Uma “bazuca” à portuguesa

António Moura dos Santos
António Moura dos Santos

Em tempos de pandemia, têm sido comuns as alusões bélicas aplicadas de forma metafórica, principalmente frequentes no que toca à “guerra” contra o coronavírus ou às “batalhas” travadas diariamente pelos profissionais de saúde.

Uma das apropriações mais curiosas desse léxico destrutivo foi a ideia de uma “bazuca” contra a crise que a covid-19 provocou com a paragem da economia mundial. Outrora arma de guerra normalmente associada ao lançamento de projéteis explosivos, aqui a ideia passou a ser a de uma carga de apoios financeiros suficientemente potente para relançar as sociedades de volta à normalidade possível, no prazo de vários anos.

Se a Comissão Europeia já desenvolveu uma “bazuca” para apoiar os seus estados-membros — ainda que careça de ratificação por parte do Conselho Europeu— na forma de um Fundo de Recuperação no valor de 750 mil milhões de euros — dos quais 26,3 mil milhões, recorde-se, poderão ser destinados a Portugal —, o Governo português apresentou hoje o seu próprio arsenal, na sua versão mais aprimorada.

O seu nome é “Programa de Estabilização Económica e Social”, se bem que, por motivos de conveniência linguística, vá mais ser conhecido por PEES.

Sugerido originalmente na abertura da Comissão Política Nacional do PS, a 21 de maio, por António Costa, o plano, apesar de ser apresentado no âmbito de uma iniciativa partidária, teria de receber contributos de “todos os parceiros sociais e dos diferentes partidos na Assembleia da República”, como alertou o primeiro-ministro.

Foi o que aconteceu: nas semanas que se seguiram, o Governo foi se desdobrando em reuniões para recolher contributos e chegar a uma versão finalizada do documento. O programa terá "medidas de natureza política, natureza legislativa e tem também consequências financeiras", garantiu. "Será por isso um programa que enquadrará o que será o orçamento suplementar que iremos apresentar na Assembleia da República na primeira quinzena de junho", disse, na altura, o primeiro-ministro. Hoje, ficámos conhecê-lo.

Depois de mais uma longa sessão do Conselho de Ministros, o chefe do executivo apresentou em detalhe todas as medidas que constam do PEES. O prolongamento o lay-off simplificado até julho (que depois tomará outras formas), a criação de um Banco de Fomento, o investimento de 400 milhões de euros no ensino digital, a duplicação das linhas de crédito às empresas, a criação de um complemento de estabilização para compensar que tenha tido perdas salariais ou a contratação de 2700 profissionais de saúde até ao final do ano foram apenas algumas delas.

Apesar da panóplia de munições que esta “bazuca” apresenta para atacar a crise, o seu principal defensor, porém, mantém-se cauteloso quanto à eficácia dos seus efeitos. “Ao contrário do que acontece com o covid”, a crise que já se instalou e que continuará a manifestar-se num futuro próximo é “uma doença mais profunda e que será mais longa a sua recuperação”, admitiu António Costa.

Tido como um “otimista irritante” por alguns, esta, porém, tem sido a postura do primeiro-ministro. Se ontem, na Assembleia da República, Costa admitiu que o país irá enfrentar custos económicos e sociais "absolutamente brutais", hoje, já depois da apresentação do plano, avisou que “crise está a doer e vai doer".

Os tempos não serão fáceis, nem as soluções serão imediatas. O Governo procurou hoje dar um primeiro passo significativo para um novo amanhã. O segundo será dado a 9 de junho, quando o Orçamento Suplementar que suporta este plano for votado. Só aí saberemos se esta bazuca vai ter poder de fogo ou não.

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