos continuar, qual vai ser o nosso próximo passo. Quanto mais falámos com as pessoas da indústria, mais nos apercebemos que este tipo de serviços são necessários”, explicou Petrov, numa conversa direcionada por Pedro Pinto, jornalista e fundador da Empower Sports.

Lançada em outubro desde ano, a Player 4 Player pretende “ajudar jogadores a ter um futuro melhor e mais sustentável”, diz o búlgaro, e para ”trabalhar na atual indústria com jogadores no ativo e já reformados, para guiá-los e providenciar-lhes serviços de confiança: educação, finanças, negócios, media”, completa Heskey.

A necessidade de ter um serviço assim, indica Mendieta, é que nem todos os jogadores têm projetos de futuro como o acima mencionado por Eric Dier. “Não há uma empresa ou um grupo de pessoas a dar aos jogadores esta paz de alma, no sentido de que te podes focar no teu jogo, porque é o que fazes enquanto jogas, enquanto há alguém da Player 4 Player que te está a guiar e a dar conselhos, principalmente fora dos relvados”, justifica o espanhol.

O problema é agravado pelo facto de muitos jogadores não saberem “o que é que implica ter uma segunda carreira”, sendo que alguns “já começaram a ter alguma preparação e aconselhamento, mas não têm mesmo noção”, diz Mendieta. A isso soma-se uma perceção pública errada daquilo que é a vida de um jogador. “Quando as pessoas pensam em futebolistas, pensam no Messi e no Ronaldo a fazer dezenas de milhões de euros, mas a maioria não chega aí. Fazem bom dinheiro, têm um bom salário, mas esse dinheiro não lhes chega para toda a vida. A Player 4 Player é para todos os jogadores neste espetro, que possam precisar de aconselhamento profissional na indústria”, continua.

Outro dos problemas, sugere Petrov, passa também por uma certa miopia que existe no que toca a planos de carreira para jogadores reformados, afunilando as suas escolhas para um conjunto diminuto de cargos. “A maioria de nós seguiu o mesmo caminho. Antes de nos reformarmos, agentes, conselheiros financeiros disseram ’não te preocupes, faz os teus cursos, vais ser treinador ou fazer trabalhos nos media’, mas isso está congestionado, toda a gente está a fazer o mesmo. Descobrimos que a maioria dos jogadores está a procurar seguir o mesmo caminho. Ninguém está a procurar educar-se e procurar seguir rumos diferentes, o que é um dos maiores problemas do futebol neste momento”, adverte.

De momento, a Player 4 Player já está a ter “contactos muito interessantes” com jogadores da Premier League, garante Petrov, adiantando que a indústria recebeu este projeto com “satisfação e entusiasmo”. “Satisfação porque a indústria viu diferentes oportunidades, ideias novas, e entusiasmo da parte dos jogadores porque vêem assim diferentes caminhos e oportunidades, não apenas no futebol, mas até em vários cargos executivos”, aponta o búlgaro.

No final da conversa, os três antigos jogadores deixaram todos conselhos aos jogadores de futebol ainda no ativo. Heskey destacou a educação. “Isso foi o que me ajudou a avançar. No futebol há muito tempo disponível para que uma pessoa se dedique à sua formação”, realçou. Já Mendieta disse ser importante “saber com quem se relacionam, para que se possam focar no jogo”. Salientando que, às vezes, a própria família em que os jogadores se refugiam não é de confiança “porque não têm o conhecimento para fazer as coisas da forma certa para assegurar o futuro”, o espanhol apontou para a necessidade de criar uma boa estrutura, “arranjar alguém para administrar as suas finanças de forma mais profissional, o que resulta numa carreira mais longa e uma boa preparação para o futuro”.

Petrov, por fim, optou por um conselho mais filosófico, dizendo aos futebolistas para serem “a pessoa que não vai estar a falar sobre o que já atingiu, mas sobre o que ainda quer atingir”. “Ninguém quer ouvir aquilo que já conseguimos fazer, a questão é o que estamos a fazer de momento”, rematou.