Os loucos, os caretos e os outros

Pedro Soares Botelho
Pedro Soares Botelho

Que é da loucura? O que distingue um louco de um são? No Rio de Janeiro, Brasil, os portões do Instituto Municipal Nise da Silveira abrem-se para o desfile do bloco Loucura Suburbana, uma colorida celebração de diversidade e inclusão que reúne há 20 anos centenas de foliões, familiares, profissionais e utilizadores de serviços de saúde mental no Engenho de Dentro (zona norte).

No meio daquela folia, é impossível identificar 'loucos' e 'sãos' entre os reunidos no antigo hospital psiquiátrico. "Quem é louco e quem não é na nossa sociedade? No carnaval todos colocam sua loucura para fora", contou à AFP Adriana Carvalho Lopes, numa reportagem que aqui no SAPO24 reproduzimos.

Deste lado do oceano, lá para terras de Bragança, este está a ser o primeiro Carnaval de Podence, depois da classificação da UNESCO. Começou hoje com poucos Facanitos, como poucos são os habitantes da aldeia transmontana que resistiu a outros carnavais, e elevou a Património da Humanidade a ancestral tradição dos caretos.

Com queixas de falta de apoio das entidades locais, a associação do Grupo de Caretos de Podence deu início ao Entrudo Chocalheiro de 2020 com a novidade do desfile dos pequenos Caretos, os mais novos, os Facanitos, que serão o garante da tradição, elevada a Património Imaterial da Humanidade, em dezembro de 2019. É mais uma reportagem, com texto de Helena Fidalgo e fotografias de José Coelho, da agência Lusa, que pode ler aqui no SAPO24.

E porque é de memórias que falamos, andemos para a Póvoa de Varzim. Foi lá, a propósito do Correntes D’Escritas, que Ana Leiria falou com Juan Gabriel Vásquez. O escritor colombiano fala-nos da ideia de usar “o romance como uma ferramenta de exploração da nossa realidade”. E fá-lo, escrutinando o passado para destrinçar o presente.

É por isso que na obra do escritor o grande protagonista é recorrentemente a “memória”, uma “obsessão” explicada com a necessidade de alcançar o passado, um “território oculto” ao qual só se consegue chegar através das histórias que se contam, e “para contar histórias há que recordar”.

“Se deixarmos de recordar um episódio, esse episódio desaparece e é isso que fazem as histórias oficiais dos países: obrigar a recordar umas coisas e obrigar a esquecer outras, e assim se vai montando a história sobre as nossas sociedades, que é interessada e distorcida e mentirosa”.

Não é por acaso que sublinho a memória. Afinal, Marcelo Rebelo de Sousa decidiu hoje mesmo homenageá-la. Ou melhor, distinguir uma caixa de memórias que José Pacheco Pereira tem vindo a arrumar na margem sul do Tejo.

Falo da Ephemera, a quem o presidente da República atribuiu hoje as insígnias de membro honorário da ordem de Mérito. Na opinião de Marcelo, a Ephemera é "o retrato de José Pacheco Pereira" de "sensibilidade cívica, no espírito de liberdade, na independência crítica".

Pacheco Pereira "gosta de ter mais informação e gosta de divulgar a informação e gosta de partilhar e gosta de recolher e gosta de ter muitos amigos", acrescentou. "Isso é uma riqueza enorme num país que não tem, muitas vezes, olhado nem para a memória suficientemente, nem para a memória do ponto de vista cívico e social", frisou o chefe de Estado, argumentando que "olha-se para a memória oficial, olha-se para a memória estática, rígida, mas sem envolver todos e todas naquilo que é razão de ser da Ephemera".

Aqui entre o Entrudo e a memória, despeço-me a olhar para trás (ainda que trauteando as canções do Festival que arranca hoje na RTP).

Até amanhã. Eu sou o Pedro Soares Botelho e hoje o dia foi assim.

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