As 24 horas Le Mans de Pedro Nuno Santos

Tomás Albino Gomes
Tomás Albino Gomes

As últimas 24 horas foram uma verdadeira prova de resistência para Pedro Nuno Santos, depois de ter anunciado a localização do novo aeroporto na quarta-feira, ter sido desacreditado pelo primeiro-ministro e ter passado o dia com o futuro aparentemente em causa. Uma corrida com tanto condensada dentro de si que merece ser recontada.

Na quarta-feira à tarde foi publicado em Diário da República um despacho assinado pelo secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Santos Mendes, sobre a "definição de procedimentos relativos ao desenvolvimento da avaliação ambiental estratégica do Plano de Ampliação da Capacidade Aeroportuária da Região de Lisboa".

Entre outras medidas, o despacho determina o "estudo da solução que visa a construção do aeroporto do Montijo, enquanto infraestrutura de transição, e do novo aeroporto 'stand alone' no Campo de Tiro de Alcochete, nas suas várias áreas técnicas."

"Os riscos de uma infraestrutura aeroportuária com duas pistas de grande extensão na península do Montijo não obter autorização ambiental para avançar são hoje avaliados como muito elevados. Por este motivo, o Governo deixou, pois, de equacionar a opção Montijo 'stand alone' como viável e, nesse sentido, merecedora de estudo aprofundado", lê-se na exposição de motivos.

O secretário de Estado das Infraestruturas considera que, "excluída esta última opção, a única solução aeroportuária que responde à exigência de dotar o país e a região de Lisboa de uma infraestrutura aeroportuária moderna com capacidade de crescimento a longo prazo é a construção de um aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete".

O Ministério das Infraestruturas divulgou que a nova solução aeroportuária para Lisboa passava pela construção de um novo aeroporto no Montijo até 2026 e por encerrar o aeroporto Humberto Delgado, quando estivesse concluído o de Alcochete, em 2035.

Segundo o Ministério das Infraestruturas, pretende-se acelerar a construção do aeroporto do Montijo - uma solução para responder ao aumento da procura em Lisboa, que será complementar ao aeroporto Humberto Delgado.

O Governo atribuiu ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil a elaboração do Plano de Ampliação da Capacidade Aeroportuária da Região de Lisboa e respetiva avaliação ambiental estratégica, o estudo da construção do aeroporto do Montijo, enquanto infraestrutura de transição, e do novo aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete.

Na quarta-feira à noite, o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, assumiu esta solução em entrevistas à RTP e à SIC Notícias.

Na sequência do anúncio, a Lusa noticiou, através de fonte próxima do presidente eleito do PSD, Luís Montenegro, que “não foi informado de nada”, uma posição que contrariava aquilo que António Costa tinha defendido na semana passada no parlamento, quando o primeiro-ministro disse que aguardava a decisão de Montenegro sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa para que houvesse “consenso nacional suficiente” tendo em vista uma decisão “final e irreversível” sobre esta matéria.

Também interrogado pelos jornalistas sobre este assunto, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou desconhecer os "contornos concretos" da nova solução aeroportuária do Governo para a região de Lisboa, observando que "foi ajustada agora", e recusou comentá-la sem ter mais informação.

Já esta manhã, António Costa determinou a revogação do despacho publicado na quarta-feira sobre a solução aeroportuária para a região de Lisboa e reafirmou que quer uma negociação e consenso com a oposição sobre esta matéria.

“O primeiro-ministro determinou ao Ministério das Infraestruturas e da Habitação a revogação do despacho ontem [quarta-feira] publicado sobre o novo aeroporto da região de Lisboa”, lê-se num comunicado hoje divulgado pelo gabinete de António Costa.

No comunicado, o primeiro-ministro “reafirma que a solução tem de ser negociada e consensualizada com a oposição, em particular com o principal partido da oposição e, em circunstância alguma, sem a devida informação previa ao Presidente da República”.

“Compete ao primeiro-ministro garantir a unidade, credibilidade e colegialidade da ação governativa. O primeiro-ministro procederá, assim que seja possível, à audição do líder do PSD que iniciará funções este fim de semana para definir o procedimento adequado a uma decisão nacional, política, técnica, ambiental e economicamente sustentada”, acrescenta-se no comunicado.

O primeiro-ministro foi confrontado com os factos, durante a reunião da NATO, que decorria em Madrid, Espanha, mas recusou comentar.

“Tenho uma regra de não comentar no exterior assuntos de política nacional. Brevemente estarei em Portugal e, se for necessário, direi mais alguma coisa para além do que foi dito no comunicado”, afirmou António Costa, enquanto em Portugal vários partidos pediam a demissão do ministro Pedro Nuno Santos, ou apelavam a uma clarificação.

Ao final da manhã, o jornal Público dava conta de que o futuro do ministro das Infraestruturas e da Habitação, se não se demitisse, seria demitido. Cenário que parecia ganhar forma com a ausência de Nuno Santo do Conselho de Ministros que decorreu esta quinta-feira, tendo-se feito representar por Hugo Santos Mendes, secretário de Estado das Infraestruturas, como foi avançado por Mariana Vieira da Silva, ministra da Presidência, que desvalorizou a substituição, explicando que tal é um procedimento normal quando existe algum "impedimento", dando como exemplo o seu próprio caso em que há poucas semanas também se fez substituir.

Depois de uma reunião em São Bento com o primeiro-ministro, regressado de Espanha, Pedro Nuno Santos, perto das 17h00, perto da hora a que ontem anunciou a localização do novo aeroporto, falou ao país para admitir "erros de comunicação", que lamentou, antes de colocar um fim à novela afirmando que "obviamente" que se mantinha no Governo.

"Esta é uma falha relevante, que assumo, mas que, obviamente, não mancha aquele que é o trabalho já longo em conjunto com o senhor primeiro-ministro, ainda antes de sermos Governo", vincou o ministro, numa curta declaração aos jornalistas, sem direito a perguntas, no Ministério das Infraestruturas, em Lisboa.

O ministro das Infraestruturas admitiu que se tratou de "um momento infeliz", mas sublinhou a relação institucional e de amizade que mantém com António Costa, que não será "manchada" por esta situação.

Pedro Nuno Santos salientou que, tal como expresso esta manhã pelo gabinete de António Costa, o Governo vai estar concentrado na "procura ativa de consenso com o maior partido da oposição" quanto à localização do novo aeroporto para a região de Lisboa.

"É esse o trabalho em que nós estamos concentrados, lamentando, obviamente, e, nomeadamente, perante todo o Governo, o qual eu integro, nós termos tido, sob a minha responsabilidade, esta falha na articulação e comunicação com o senhor primeiro-ministro e com os restantes colegas do Governo.

Mas estas 24 horas Le Mans de Pedro Nuno Santos só foram oficialmente vencidas quando António Costa, 'diretor da corrida', disse que “compreendeu o erro que cometeu e teve humildade de o assumir”, abrindo espaço para a continuação do trabalho em conjunto.

Vitória, vitória acabou-se a história. De Pedro Nuno Santos. Já em relação ao novo aeroporto, vamos ter de continuar à espera.

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