A primavera dos estudantes e o futuro do governo
A crise académica de 1962, que se prolongou por vários meses, teve o seu ponto alto a 24 de março, há 60 anos, quando forças policiais, a mando do governo de Salazar, carregaram sobre milhares de estudantes na zona da Cidade Universitária em Lisboa, à revelia do então reitor da Universidade Marcelo Caetano.
Vários estudantes foram feridos e muitos outros detidos, de imediato ou ao longo dos dias seguintes, essencialmente dirigentes das associações de estudantes. O protesto incluiu uma greve de fome e estendeu-se durante meses.
Foi “o 25 de Abril antes do 25 de Abril”.
Alguns dos protagonistas das lutas estudantis durante a ditadura em Portugal partilharam hoje as memórias de um tempo que mudou vidas e alterou percursos no debate “A memória das crises académicas na primeira pessoa”.
O evento decorreu no âmbito do colóquio sobre “Primaveras estudantis: da crise de 1962 ao 25 de Abril”, que acontece na Reitoria da Universidade de Lisboa, esse palco da greve dos estudantes em 1962.
Artur Pinto, então aluno na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, começou por recordar Jorge Sampaio: “Como em 62, nunca nos abandonou”. O antigo presidente da República teve um papel determinante nestas lutas estudantis e esteve pela primeira vez ausente das comemorações.
Para Artur Pinto, as lutas estudantis mostraram-lhe o que era a “democracia participativa”. “Nunca perdemos o humor”, disse, referindo que a luta era acompanhada de cantigas de escárnio e mal dizer, mas sobretudo de muita “alegria e irreverência”.
E afirmou: “Com a crise académica de 1962 perdemos muita da nossa inocência, mas mantivemos a nossa utopia. Não derrubámos o regime, mas a nossa luta abalou fortemente o regime de Salazar, despertou muitas consciências e deixou uma marca em todos”. “A ditadura nunca calou a voz dos estudantes. Fomos nós que vencemos, não eles”.
A médica Isabel do Carmo, cuja fotografia a discursar durante a greve dos estudantes, em 1962, é um dos símbolos do movimento, nomeadamente da participação feminina, referiu-se a esse período como uns “dias extraordinários”: “Fomos felizes, apesar da repressão. Aquilo que me transformou foi eu ser protagonista autónoma na luta pela liberdade contra a ditadura fascista”, indicou.
E sobre a famosa fotografia, disse: “Espero que represente as mulheres nas várias faculdades. Éramos poucas, mas tivemos imenso protagonismo nas assembleias das faculdades, nas lutas contra a polícia. No entanto, o protagonismo era dos rapazes. O homem era o chefe da família, a mulher subordinada a este, que até podia repudiá-la se ela não fosse virgem”.
Ainda assim, estas mulheres eram “a nata das natas”, pois apenas 20% andava nas faculdades e 60% das mulheres eram analfabetas.
Seguiu-se o testemunho de Alberto Martins, um dos protagonistas da crise académica de Coimbra em 1969, e que reconheceu que o movimento mudou para sempre a sua vida. Em 1969, durante a inauguração do edifício das matemáticas, Alberto Martins era presidente da Direção Geral da Associação Académica, e pediu a palavra, tendo sido impedido de o fazer, seguindo-se protestos nos dias seguintes.
“Tudo o que se passou em 1969 mudou completamente a minha vida, a vida de uma geração de estudantes. A intervenção cívica mudou completamente a minha vida”, disse.
Seis décadas depois, o Dia Nacional do Estudante fica marcado por dois factos: acabam de ser conhecidos os futuros governantes das pastas da Educação e Ensino Superior; e centenas de estudantes concentraram-se na praça do Rossio, em Lisboa, num protesto contra o valor das propinas e em defesa do ensino superior.
Na praça Pedro IV, a calçada foi ocupada por várias centenas de estudantes do ensino superior, a paisagem preenchida por cartazes e o ar encheu-se de gritos reivindicativos: “A educação é um direito, sem ela nada feito", é uma das mensagens que os estudantes entoam repetidamente.
O protesto partiu de um manifesto da associação de estudantes da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e subscrito pela Federação Académica de Lisboa e por associações de estudantes de outras 12 instituições em Lisboa, Porto e Caldas da Rainha. As reivindicações são antigas, como comprovam os cânticos sabidos na ponta da língua, que vão ser repetidos ao longo das ruas de Lisboa até à Assembleia da República, o destino final desta e de outra manifestação que reúne no Terreiro do Paço outros tantos estudantes.
Caberá à cientista Elvira Fortunato ouvir estas vozes. Será ela a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, no primeiro governo partidário em Portugal, numa altura em que os rácios de homens e mulheres na academia se afastam da realidade de 1962.
A presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESUP), Mariana Gaio Alves, disse hoje à Lusa que "a expectativa é grande, fundamentalmente de que a mudança de ministro signifique mudança de políticas do ministério". Entre o que "ficou por concretizar" da política para a ciência e ensino superior dos dois anteriores governos, em que Manuel Heitor foi ministro, Mariana Gaio Alves apontou "a regulamentação para o ensino superior privado, os estatutos das carreiras docentes das universidades e politécnicos".
"Há dificuldade em estabilizar os investigadores e por vezes é preciso um tempo longo para haver investigação com resultados", indicou a presidente do SNESUP, referindo que "a esmagadora maioria" dos investigadores está a prazo.
A presidente da Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC), Bárbara Carvalho, disse à Lusa que "mais do que a nomeação da professora Elvira Fortunato, o importante é que tipo de políticas públicas serão seguidas". "A luta da ABIC é o combate à precariedade, a integração dos investigadores nas carreiras, a dignificação das carreiras e o fim da ciência a prazo, que prevalece enquanto cultura", afirmou.
Bárbara Carvalho admitiu que o programa do novo governo deverá ser de continuidade, mas a ABIC "espera que o novo ministério tenha como prioridade essas reivindicações", sobretudo "a revogação do estatuto do bolseiro e a substituição das bolsas por contratos de trabalho".
Para os reitores, o nome é uma surpresa — mas boa. Em declarações à agência Lusa, o presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), António de Sousa Pereira, disse que o objetivo é “trabalhar em conjunto por um Ensino Superior que contribua para desenvolver o país”.
“É uma escolha surpreendente na medida em que não é um político que é escolhido para o lugar, mas acho que é uma lufada de ar fresco. A professora Elvira Fortunato vai constituir uma equipa para assessorar o exercício das funções e nós cá estaremos para ser parte da solução e não do problema”. Afinal, Elvira Fortunato “tem um conhecimento ímpar da situação da Ciência em Portugal”, pelo que “pode ter um contributo absolutamente decisivo e diferenciador”.
“[Esta escolha] pode representar uma rutura com aquilo que era o passado recente, e pode ser um ponto muito importante para que se tomem medidas que sejam também de rutura com o passado e que permitam resolver alguns dos problemas que o setor enfrente desde há muitos anos”, referiu o também reitor da Universidade do Porto.
“Em boa verdade os níveis de financiamento anteriores à ‘troika’ nunca chegaram a ser repostos no Ensino Superior e sem haver essa reposição andamos todos a discutir a repartição de um bolo que não chega. É uma questão que gera sempre alguma tensão”, comentou António de Sousa Pereira. “Se queremos ser um país competitivo, se queremos ter inovação que nos aproxime da média europeia e que faça com que Portugal produza cada vez mais produtos de valor acrescentado isto implica investir não só em ciência, mas no Ensino Superior como um todo”, frisou.
*Com Lusa
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