A princípio é simples, anda-se sozinho. Começa assim a música icónica de Sérgio Godinho que acompanha bem o dia de hoje. O Governo começa sozinho este primeiro dia do resto da vida do OE2020, mas todos já sabem que as semanas que aí vêm irão mudar esse status quo. Pouco mais de dois meses depois das eleições legislativas, não é do interesse de ninguém uma crise política. Mas, em quatro anos, este é o primeiro orçamento sem acordo prévio, nomeadamente com os antigos parceiros da Geringonça, PCP e BE - o que torna o processo menos previsível e aumenta o leque das possíveis alianças e temas que as viabilizam.

O Orçamento para 2020 foi mais apressado do que os anteriores. Com as legislativas, a apresentação teria sempre de ser atrasada, mas apesar do novo executivo apenas se ter formado em outubro, António Costa acelerou o processo, querendo apresentar a proposta do Orçamento do Estado para 2020 ainda este ano, sendo hoje entregue na Assembleia da República.

Por isso mesmo, o Governo reuniu-se em Conselho de Ministros extraordinário no passado sábado, levando 10 horas até aprovar o documento. Depois da apresentação feita hoje, segue-se então o debate sobre a mesma em plenário, na generalidade, já nos dias 9 e 10 de janeiro, com a votação final global da primeira proposta orçamental desta legislatura prevista para 6 de fevereiro, data também essa antecipada para não coincidir com o Congresso do PSD.

Indo “a jogo” em minoria, António Costa terá pelo menos de agradar a “gregos” ou a “troianos” para garantir a aprovação do documento. É tendo isso em conta que, segundo o Expresso, mais do que tentar produzir superávit, Centeno quererá deixar uma certa folga orçamental porque nos debates na especialidade, o executivo vai ter de fazer concessões, principalmente à esquerda. Em causa poderá estar, escreveu o semanário na edição deste fim de semana, um aumento do valor mínimo do Complemento Solidário para Idosos ou nova subida extraordinária das pensões.

Mas essas são iniciativas que só se saberá mais para a frente. Para já o que António Costa promete é continuar o percurso iniciado em 2016 de “melhoria de rendimentos, apoio à modernização das empresas, reforço do investimento na qualidade dos serviços públicos”, como escreveu na sua conta de Twitter, mantendo “contas certas".

É respeitando essa aritmética que, no cenário macroeconómico que apresentou aos partidos, o Governo prevê um excedente orçamental de 0,2% e um crescimento de 2% para 2020, mantendo o executivo uma previsão de défice de 0,1% para este ano.

Para lá das previsões e das promessas, poucas medidas se sabem quanto a este Orçamento do Estado, mas algumas já foram colocadas em cima da mesa nas últimas semanas, a começar pelo investimento na saúde.

créditos: Lusa

Um balão de oxigénio para o SNS

Acossado por críticas à esquerda e à direita pelas carências que assolam o Sistema Nacional de Saúde (SNS) e os seus debilitantes problemas de gestão, o executivo disse que ia ter a saúde em conta neste orçamento. António Costa prometeu “uma boa surpresa” e esta chegou pela boca da ministra da Saúde, Marta Temido, numa conferência de imprensa decorrida no passado dia 11.

A ministra explicou então o Plano de Melhoria da Resposta do Serviço Nacional de Saúde e de que números este é feito: investimento de mais 800 milhões de euros no orçamento da Saúde para 2020, 190 milhões de euros para investimento plurianual, um reforço de 550 milhões de euros “destinados à redução do ‘stock’ de pagamentos em atraso” e a contratação de 8400 profissionais de saúde entre 2020 e 2021.

O valor do investimento — que parece coincidir com o aconselhado por Catarina Martins semanas antes, apesar do Governo negar que tal tenha servido de influência — pode impressionar a um primeiro vislumbre, mas é menor do que parece, até porque é dinheiro que já estava a ser usado mas ainda não tinha sido orçamentado.

Para começar, o ministério da Saúde esclareceu à Lusa que nos 800 milhões de euros já se encontra uma parte dos 190 milhões de euros para aplicar em investimento em 2020 e anos seguintes. Para além disso, o Sindicato dos Médicos (SIM) não tardou em alertar para o facto de que uma boa fatia desse valor não servirá para aumentar a capacidade de resposta do SNS, mas sim para pagar dívidas de entidades.

“Dos 800 milhões, 400 milhões são para pagar dívida do primeiro governo de António Costa que se estima ser próxima de 3.000 milhões”, indicou Roque da Cunha, secretário-geral do SIM, que apelidou o plano de investimento de “propaganda”.

Mais simpático nas suas palavras foi Miguel Guimarães, tendo o Bastonário dos Médicos congratulado o reforço orçamental no SNS, assim como Alexandre Lourenço, presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares. Este felicitou o Governo pela “alteração do paradigma orçamental”, apesar de recordar que “na prática não existe um aumento do financiamento, mas sim um reforço inicial do orçamento”, ou seja, que não haverá necessariamente mais dinheiro e sim a possibilidade de gastá-lo “de forma mais inteligente", como disse ao Diário de Notícias.

Outra alteração que ocorrerá já em 2020 deverá ser a eliminação progressiva das taxas moderadoras, algo que já vinha previsto na nova Lei de Bases da Saúde. A confirmação foi, inclusivamente, dada no último debate quinzenal por António Costa, respondendo às questões de Jerónimo de Sousa. A redução dar-se-á nos cuidados primários ou tratamentos ou consultas prescritas a partir da linha saúde24 ou encaminhados pelos cuidados de saúde primários para outros cuidados diferenciados.

Choque de expectativas na Função Pública

“Se pagámos a fatura, é chegado o momento de passarmos o recibo para que os trabalhadores, serviços públicos e o povo português possam melhorar as suas condições de vida e de trabalho”. Foi com estas palavras, proferidas a 23 de novembro, que Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, deu o tónico para as negociações do Governo com a função pública.

Ultrapassada a questão do aumento do salário mínimo (para 635 euros) e anunciado um programa plurianual para a função pública (destinado a valorizar carreiras e a definir critérios para pré-reformas), faltava ao Governo negociar com os sindicatos em matéria de aumentos salariais, tendo especialmente em conta que os funcionários públicos não têm atualizações salariais desde 2009.

O Governo avisou desde cedo que, dado o peso orçamental do descongelamento das carreiras operado na anterior legislatura, a margem para aumentos salariais só cresceria em 2021, sendo a atualização neste próximo ano feita em linha com a inflação.

Os sindicatos, porém, foram irredutíveis: a Federação de Sindicatos da Administração Pública (Fesap) reivindicava uma atualização de 3,5% em 2020 e o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE) de 3%, enquanto a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública exigia um aumento de 90 euros para todos os trabalhadores.

As negociações começaram no dia 9, mas só a 11 se soube em que ordem de grandeza é que se situavam os aumentos salariais concedidos pelo Governo. Foi quando José Abraão, dirigente da Fesap, fez saber que seriam no máximo de 0,7%, usando-se a mesma fórmula aplicada para as pensões, que tem em conta a inflação sem habitação e o crescimento económico e cuja atualização é diferenciada, tendo em conta os valores das pensões.

No entanto, para os trabalhadores, se a coisa  já se apresentava pouco promissora, ficou pior quando o Governo se apressou a corrigir que o aumento na verdade seria de 0,3%.

“A proposta considera como referencial para aumentos salariais de 2020 a taxa de inflação observada até novembro de 2019 (de 0,3%, para todos os trabalhadores)”, avançou o Ministério das Finanças em comunicado no dia 11, enquanto decorriam as negociações orçamentais com os sindicatos no Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública.

A justificação para este valor, defendeu o Governo, é que a atualização salarial no próximo ano, somada às outras medidas já tomadas com impacto nas remunerações, como o descongelamento das progressões na carreira, terá um custo total de 715 milhões de euros, correspondente a um aumento médio de 3,2% por trabalhador. Segundo o secretário de Estado do Orçamento, João Leão, o impacto do aumento salarial da função pública em 2020 será de 60 a 70 milhões de euros.

Dois euros de aumento?

Na prática, segundo cálculos da consultora EY, o que isto significa é que, por exemplo, um funcionário público com um rendimento mensal de 1.000 euros, ou seja, com 14 mil euros brutos anuais, receberá mais 42 euros brutos ao longo de 2020, que resultará num acréscimo de 26,25 euros líquidos (após retirados os impostos, as contribuições para a Segurança Social ou Caixa Geral de Aposentações e o desconto para a ADSE). Se se dividir 26,25 euros por 14 meses, verifica-se que o aumento mensal neste caso será inferior a dois euros.

O aumento anunciado não tardou a ser  recebido com um coro de protestos, sendo considerado “um insulto”, "uma proposta vergonhosa". No dia 13, sexta-feira, ainda houve nova reunião, mas, perante a aparente inflexibilidade do Governo em subir para lá dos 0,3%, a coordenadora da  Frente Comum, Ana Avoila, e restante comitiva abandonaram as negociações em protesto no passado dia 13, entregando um documento a exigir 90 euros de aumento salarial a José Couto e abandonando a sala.

“Não nos passava pela cabeça que o Governo tivesse a desfaçatez de apresentar uma proposta destas”, disse Ana Avoila, referindo que a proposta apresentada pelo executivo de António Costa representa no melhor dos cenários um aumento de seis cêntimos por dia para os assistentes operacionais, nove para administrativos e 12 para técnicos superiores. Da parte do executivo, este respondeu que “foi até onde podia ir”.

Esta medida promete trazer mais um espinho para as negociações do Orçamento — Catarina Martins apelidou o aumento de um “número inaceitável” e Jerónimo de Sousa falou num “escândalo” —, assim como solavancos para a governação, já que a FESAP lançou um repto às restantes estruturas representativas dos trabalhadores do Estado com o objetivo de convergir "num grande protesto".

créditos: MÁRIO CRUZ/LUSA

Um espinho chamado IVA da Eletricidade

Outra das medidas demonstra que a ausência de uma maioria absoluta para o PS e de acordos escritos com os anteriores parceiros de esquerda começou desde já a ter manifestações naquela que se apresentou como a primeira batalha do Orçamento do Estado para 2020, a baixa do IVA para a Eletricidade.

Em causa estão as propostas do PCP, do BE e do PSD para a redução da taxa do IVA da eletricidade, fixado atualmente no valor máximo de 23%, para o mínimo de 6%, de forma a desagravar o custo não só para os consumidores, como também para as empresas. Tendo os três partidos mais deputados (110) que o PS (108) no Parlamento, existe a real possibilidade destas forças avançarem como uma “coligação negativa” para obrigar Centeno a incluir a medida no Orçamento, apesar de, até à data, negarem qualquer tipo de concertação.

Da parte do Governo houve natural resistência, lembrando que tal medida significaria uma perda de receita de 700 a mil milhões de euros. Apesar de o PCP apontar como solução a tributação às empresas e o BE e o PSD o combate às “rendas excessivas” pagas aos produtores de eletricidade, o executivo de António Costa optou, desde a primeira hora, por focar-se em medidas que permitam a redução da fatura da luz sem tocar no IVA.

Uma delas, avançou o Observador, podia passar pela “via das contribuições das empresas da energia”, nomeadamente pelo pagamento da CESE (Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético). Depois da EDP tê-lo feito em 2018, o jornal digital escreveu que podia ser agora a Galp Energia a pagar mais de 300 milhões de euros que deve ao Estado, resolvendo-se um diferendo que se arrasta desde 2014.

Não se descartando a possibilidade desse acordo poder estar a decorrer em paralelo, o que é certo é que o Governo incluiu mesmo uma proposta para o IVA na eletricidade, se bem que numa solução a meio termo com o que PCP, BE e PSD pediram.

Esta foi anunciada por António Costa no último debate quinzenal. Recuperando uma ideia do Bloco de Esquerda — que outrora tinha afastado por considerar não ter enquadramento legal — o primeiro-ministro disse ter enviado uma carta à presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, a solicitar autorização para alterar os critérios do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) da energia para permitir uma variação da taxa em função dos diferentes escalões de consumo.

A medida, mesmo sem ter tido ainda ‘luz verde’ de Bruxelas, vai mesmo ser inscrita no OE2020, justificando António Costa que, apesar de ser “muito improvável que haja uma resposta conclusiva da Comissão até segunda-feira”, poder-se-á, ao longo do ano, “utilizar a autorização legislativa se e na medida em que a Comissão venha a autorizar essa proposta”.

No entanto, os partidos não ficaram convencidos, com PCP e BE a não ceder e PSD a admitir deixar a taxa baixar primeiro para o nível intermédio, a 13%. Catarina Martins, por exemplo, advertiu que “que não pode ser colocada a medida no Orçamento à espera de um chumbo de Bruxelas para depois deixar tudo na mesma” e que “é preciso que uma baixa que seja modelada não seja uma baixa simbólica, ou seja, não pode servir para um café por mês como aconteceu com os contadores de energia”

De resto, o próprio primeiro-ministro, de certa forma, admitiria que a proposta é uma tentativa, já que “não é permitido variar a taxa em função dos níveis de consumo em nome do princípio da neutralidade do IVA”, esperando o governante que a Comissão faça antes “uma avaliação política deste princípio, tendo em conta este objetivo maior de […] enfrentar as alterações climáticas”.

Muitos pedidos, poucas certezas: os outros temas do OE

Para além destas três áreas, pouco mais se sabe em concreto quanto aos planos do Governo para este Orçamento do Estado em áreas como a educação ou o ambiente.

No plano da habitação, no seguimento daquilo que tem sido o seu Programa de Arrendamento Acessível, o Governo vai avançar com um pacote de medidas para reforçar os incentivos a quem arrenda, começando pelo favorecimento da transferência de casas em alojamento local para regime habitacional, sem penalização.

Quanto aos transportes, outros dos setores prioritários para este Governo, também pouco se sabe, para além de uma promessa de reforço de, no mínimo, 20 milhões de euros para o Programa de Apoio à Redução Tarifária nos Transportes Públicos (PART). Este valor juntar-se-á assim aos 104 milhões de euros vindos do Fundo Ambiental em 2019, para que Áreas Metropolitanas e CIM adotassem medidas de redução tarifária nos transportes públicos nos respetivos territórios, naquela que foi uma das grandes bandeiras da anterior legislatura.

Em matéria de fiscalização, o Jornal de Negócios confirmou que o Governo cumprirá uma das medidas do seu programa, através do um aumento da dedução em IRS para famílias com dois ou mais filhos. Outra das propostas neste departamento visa as Pequenas e Médias Empresas (PME), constando na melhoria do regime do IRC para as empresas que reinvistam os seus lucros através de um aumento em 20% do limite máximo de lucros que podem ser objeto de reinvestimento, como anunciou o ministro de Estado e da Economia, Siza Vieira, depois de uma reunião com a Concertação Social.

Por outro, lado também já foram revelados temas que não vão ser abordados neste Orçamento, tendo António Costa anunciado que as questões sobre a regionalização ficam apenas para depois de 2023 e que tanto o englobamento do IRS ou o imposto sucessório tão cedo vão ser tratados.

O jugo de Centeno

O falhanço da meta de uma maioria absoluta nas eleições de 6 de outubro já servia de aviso ao PS de que nestes próximos quatro anos não teria descanso dos parceiros de esquerda caso quisesse continuar a governar. No entanto, o que as últimas semanas vieram a revelar é que não é só no Parlamento onde as negociações têm sido feitas.

Com Mário Centeno a deter o “livro de cheques” e a certificar-se que o país mantém o controlo orçamental junto do Eurogrupo, começaram a ser percetíveis alguns sinais de descontentamento dentro do próprio executivo, dada a pouca margem de manobra para gerirem os seu orçamentos sob o perigo de serem cativados.

Um dos pontos mais contenciosos que se tornou notícia foi na relação entre Centeno e Eduardo Cabrita, com o ministro da Administração Interna a ver aparentemente goradas as suas tentativas de trazer maior orçamentação para a sua pasta, particularmente no tema sensível da Segurança.

Perante a contestação das forças de segurança por melhores salários e condições de trabalho — materializada numa manifestação dominada pelo Movimento Zero — Cabrita terá pedido mais 80 milhões de euros para, avançou o Público, fazer face às reivindicações sindicais. No entanto, Mário Centeno terá sido inflexível na sua máxima e, ao invés de permitir esse aumento de 5% do orçamento, este ficar-se-á pelos 1%, ou seja, apenas mais 16 milhões de euros.

Já Marta Temido, no rescaldo do seu anúncio de 800 milhões de euros para a saúde, tentou retirar alguma pressão sobre o ministro das Finanças e passar uma boa imagem para o público, dizendo nunca se ter sentido “refém” de Centeno, com quem tem uma relação “ótima”.

Para além disso, na mesma entrevista ao Público, a ministra das Saúde passou a ideia de que este investimento apenas aconteceu por “resultado de um trabalho de boa gestão de contas públicas no sentido da redução de pagamento de juros de empréstimos internacionais, etc”. No entanto, o Expresso garante que as negociações entre os dois ministros foi tensa e que foi Centeno quem levou a melhor.

Figuras como Carlos César têm adjetivado os casos como mera “fumaça”, mas os sinais de erosão estão expostos e são discutidos em praça pública, apontando vários economistas que Centeno está a perder influência e havendo comentadores a considerá-lo “um ministro a prazo”.

Votos contra e a favor: um mar de incógnitas

Regressando ao ponto inicial, de pouco serve o somatório de medidas e intenções deste Orçamento de Estado se o documento não passar na Assembleia da República. Nesse aspeto, o executivo depara-se com um grau de incerteza que ainda não tinha tido desde que o PS formou Governo em 2015.

Sem as já tradicionais negociações com PCP e BE, as linhas gerais da proposta do Governo foram dadas aos partidos no passado dia 10, sendo que só o Livre não esteve presente, por Joacine Katar-Moreira se encontrar fora do país.

Ao fim de múltiplas reuniões estilo “speed-dating”, só um partido foi explícito quanto ao seu sentido de voto no Orçamento, tendo a Iniciativa Liberal anunciado que ia votar contra. De resto, todos os outros partidos, entre avisos e pedidos, declararam que só iam pronunciar-se em definitivo quanto tivessem acesso ao texto final.

A bancada do PCP tem repetido que vai manter as possibilidades de votar contra, abster-se ou votar favoravelmente em aberto, com o líder parlamentar João Oliveira a afirmar que a avaliação terá sempre de ser feita em concreto.

O PCP tem defendido a necessidade de maior investimento nos serviços públicos, nomeadamente no setor da saúde, com a contratação de mais profissionais e a aquisição de equipamentos e melhoria de instalações, mas também na educação e nos transportes. Outras medidas que os comunistas querem ver no terreno são uma rede pública gratuita de creches para crianças até aos três anos de idade, tal como a valorização geral dos salários e das pensões, além de uma reforma fiscal e da promoção dos setores produtivos da economia portuguesa.

Também o BE tem mantido igual postura, com Catarina Martins a dizer ter o voto “completamente em aberto” e que não votará “se problemas concretos não forem resolvidos”. A ver, a coordenadora do BE tem indicado como prioridades responder à emergência na saúde, reduzir a taxa de IVA sobre a energia e continuar a recuperação das pensões.

PAN, Livre e PSD/Madeira: o triângulo da aprovação pode passar por aqui

Garantindo o apoio destes dois partidos, o Governo consegue passar o Orçamento do Estado, sendo provável que o faça, ou que, no limite, ambos se abstenham. No entanto, o resultado das últimas eleições legislativas mudou a configuração do Parlamento de tal forma que o PS na realidade não necessita do apoio dos ex-parceiros de Geringonça para aprovar o documento, sendo apenas necessários os deputados dos socialistas, do PAN, do Livre e os três do PSD/Madeira.

Do PAN, a líder parlamentar do partido, Inês Sousa Real, afirmou à Lusa  que, nas negociações com o executivo, o partido manifestou “abertura” para “avançar” em “algumas das matérias identificadas” como “prioritárias”, e admitiu esperar “ter a boa surpresa de as ver incluídas no documento final”. Destas constam sete milhões de euros para apoiar pessoas em situação de sem-abrigo e o alargamento da tarifa social da eletricidade, entre outras.

Já quanto ao Livre, Joacine Katar-Moreira não se encontrou com Mário Centeno, mas o partido fez chegar ao Governo um conjunto de medidas para o orçamento, entre as quais o reforço de psicólogos nos centros de saúde, mais despesa com o ambiente, para que a despesa efetiva do orçamento passe dos atuais 3,5% para os 5% na legislatura, e maior taxação sobre o transporte aéreo.

A mais interessante incógnita situa-se, porém, no PSD/Madeira. Sendo improvável que a secção do partido liderada por Rui Rio se posicione favorável ao documento, o líder do Governo Regional Miguel Albuquerque, já afirmou várias vezes que os três parlamentares eleitos pela Madeira poderão votar a favor do OE2020 se a moeda de troca for a satisfação das reivindicações da região junto do Governo da República socialista.

Destas constam pontos como o financiamento para o Hospital Central da Madeira, o estabelecimento de ligações por ferry entre Lisboa e Funchal durante o ano, a revisão das taxas de juro impostas pelo Estado à região (em consequência do empréstimo de 1.500 milhões de euros contraído em 2012 ao abrigo do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro), e que as passagens aéreas para o continente sejam reduzidas definitivamente para 86 (residentes) ou 65 euros (estudantes) ao invés de se procederem a reembolsos.