Recordes que podem levar à recolha que ninguém quer

Abílio dos Reis
Abílio dos Reis

Há três dias consecutivos que Portugal conta com mais de 2.000 casos de infeção do novo coronavírus. E para aquela parte da população que está munida de aplicações móveis de notícias nos seus dispositivos tecnológicos, o fado das notificações que chovem por volta da hora do almoço, altura em que por norma é revelado o boletim epidemiológico das últimas 24 horas, tem sido repetitivo no que ao título concerne: "registado novo recorde". Assim é desde quarta-feira. O recorde começou com 2.072 infeções, subiu para as 2.101 no dia seguinte, até chegarmos ao atual recorde com os 2.608 casos de hoje. Três dias, três recordes. Que ninguém quer.

Só que do boletim desta sexta-feira há que ressalvar duas coisas além do número máximo de infeções: o de internamentos (1.015) e de mortes (21). É que para encontrar um número semelhante de óbitos, é preciso recuar ao pico da epidemia, em finais de abril, mais concretamente no dia 28, em que morreram 25 pessoas. A nível dos internamentos, a barreira dos mil foi ultrapassada. Os números ainda não estão perto do pico alcançado em abril, mas não deixa de ser um indicador a ter em conta.

Ora, mas serão os recordes exclusivos de Portugal? Não, de todo. Os recordes estão a verificar-se um pouco por toda a Europa. A título de exemplo, aconteceu o mesmo em França, onde já existem cidades que se encontram com recolher obrigatório devido à pressão que os hospitais estão a sofrer com o aumento de doentes. Hoje o número baixou, mas ontem Ministério da Saúde francês reportou 30.621 casos de infeção, um novo máximo. Mas o mesmo se verifica na Alemanha, Rússia e República Checa — este último tido como um dos exemplos a seguir no combate à pandemia há uns meses. Na Bélgica, a situação levou mesmo a que o primeiro-ministro Alexander de Croo decretasse hoje o recolher obrigatório em todo o território.

Assim, não se pode dizer que as palavras desta tarde de Marcelo Rebelo de Sousa surpreendam. Em Aljezur, durante uma visita ao Algarve, o Chefe de Estado enfatizou que há uma "linha vermelha" que não se pode ver cruzada e que pode atirar o país para novo Estado de Emergência. Ou seja, no dia em que o número de mortos atingir a casa das dezenas por dia de forma consecutiva, Portugal pode voltar atrás no tempo e medidas semelhantes às aplicadas na Bélgica e França poderão vir a ser aplicadas.

"Se o número de mortos disparar para várias dezenas por dia, aí teremos um problema grave que atravessa toda a sociedade portuguesa e nós queremos evitar que isso aconteça", assegurou, antes de alongar que "as pessoas têm de pensar que se isto arranca num galope, se há um agravamento brutal da situação, que não desejamos e esperamos que não aconteça, se isso acontecer, o que tiver de ser decidido será decidido em graus progressivos de intervenção".

Depois explicou o que realmente está em causa, lembrando que Portugal esteve no pico da epidemia num "grau muito elevado, que não foi o mais elevado porque não houve confinamento obrigatório, mas voluntário". Por outras palavras, caso seja decretado o Estado de Emergência, o Presidente da República recorda que há condições para o "confinamento total". E isso ninguém quer. Não querem os portugueses e não querem os governantes. Marcelo já tinha alertado que o Natal não pode ser igual aos de sempre. Mas hoje parece ter elevado o tom e deixou claro que se a situação piorar o recolher obrigatório e o aumento das restrições podem ser uma realidade.

"O que nós queremos é evitar que se chegue a um ponto desses", vincou Marcelo, aludindo ao facto de certos países terem implementado "o recolher obrigatório, o parar da actividade económica, nomeadamente comercial e de serviços". António Costa já salientou várias vezes no passado que o país não aguenta um novo confinamento, muito menos um que pare o país inteiro. Hoje, o Presidente acrescentou a esta suposição que avançar com tais restrições de movimentos na vida das pessoas é algo que "todos querem evitar, porque tem consequências na vida das pessoas, consequências psicológicas, económicas, sociais".

O alerta do Chefe de Estado está dado e António Costa, em Bruxelas, salientou igualmente que podemos voltar ao Estado de Emergência (e disse também que ninguém "vai andar a fazer revistas e operações STOP a ver se tem ou não tem a aplicação StayAway Covid"). Portanto, se se confirmarem as previsões de certos modelos matemáticos que prevêem um ascendente até aos 3.000 casos de infeção da covid-19 nos próximos dias, como salientado pela ministra da Saúde durante a semana, parece que o único galope que os portugueses irão dar será até casa se a situação não mudar e se se continuar a desvalorizar os avisos.

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