Em véspera de apresentar o Orçamento, o Governo alivia a pressão da inflação

António Moura dos Santos
António Moura dos Santos

A proposta do governo de Orçamento do Estado para 2022 vai ser entregue na Assembleia da República na quarta-feira, mas começou a ser apresentada aos líderes dos partidos logo no início da semana.

Se a direita considerou que a proposta do executivo traz “austeridade encapotada”, como lhe chamou o PSD, a esquerda lamentou que o Governo mantivesse o foco no controlo do défice em vez do incremento dos apoios, traduzindo-se a inflação no “corte do poder de compra”. De todos os partidos, apenas o Livre deixou um vislumbre de esperança, ao adiantar que vai apresentar algumas propostas de alteração ao OE2022 e que foi dito que “haveria abertura” para tal.

Já da parte do PS, o líder parlamentar Eurico Brilhante Dias afirmou que o Governo vai proteger os rendimentos dos cidadãos por via de uma estratégia de controlo de preços e não através de medidas que poderiam contribuir para uma espiral inflacionista. "Protegendo os preços, estamos a proteger o rendimento das famílias”, frisou.

Certo é que, ainda antes do OE dominar as atenções até ao fim da semana, o Governo fez já saber hoje as medidas de emergência que vai implementar para conter os aumentos de preços dos bens energéticos e agro-alimentares fruto da inflação crescente.

Com Mariana Vieira da Silva ao leme da apresentação, quatro ministérios foram convocados para apresentar as medidas. O objetivo, anunciou o governo, é dar uma "resposta focada e dirigida, evitando a propagação das pressões inflacionistas e protegendo, assim, as empresas e as famílias". Para o executivo, trata-se de "um pacote de medidas extraordinárias de resposta imediata para conter os impactos sociais e económicos da guerra" na Ucrânia.

São estas as alterações:

Medidas nas Finanças

  • Redução do ISP no equivalente à redução da taxa do IVA para 13%, eliminando-se, para o efeito, os atuais limites mínimos de tributação em ISP;
  • Tal significa assim o fim do Autovoucher em maio;
  • Alargamento do regime de flexibilização de obrigações fiscais no primeiro semestre de 2022, para empresas de setores particularmente afetados pelo aumento dos preços da energia (e.g., agricultura, pescas e setor social e solidário);
  • Implementação de obrigação sobre a ERSE de publicação de relatório trimestral detalhado relativo à formação dos preços de venda ao público dos combustíveis.
  • Alargamento do apoio ao cabaz alimentar, de 60 euros mensais, a todas as famílias titulares de prestações sociais, face ao atual regime que abrangia apenas as que tinham tarifa social de eletricidade.
  • Alargamento das medidas de apoio à aquisição de botija de gás, no valor de dez euros, a todas as famílias titulares de prestações sociais mínimas.

Medidas na Economia e Mar

  • Programa Apoiar Indústrias Intensivas em Gás, com apoio a fundo perdido que cubra 30% da diferença entre os custos incorridos em 2021 e os incorridos em 2022, até um limite de 400 mil euros para cada empresa;
  • O ministro da Economia e do Mar afirmou hoje que o imposto sobre os lucros extraordinários das empresas não foi discutido no Conselho de Ministros, mas admitiu que o Governo está estudar "todas as possibilidades". "Estamos a radiografar completamente todos os setores da atividade e, se houver lugar à existência de lucros inesperados e que são aleatórios, estaremos atentos, porque o Estado não tem recursos infinitos", declarou Costa Silva.
  • Na sexta-feira, no parlamento, o governante admitiu que o Governo iria "falar" com as empresas e "provavelmente considerar um imposto, um ‘windfall tax’ [taxa de imposto sobre lucros que resultam de ganhos inesperados de empresas ou setores específicos], para os lucros aleatórios e inesperados que estão a ter. O ministro da Economia explicou hoje que o 'windfall tax' foi uma das hipóteses avançadas pela Comissão Europeia e que Portugal tem essa medida como "uma solução única, caso venha a ser necessária".

Medidas no Ambiente e Ação Climática

  • Adequação do regime de avaliação de impacto ambiental nas situações de avaliação caso a caso, quando estejam em causa projetos de centros eletroprodutores  de fontes de energia renováveis que não sejam localizados em áreas sensíveis;
  • Adequação dos regimes de de avaliação de impacto ambiental e de prevenção e controlo integradas da poluição para a análise e decisão dos projetos de produção de hidrogénio por eletrólise da água cujo processo produtivo seja isento de perigosidade e de poluição.

Medidas na Agricultura e Alimentação

  • Reserva de crises: 9,1 milhões de euros para suinicultura e produção de ovos e aves, mais 18,2 milhões de euros para mitigar custos acrescidos de alimentação animal e fertilizantes;
  • Redução do ISP para o gasóleo colorido e marcado agrícola — redução em 3,432 cêntimos/litro até final de dezembro;
  • Flexibilização de pagamentos fiscais e de contribuições para a segurança social;
  • Compensação excecional destinada aos titulares de licença de pesca para compensar o acréscimo de custos de produção;
  • Isenção de IVA nos fertilizantes e rações;
  • Estender ao interior do país o programa da Docapesca de compra de pescado e entrega, através das juntas de freguesia, a famílias mais vulneráveis;
  • Reforço das verbas de apoio à instalação de painéis fotovoltaicos, em 2022 e 2023 (agroindústria, exploração agrícola, aproveitamentos hidroagrícola).

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