“Não podemos adiar este debate, iniciámo-lo há meses, criámos grupos de trabalho e de reflexão, temos uma agenda definida e pública, inteiramente autónoma de calendários terceiros”, justificou Luís Azevedo Mendes, na abertura da conferência “Megaprocessos – Quando a justiça criminal é especialmente complexa”, que decorre entre hoje e sexta-feira no Palácio da Justiça, em Lisboa.

A argumentação do vice-presidente do órgão de gestão e disciplina dos juízes surge na sequência da posição da PGR, Lucília Gago, que travou a participação dos magistrados do Ministério Público (MP) na conferência, como chegou a estar anunciado no programa, por defender que "o momento não é de todo propício a que, no contexto do mencionado evento, essa reflexão possa ser feita com rigor e serenidade".

Na intervenção, Luís Azevedo Mendes alertou para as “enormes ineficiências e entorses” na atividade judicial e lembrou que 2024 será um ano em que os tribunais portugueses vão acolher “os maiores megaprocessos da justiça portuguesa, muitos deles de grande impacto mediático”, em alusão ao caso BES/GES e à Operação Marquês, “sem que se verifique uma preparação antecipadamente cuidada e transversalmente planeada”.

“Não existe qualquer significativo suporte diferenciado na legislação adjetiva ou, até agora, qualquer suporte específico de alcance prático organizativo. Existe até (…) uma dificuldade imensa na gestão da realidade pelos tribunais, ou seja, pelos juízes, perante um desalinhado agigantar duma alimentação processual ativada pelos procuradores e pelas polícias”, criticou.

Para o magistrado, a complexidade dos crimes destes processos exigem “necessidades logísticas superiores” ao MP e aos advogados que devem também ser acompanhados de uma “diferenciada força de apoio à decisão”, alterações na legislação e nas plataformas eletrónicas do sistema judicial e um “imperativo dever de colaboração” dos procuradores, sem com isso comprometer o poder dos juízes.

“A confiança que o poder judicial deve aspirar - poder judicial que só aos juízes pertence - não pode ficar refém das operações dilatórias da acusação ou da defesa, sendo que ambas as exercem, quando convém aos seus exercícios táticos ou às suas próprias incapacidades de realização”, argumentou na abertura do evento, em que também intervieram o presidente da comarca de Lisboa, Artur Cordeiro, e o presidente do conselho regional de Lisboa da Ordem dos Advogados, João Massano.

Sobre os megaprocessos, Luís Azevedo Mendes deixou um alerta para a importância de facilitar a gestão do fluxo de informação e a necessidade de estabelecer procedimentos que evitem constrangimentos nos tribunais, apontando como exemplo a aposta numa estrutura de apoio para o início do julgamento do caso BES/GES, previsto para 28 de maio.

“Tal gestão não pode tolerar nenhum tipo de entupimentos no tribunal e estes tendem demasiado a concentrar-se nos juízes de instrução ou de julgamento, relacionados com as apresentações da investigação ou da defesa sem nenhum tratamento documental facilitador. Por conseguinte, importa urgentemente protocolar condutas colaborativas que impeçam este tipo de entropia gerador de morosidade”, concluiu.